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A Maiêutica como Técnica na Mediação de Conflitos

Maieutics as a Technique in Conflict Mediation
La Maïeutique comme Technique de Médiation de Conflits
JOÃO TIAGO GOUVEIA
p. 113-128

Resumos

Partindo da analogia entre maiêutica socrática e mediação, o presente artigo, num primeiro momento, procurará evidenciar as aproximações e distanciamentos entre as duas, para, posteriormente, avançar com uma proposta de aplicação da primeira como ferramenta da segunda. É pois uma primeira tentativa de construir um conjunto de perguntas baseadas no método maiêutico no interior da mediação. Conclui-se que este método, através da perscrutação dos pontos de vista das partes, poderá ser útil quer no processo reflexivo com vista ao entendimento, quer no reconhecimento de princípios atinentes à prática da mediação; ao mesmo tempo, promove a autonomia das partes envolvidas num determinado conflito.

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Introdução

1O que distinguia a atividade de Sócrates era o seu desejo de não ensinar os homens. Ele próprio alegava não possuir competência para realizar tal proeza (Kenny, 2003; Cordón e Martínez, 2016; Grayling, 2020). Com efeito, é famosa a sua afirmação de que a única coisa que sabia era que nada sabia, uma máxima frequentemente associada à sua ironia, mas que lhe servia de pretexto para cultivar diálogos profícuos e cativar o interesse do seu interlocutor, afirmando assim simultaneamente o seu posicionamento.

2Sócrates não deixou obra escrita: “Tudo o que sabemos acerca dele está contido nos escritos de Xenófanes e Platão” (Kenny, 2003), o que tem representado um desafio para os historiadores. Como nota Russell (2017, p. 94): “é muito difícil saber até onde Platão retrata o Sócrates histórico, e até onde a pessoa chamada ‘Sócrates’ é nos diálogos simples intérprete das opiniões platónicas”. A posição mais consensual entre os historiadores é a de que o Sócrates histórico seria aquele presente na obra de Xenofonte e nos diálogos de juventude de Platão e o Sócrates platónico o dos diálogos ditos de transição de Platão (Ghiraldelli, 2018; Azevedo, 2003). Este é um debate que continua em aberto, mas que não deixa de ser importante quando se trata de compreender a evolução do método socrático.

3O método socrático começou por ser apresentado como método de elenchos, uma forma de diálogo direto e cooperativo entre indivíduos, no qual cada interlocutor podia replicar ao outro e argumentar em defesa das próprias posições. O objetivo era estimular o pensamento crítico e extrair ideias e implicações subjacentes. Consistia em abordar pessoas e fazer-lhes perguntas acerca da natureza de algum conceito, qualidade ou propriedade aparentemente abstrata, como, por exemplo: o que é a Virtude? (cf. Ménone de Platão), levando o interlocutor a levantar várias hipóteses para depois as rebater: “O que ele [Sócrates] fazia bem era expor os pontos fracos das pretensões das outras pessoas ao conhecimento. Processar bem os pensamentos consiste em ser capaz de evitar confusões, detetar ambiguidades, pensar numa coisa de cada vez, apresentar argumentos de confiança, ter consciência das alternativas, etc.” (Blackburn, 2001, p. 15). Quando posto em contradição, o interlocutor admitia então, contrariamente àquilo que inicialmente supunha, que não sabia a resposta à questão colocada (Stangroom, 2012; Brisson, 2010). Por outras palavras, o método elenchos assenta na refutação e no reconhecimento de que não se sabe, conduzindo, inevitavelmente, à aporia – ausência de caminho. Um impasse que testemunha o pensamento crítico de Sócrates, “que não propõe qualquer doutrina pessoal e que detém apenas uma sabedoria puramente negativa, a consciência da sua ignorância” (Baraquini e Laffitte, 2007, p. 365).

  • 1 Apesar de ser designada nominalmente apenas no Teeteto, a maiêutica surge já descrita em Ménone, de (...)

