Chamada de artigos

Juventudes globais

Os internacionalismos estudantis latino-americanos, do século XIX aos dias de hoje: mobilizações, organizações, militâncias

Coordenação

Nicolás Dip, División de Historia, Centro de Investigación y Docencia Económicas (México) nicolasdip@filos.unam.mx

Romain Robinet, université d’Angers, TEMOS (UMR 9016) (França) romain.robinet@univ-angers.fr

A análise dos movimentos, organizações e militâncias estudantis, do final do século XIX até os dias de hoje, tornou-se um objeto legítimo das ciências sociais na América Latina e no Caribe. A partir dos estudos clássicos da sociologia das décadas de 1960-1970 – em particular as contribuições de Aldo Solari (1967), de Marialice Mencarini Foracchi (1969 et 1972), de Juan Carlos Portantiero (1971 et 1978) et de Sergio Zermeño (1978) – observa-se um interesse crescente pelo estudo sistemático das mobilizações estudantis, particularmente em resposta à “reforma universitária” de 1918 e aos movimentos de protesto de 1986.

Nos dias de hoje, pesquisadores da região – mas não só – têm feito contribuições valiosas a estes estudos, a partir de diferentes disciplinas das ciências sociais, sob a forma de estudos situados ou de análises mais amplas nos quais as escalas nacionais e continentais são estudadas no contexto de experiências históricas que não se reduzem aos marcos clássicos, abrangendo uma diversidade de casos e de temporalidades inscritas nos séculos XIX, XX e XXI (González Marin e Sánchez Sáenz, 2011; Markarian, 2012; Bustelo, 2018; Pensado, 2018; Ordorika, 2022; Dip, 2023; Robinet, 2023; Donoso, 2024).

Estes avanços não estão, contudo, isentos de debates ou de pendências. Um dos desafios atuais continua sendo a necessidade de aprofundar as pesquisas transnacionais, único modo de redesenhar a vasta e mutável “geografia dos protestos estudantis” que caracteriza a América Latina e o Caribe desde o final do século XIX. A tarefa não é fácil, pois envolve o desenvolvimento e a multiplicação de pesquisas capazes de reconstruir as trajetórias, as redes e as circulações do ativismo estudantil em diferentes países da região, mas também em conexão com outros continentes e outras geografias mundiais. Nesse sentido, a busca pelo “estudante-mundo” a partir do subcontinente exige um trabalho multidisciplinar que vincule a história transnacional às diferentes abordagens do global pelas ciências sociais.

Este trabalho implica o questionamento das representações e das práticas dos “estudantes globalizados” em relação às de outros grupos sociais, políticos e culturais de diferentes tipos, como partidos políticos, sindicatos, intelectuais, agentes do Estado, editoras, organizações armadas e vanguardas artísticas. Por fim, nesse emaranhado de redes, o papel das organizações estudantis internacionais não pode ser ignorado. Menos ativas hoje do que no passado, elas desempenharam contudo nos últimos séculos um papel estruturante na emergência da figura do estudante como um ator transnacional, tanto na “Belle Époque” quanto durante a “Guerra Fria Global”.

Com o objetivo de contribuir para o fortalecimento da pesquisa comparativa e transnacional sobre movimentos estudantis, este dossiê receberá artigos de diferentes disciplinas das ciências sociais (antropologia, sociologia, história, geografia, ciência política) que analisem os protestos, as organizações e as militâncias estudantis internacionais ou transnacionais, conectando a América Latina e o Caribe ao resto do mundo, desde o século XIX até os dias atuais. As reflexões deverão levar em conta os múltiplos determinantes e facetas do social (o tríptico “classe, gênero, raça”, ao qual se acrescentam a etnicidade, a nacionalidade, a religiosidade e a idade como construções sociais). Em particular, são esperados trabalhos que tratem ou estejam vinculados a um dos três eixos a seguir:

I. A era das organizações internacionais estudantis

Os séculos XIX e XX caracterizaram-se pelo desenvolvimento de grandes grupos internacionais de estudantes. Os contatos entre estudantes latino-americanos e europeus começaram a se consolidar no final do século XIX, inicialmente por meio da associação internacional de estudantes “Corda Fratres” (1898). Posteriormente, durante o período do entreguerras, várias organizações estudantis nacionais latino-americanas conseguiram unir-se à Confederação Internacional de Estudantes (CIE, 1919), expandindo a esfera das “relações estudantis internacionais”, até então limitada ao velho continente. Após a segunda Grande Guerra, a “Guerra Fria global” e o surgimento do Terceiro Mundo acentuaram a internacionalização do ativismo estudantil originário da América Latina e do Caribe. Em um contexto marcado por uma forte bipolarização, as organizações estudantis do continente podiam facilmente unir-se tanto à União Internacional de Estudantes (IUS, 1946), intimamente ligada ao bloco oriental, quanto à Conferência Internacional de Estudantes (ICS, 1950), ligada aos valores do “mundo livre”.

Por fim, os trabalhos deste primeiro eixo não devem ignorar a especificidade do religioso: deverão interessar-se pelo papel das organizações estudantis católicas internacionais (Pax Romana, Movimento Internacional de Estudantes Católicos), bem como às suas homólogas judaicas e protestantes.

II. Para além do Vietnã: as “mobilizações à distância” dos estudantes

A segundo eixo de pesquisa deixa de lado a questão das organizações para explorar a questão mais eruptiva das mobilizações. Em que medida os estudantes da região participaram de ondas ou ciclos de protestos mundiais? Nesse contexto, o foco obviamente estará nas mobilizações estudantis diante das guerras internacionais, da Primeira Guerra Mundial ao conflito Israel-Palestina, passando pela Guerra do Vietnã, que foi a grande catalisadora dos “anos 1968”.