4Se o método elenchos parece possuir alguns elementos de conexão com a mediação, tal é ainda mais patente em Teeteto, de Platão, obra em que Sócrates associa este método literalmente à maiêutica – do grego maieutiké, o que age como uma parteira; arte de dar à luz; arte de iluminar os espíritos1. Sócrates passa, então, a pressupor que o conhecimento já se encontra nos próprios interlocutores, cabendo-lhe apenas a tarefa de os auxiliar a tornarem-se capazes de o dar à luz. Daí comparar o seu ofício ao das parteiras. Aqui existe já a possibilidade de alcançar a verdade a partir do interior de cada interlocutor, não se tratando, como no método elenchos, de pôr à prova os próprios interlocutores, confrontando-os com a impossibilidade de alcançarem a verdade. Esta ideia não é muito diferente daquilo que se espera de um terceiro que, tal como refere Helena Almeida, se apresente como um “Ator desarmado e sem poder” (citado em Ferreira, 2006, p. 80), isto é, o mediador.

  • 2 Disse solução e não acordo, porque poderá acontecer que a solução do conflito não se traduza necess (...)
  • 3 Sobre a diferença entre arbitragem, mediação e conciliação, cf. Ferreira (2006, p. 110).

5A mediação é uma forma de resolução de conflitos, em que os mediandos, com o auxílio de um mediador, procuram alcançar uma solução2 para o problema que os impede de se entenderem. Ao contrário de um árbitro ou de um juiz, o mediador não decide sobre o caso, nem se pronuncia sobre quem tem razão3. A sua função é proporcionar um diálogo livre e construtivo entre as partes envolvidas num determinado conflito. E é precisamente por isso que podemos dizer que o mediador é o elo entre os mediandos, sem o qual a comunicação seria mais difícil, senão mesmo impossível. Neste sentido, pode ser-lhe reconhecida a qualidade de facilitador de todo o processo de mediação, motivo pelo qual a mediação constitui um processo ternário (devendo incluir na sua estrutura um terceiro elemento que exerça um papel tão relevante quanto o das outras partes) e nunca um processo binário (considerando apenas o contributo ativo das partes e os seus pontos de vista) (Ferreira, 2006, pp. 70-80).

6 Para que as motivações sejam aprofundadas e entendidas de forma clara pelos mediandos, é importante que o mediador elabore perguntas-chave a serem feitas aos mesmos. Daqui resulta o seu papel de inquiridor, na tentativa de aproximar as partes para que possam construir conjuntamente uma solução, de forma ativa e colaborativa.

  • 4 A dialética, isto é, o método de procurar o conhecimento através de pergunta e resposta, tem sido f (...)

7 Nesse sentido, o exercício do mediador assemelha-se ao método socrático: consiste num processo dialético de perguntas e respostas, a que se sucedem mais perguntas para aprofundar os valores e crenças dos sujeitos, ajudando-os a identificar contradições e inconsistências, de maneira a apontar problemas e eventuais soluções4.

8 O processo de trazer à consciência as ideias das partes para as ajudar a aprofundar a sua compreensão sobre determinado objeto é uma das principais tarefas do mediador. É nesse sentido que podemos dizer que a sua intervenção passa, necessariamente, por um método maiêutico de aprofundamento dos pontos de vista dos interlocutores.

9 Comparativamente com as partes diretamente envolvidas num conflito, um mediador está mais apto a separar as pessoas dos problemas e a orientar a discussão para as suas necessidades. Além disso, está também mais apto a separar o processo de invenção do processo decisório, a diminuir o número de decisões necessárias para chegar a um acordo (ou não) e a ajudar as partes a descobrir o que uma determinada decisão lhes pode trazer. Tudo isso graças a perguntas que ele tece e que, de certa maneira, moldam e orientam o diálogo entre as partes. Este exercício será tão mais eficaz quanto mais as partes participarem ativamente no processo: “Se os outros não se envolverem no processo, dificilmente poderão estar de acordo com o resultado” (Fisher, Ury e Patton, 2019, p. 46). Deste modo, qualquer “direção” ou resultado terá de vir de dentro dos próprios mediandos e não pode ser adicionado por um terceiro. Daí o papel maiêutico do mediador como parteiro dos pensamentos já existentes nos seus interlocutores.