Entretanto, a questão das “mobilizações à distância” também pôde e pode ser aquela das solidariedades: solidariedades estudantis transnacionais com outros povos vítimas de tirania (pensemos, por exemplo, na solidariedade dos estudantes latino-americanos do período entreguerras diante dos regimes de Leguía no Peru ou de Machado em Cuba) ou com regimes políticos ameaçados (caso da Guatemala em 1954 ou do Chile em 1973). Para além destas solidariedades revolucionárias, não devemos esquecer ou subestimar as solidariedades anticomunistas e as mobilizações transnacionais da direita estudantil, particularmente durante a Guerra Fria. Também poderia ser interessante analisar as recepções étnicas da descolonização afro-asiática, particularmente entre os estudantes indígenas ou afrodescendentes. A questão contemporânea da solidariedade estudantil feminista, em escala continental e internacional, também poderia ser objeto de investigação.

III. Pensar as circulações e as redes internacionais estudantis

Um terceiro eixo de investigação visa analisar outras facetas do estudante globalizado, tomando como ponto de partida a América Latina e o Caribe. A figura do estudante-embaixador foi uma das mais notáveis durante a primeira metade do século XX, num momento em que os intercâmbios universitários eram praticamente inexistentes e a condição estudantil ainda revestia-se de ares burgueses. Neste sentido, o desenvolvimento dos intercâmbios estudantis também precisa ser reanalisado: como evoluiu a cartografia das grandes “migrações estudantis”, tanto em direção ao resto do mundo (Europa, EUA, URSS) quanto no interior da própria América Latina-Caribe?

Estes fluxos humanos orientaram e continuam a orientar consideravelmente a circulação das ideias, tanto durante a Guerra Fria como no início do século XXI. Por último, há que se analisar uma figura (quase) especificamente latino-americana, a do estudante no exílio. Em todos os casos, estas três facetas do “estudante-mundo” (o estudante-embaixador, o estudante em intercâmbio, o estudante exilado) poderão ser analisadas à luz do género, da raça e da classe social, entendidos como construções sociais instáveis e lábeis.

Envio de artigos : https://ojs.openedition.org/index.php/cal

Para mais informações, contactar os coordenadores do dossiê: romain.robinet@univ-angers.fr e nicolasdip@filos.unam.mx

Date limite para envio de artigos: 20 de julho de 2025

Bibliografia

Bustelo, Natalia (2018). Todo lo que necesitás saber sobre la reforma universitaria. Buenos Aires: Paidós.

Dip, Nicolás (2023). Movimientos estudiantiles en América Latina. Interrogantes para su historia, presente y futuro. Buenos Aires: CLACSO.

Donoso Romo, Andrés (2024). “Los movimientos estudiantiles desde la historia: un modelo de interpretación de alcance latinoamericano”. Trashumante. Revista Americana De Historia Social, (24), 306–328.

Foracchi, Marialice (1969). “1968: el movimiento estudiantil en la sociedad brasileña”. Revista Mexicana de Sociología, 31 (3).

Foracchi, Marialice (1972). A juventude na sociedade moderna. São Paulo: Pioneira Editora.

González Marin, Silvia y Sánchez Sáenz, Ana María (2011, coord.). 154 años de movimientos estudiantiles en Iberoamérica. Mexico: UNAM.

Markarian, Vania (2012). El 68 uruguayo. El movimiento estudiantil entre molotovs y música beat. Bernal: UNQUI.

Ordorika, Imanol (2022). “Student movements and politics in Latin America: a historical reconceptualization”. Higher Education, (83), 297–315.

Pensado, Jaime (2018). “Entre perdigones, provocadores y noticias apócrifas: Un caso comparativo a la represión estatal durante el movimiento estudiantil del 68 en México y Uruguay”. En Markarian, Vani (coord.). Movimientos estudiantiles en América Latina. Rosario: Humanidades y Artes Ediciones – HyA Ediciones.

Portantiero, Juan Carlos (1971). Studenti e rivoluzione nell’ América Latina. Dalla Reforma Universitaria del 1918 a Fidel Castro. Milan: Il Sagiatore.

Portantiero, Juan Carlos (1978). Estudiantes y política en América Latina 1918-1938. El proceso de la Reforma Universitaria. Mexico: Siglo XXI.

Robinet, Romain (2023). La revolución mexicana: una historia estudiantil. Mexico: Bonilla Artigas Editores, 2023.

Solari, Aldo (1967). “Los movimientos estudiantiles universitarios en América Latina”. Revista Mexicana de Sociología, 29 (4).

Zermeño, Sergio (1978). México: una democracia utópica. El movimiento estudiantil del 68. Mexico: Siglo XXI.

Nicolás Dip é doutour em história pela Universidad Nacional de La Plata (UNLP). Atualmente é professor e pesquisador na División de Historia do Centro de Investigación y Docencia Económicas (CIDE) e professor do Colegio de Estudios Latinoamericanos da Facultad de Filosofía y Letras da l’Universidad Nacional Autónoma de México (UNAM).

Romain Robinet, doutor em história pelo Institut d’études politiques de Paris (Sciences Po Paris), é maître de conférences (HDR) em história contemporânea na université d’Angers e membro do laboratório TEMOS (Temps, Mondes, Sociétés, UMR CNRS 9016).

Os Cahiers des Amériques latines também recebem contribuições espontâneas para a seção “Études” ao longo de todo o ano.