1. A metáfora da maiêutica

10Diz-se que Sócrates comparava a sua atividade ao ofício da sua mãe, Fenárete, uma das parteiras de Atenas. Afinal, não é a parteira que dá à luz os corpos, ela apenas está presente e ajuda a mãe. Da mesma forma, Sócrates compreendeu que a sua tarefa era ajudar a dar à luz o Conhecimento (com maiúscula) dos outros, porque o verdadeiro saber, universal, tem de vir de dentro e jamais pode ser introduzido:

S. [Sócrates] – Pois isto é o que justamente a minha arte partilha com a das parteiras: sou incapaz de produzir saberes. Mas disso já muitos me criticaram, pois faço perguntas aos outros, enquanto eu próprio não presto declarações sobre nada, porque nada tenho de sábio; e o que criticam é verdade. A causa disso é a seguinte: o deus que me obriga a fazer nascer impediu-me de produzir. (Platão, 2015, p. 202)

11As parteiras definiam-se como mulheres que, tendo já dado à luz, tinham ultrapassado todavia a idade de gerar, podendo apenas realizar os partos das outras mulheres; assim também seria com Sócrates que, alegadamente estéril em matéria de conhecimento, ajudava os seus interlocutores a dar à luz um resultado que só a eles devia pertencer. “A imagem é a de que as ideias já existem na mente grávida do sujeito, mas precisam de um parto para se tornarem manifestas” (Blackburn, 2007, p. 280).

12Sócrates surge, assim, como aquele que, através de perguntas, faz as ideias emergirem do interior dos Homens, não acrescentando nada do seu próprio conhecimento para o efeito. Subjacente está a ideia de que todos possuem as respostas, apenas necessitam de ser orientados. Esta noção surge pela primeira em Ménone:

Sócrates – Portanto, quem não sabe tem em si opiniões verdadeiras acerca daquilo que ignora. […] Por consequência, poderá saber sem que ninguém o ensine, mediante um simples interrogatório, encontrando em si mesmo a ciência, no seu próprio interior? (Platão, 1945, p. 43)

  • 5 Há um aceso debate entre os estudiosos acerca da possibilidade de aproximar a conceção de Sócrates, (...)

13A maiêutica designa a forma como a interrogação conduz o interlocutor a encontrar a verdade através das suas próprias faculdades naturais, sem que lhe seja ensinada ou transmitida. A fórmula é aparentemente simples: as ideias já existem na mente grávida do sujeito, mas precisam de um parto para se tornarem manifestas: “devemos tentar que Teeteto, através da maiêutica, dê à luz o que tem dentro acerca do saber” (Platão, 2015, p. 265). Tal pode ser entendido como um método complementar da teoria da reminiscência (também chamada anamnese), que afirma que o conhecimento é uma recordação do que aprendemos numa existência anterior: “Com efeito, o que se chama investigar e aprender não é mais que recordar” (Platão, 1945, p. 34)5.

14 O que diferenciava, de facto, a atividade de Sócrates era a sua intenção de não ensinar, mas apenas de ser parteiro daquilo que cada um é capaz de desenvolver por si mesmo, através da sua própria interioridade. Segundo ele, o verdadeiro saber não pode ser transmitido ou ensinado a partir do exterior. Daqui decorre que a arte do diálogo não pode consistir em exposições de conteúdo doutrinal, mas sim num espaço de questionamento que conduz o interlocutor a extrair a verdade de si mesmo através das suas próprias capacidades racionais, uma vez que ela não pode ser transmitida ou ensinada a partir do exterior.

15 Sócrates podia simular ignorância ou parecer mais ingénuo do que na realidade era: através da conhecida ironia socrática, mostrava as contradições dos seus interlocutores, levando-os a produzir um juízo a partir de uma reflexão mais profunda. Este é um sentido bastante diferente da ironia com vista a ridicularizar. Trata-se, aqui, de estimular a emergência das ideias que de forma não consciente já se encontram nos próprios interlocutores – eis o lado positivo do método.

16Por outro lado, frente à impossibilidade de alcançar uma conclusão definitiva sobre o assunto em questão (aporia), enfatiza os limites humanos na apreensão do verdadeiro conhecimento. Eis a vertente negativa do método que, a par da refutação, tem a função de evidenciar ao interlocutor os seus limites. Tal não significa que não haja no final o reconhecimento do progresso conseguido ao longo do processo dialético (Azevedo, 2004).

17 O Sócrates do Teeteto seria como a parteira; quer dizer, tendo adquirido o conhecimento, mas sendo incapaz de o produzir – provavelmente por ausência de estímulos –, a sua tarefa consistiria em extrair o conhecimento do seu interlocutor, tal qual a parteira traz ao mundo um novo ser. Deste modo, tudo o que está ao seu alcance é estimular o parceiro de diálogo “na tarefa de dar à luz os frutos do seu próprio espírito” (Azevedo, 2003, p. 279). A maiêutica radica, assim, numa perspetiva de conhecimento como interioridade: o conhecimento é essencialmente refletivo, ação de se concentrar em si mesmo, para então descobrir o universal que há em nós.

18Este último aspeto pode, no entanto, levantar dúvidas, quando se trata de o associar à mediação. Ao ter como objetivo alcançar a verdade universal, independentemente do sujeito, o método maiêutico acaba por distanciar-se da verdade que se constrói na intersubjetividade pelo processo da mediação, no qual a verdade não é tomada como universal. Cada parte é convidada a reconstruir a situação-problema, dentro do seu próprio olhar. Ainda assim, se entendemos, como Habermas (1981/2014), que o diálogo com vista ao entendimento deduz uma ação comunicativa, a noção de verdade não poderá ser inteiramente relativa. Desde logo porque a comunicação deve reger-se por determinadas condições. Quer isto dizer que o diálogo entre as partes deve, num discurso racional, ser sustentada por boas razões, isto é, pela correção normativa, a sinceridade expressiva e a lógica sobre aquilo que é dito (Habermas, 1981/2014, p. 66). Além disso, há que ter em consideração os direitos fundamentais universais de ambas as partes e, no caso da mediação penal, as exigências de prevenção gerais e especiais (Leite, 2009, p. 52; Santos, 2006, p. 90). Portanto, não é totalmente indevida a relação entre a ideia de alcançar uma verdade universal patente no método maiêutico e o reconhecimento pelas partes de determinadas verdades universais para o processo em si e, consequentemente, o possível resultado da mediação.

2. Do Papel do Mediador

19Para entender o papel do mediador, podemos compará-lo à metáfora da parteira supra exposta: da mesma forma que é a mulher quem dá à luz a seu próprio filho, o consenso deve ser alcançado pelo esforço de ambas as partes, para que adquiram consciência e possam reagir da melhor maneira ao conflito: “O papel do mediador não é o de impor um acordo entre os intervenientes, mas sim o de promover a interação […] de modo a que cada um assuma um papel ativo na construção de uma solução tida como justa por ambos” (Marques, 2011, p. 284).

20Assim, o papel do mediador é apenas ajudar a encontrar uma solução sem interferir na decisão. Isso significa que não lhe cabe sugerir opções e muito menos o acordo, como sucede com o conciliador, mas utilizar instrumentos para facilitar o exercício dialógico entre as partes envolvidas, que pode resultar ou não em opções ou em acordo (cf. Costa e Araújo, 2021, p. 662; Leite, 2008, pp. 124 ss).

21Compreende-se que devam ser as partes diretamente envolvidas, e nunca um terceiro, a alcançar uma solução, caso ela exista, uma vez que, em primeiro lugar, importa que o conteúdo da solução proceda da participação das mesmas e não da de outra pessoa exterior ao conflito. Só se partir do envolvimento das partes é que terá sentido e significado válidos.

22Assim, nunca é demais reiterar que o mediador é responsável por que sejam os próprios mediandos a construir a solução de forma inteiramente autónoma.

  • 6 Para uma lista mais completa dos requisitos do mediador, cf. a Lei n.º 29/2013, de 19 de abril, que (...)

23Para isso, em primeiro lugar, deverá libertar-se o mais possível da sua visão pessoal e pedagógica. Não cabe aqui fazer uma lista exaustiva dos requisitos do mediador6, mas a sua isenção é fundamental para promover o diálogo a partir do ponto de vista das partes. Segundo Almeida (2014, p. 87), “Visitar o lugar do outro significa entender o seu ponto de vista, incluindo a sua perspetiva em relação ao ocorrido e a sua visão de mundo. Quando essa possibilidade é alcançada, pode ocorrer o entendimento de uma linha de raciocínio, das motivações que determinaram uma atitude ou postura, de outros parâmetros norteadores de necessidades e interesses”. O simples facto de as partes serem capazes de admitir que a multiplicidade de perceções é subsequente da divergência de perspetivas já pode abrir espaço para valiosas reflexões. Por outro lado, não se verifica uma verdadeira mediação se o mediador estiver sujeito “a pressões de ordem política, ideológica, material, espiritual ou emocional” (Ferreira, 2006, p. 80). Só estando isento de pressões poderá oferecer garantias de neutralidade e imparcialidade. Ser-lhe-á pedido também uma sensibilidade empática para com os problemas e dificuldades sentidos pelas partes e uma postura de serenidade, reflexão, racionalidade e concentração, de modo a poder modificar favoravelmente a intranquilidade e o nervosismo que não raras vezes acompanham as sessões de mediação. O objetivo é proporcionar um ambiente pacífico de diálogo e de decisão.

24Promover esse espaço de conexão é o primeiro passo para fomentar a autonomia dos mediandos. O segundo será o de fazer bom uso da perceção, da compreensão e da escuta ativa, de modo a transformá-las em perguntas. “Também as perguntas advindas das ideias geradas pelo mediador devem genuinamente provocar reflexões que mantenham com os mediandos a autoria” (Almeida, 2014, p. 301). Além da reflexão, as perguntas promovem também a capacidade de os mediandos criarem opções que podem ser úteis para um eventual acordo. Segundo Fisher, Ury e Patton (2019, p. 759), esta é uma das qualidades mais úteis da mediação. Todavia, como alerta Almeida (2014, p. 303), ao transformar proposições em perguntas, os mediadores necessitam de ser cautelosos para não mascararem sugestões em perguntas, colocando em causa a proclamada autonomia das partes. Como veremos infra, esta será uma questão especialmente relevante quando se trata de operacionalizar o método maiêutico no âmbito da mediação. A ideia é de que as perguntas devem provir sempre do discurso das partes, por forma a respeitar e conservar a autoria das partes em eventuais soluções. O objetivo é ajudá-las a caminharem pelos seus próprios pés, questionando-as de forma que elas próprias ampliem a visão e encontrem as suas verdadeiras motivações, dando-lhes assim, idealmente, a oportunidade de alcançar uma solução adequada às suas necessidades. Tal implica amiúde trabalhar, não apenas as questões materiais e objetivas do conflito, mas também os aspetos subjetivos: as emoções, as mágoas, as preocupações, as necessidades, o sentir gerado no relacionamento de ambas as partes.

  • 7 As posições geralmente surgem numa fase inicial do processo, apesar de se poderem manter até ao fim (...)

25Saber traduzir tudo isso em perguntas é útil para organizar as diferentes posições e motivações7 das partes: “Imersos em postura adversarial ou em processo de construção de entendimento, […] os mediandos não apreendem todos os dados e informações gerados nas conversas coordenadas pelo mediador […], cabendo ao mediador o resgaste dessas informações” (Almeida, 2014, p. 101). A intervenção do mediador faz-se através de uma abordagem inquiridora, que permita identificar as posições e motivações de cada uma das partes. Intervenções com esse objetivo estimulam a excursão ao lugar do outro, na medida em que as respostas de cada uma das partes se constituem em informações a serem interpretadas pelo outro. De vez em quando, a simples compreensão da perspetiva do outro representa uma abertura suficiente para o mediador oferecer reflexões que conduzam ao apaziguamento.

26Como conector entre as partes envolvidas, o mediador também tem um papel de relação com o coletivo; isto é, ele representa valores da consciência coletiva. Por exemplo, quando informa sobre o processo de mediação, da sua confidencialidade e neutralidade, quando foca o respeito mútuo durante todo o processo, e até mesmo enquanto “factor de equilíbrio de poder” entre as partes (Ferreira, 2006, p. 94), não está senão a construir uma ponte entre as partes com o universal. Isto sucede sobretudo na fase de pré-mediação, em que as partes são esclarecidas previamente sobre os princípios, o procedimento e as consequências da mediação. Por outras palavras, o mediador confere um valor normativo à mediação através de certos princípios comunitários, com implicações no comportamento das partes. Este valor, no entanto, é perfeitamente explicável, se pensarmos que, para estabelecer um modelo cooperativo de diálogo, é necessário que as partes reconheçam certos princípios como válidos, a começar pela dignidade e o valor de cada ser humano na sua individualidade. Caso contrário, o respeito mútuo, condição fundamental para a cooperação, seria substituído pela intolerância e, por conseguinte, a posição adversarial das partes sobrepor-se-ia a qualquer possível entendimento.

27Por conseguinte, o papel do mediador apresenta um duplo sentido: além de mediar o conteúdo mais particular do conflito em questão, também medeia certos aspetos da consciência coletiva e, portanto, princípios universais. Se pensarmos que a maiêutica socrática parte do interior para alcançar o que há de universal nas vivências individuais, podemos entender o exercício do mediador como algo semelhante: para o diálogo ser possível, há princípios que devem ser preservados – antes de mais, a dignidade e o respeito mútuo entre os mediandos.

28Assim, é possível alcançar um entendimento através do diálogo, mas convém que a motivação de cada parte reflita também sobre valores universais inegociáveis. O método maiêutico, ao radicar numa perspetiva de conhecimento como interioridade, na medida em que o conhecimento é encarado como fundamentalmente refletivo, além de fomentar a criação de opções e soluções particulares, também pode contribuir para o reconhecimento de determinados princípios; isto é, pode contribuir para que se alheiem da sua situação histórica e particular, pensando acerca dos princípios que seriam racionalmente aceites fora dessa situação.

29Ora, considerando o mediador como a ponte entre as partes daquilo que é universalizável pela consciência coletiva, cabe-lhe num primeiro momento elucidar as partes sobre determinados princípios e aspetos normativos, mais não seja para as consciencializar acerca do processo em si e dos seus direitos e deveres enquanto mediandos. A pré-mediação é, por excelência, a fase idónea para isso, com consequências práticas nas sessões posteriores. Se assumirmos que o reconhecimento de determinados princípios depende de um processo de aprovação, convém que cada parte compreenda a sua justificação. Para isso, é importante que as partes em algum momento se abstraiam da sua situação pessoal, supondo-se, portanto, que reconheçam o que as une enquanto seres humanos. Esta posição pode ser equiparável ao conceito de véu da ignorância incentiva – conceito que Rawls (2021, pp. 37 e ss) utiliza para definir o desconhecimento face à posição que cada membro ocupa, ou ocupará, na sociedade. Podemos considerar que é uma metáfora para explicar que, quando o indivíduo não sabe nada acerca do seu papel social, vai ser imparcial e apto a formular regras universais justas para todos, deliberando até sobre os princípios que seriam racionalmente aceites em determinada situação negocial, e quem sabe com isso facilitar a solução para o caso.

3. Técnica de maiêutica

30“Sócrates pretendia que as suas perguntas levassem os seus interlocutores a parir ideias próprias. Que nada fosse afirmado por ser norma ou usual, sem que a reflexão provocasse uma análise crítica” (Almeida, 2014, p. 150, ênfase minha).

31Assim, o processo estruturado de diálogo maiêutico tem por objetivo primordial a reflexão acerca das crenças e presunções particulares das partes, levando-as a questionar e a pensar criticamente sobre esses mesmos pressupostos, de modo a defendê-los ou a reavaliá-los; neste sentido, constitui-se como uma ferramenta útil para os mediadores.

32A ideia passa por criar um certo desconforto, desafiando as partes a utilizar o pensamento crítico para analisar situações e desafiar determinados pressupostos; contudo, sem nunca embaraçar ou ridicularizar – não percamos de vista que o objetivo é encorajar o diálogo e apurar o que realmente as partes acreditam e porquê. Portanto, em todo o caso, deve ser um desconforto proveitoso no sentido de incentivar as partes a adotarem um diálogo com vista ao entendimento. Para que funcione, o mediador terá de confiar na capacidade de ambas as partes de participarem nesse esforço colaborativo. Essa confiança pode ser adquirida na fase de pré-mediação, por viabilizar um conhecimento mais direto sobre a preparação de cada uma das partes para a sessão (ou sessões) de mediação propriamente dita. Daqui resulta também o entendimento de que o mediador busca, a partir de uma perspetiva de cooperação e empatia, reunir elementos para mitigar a posição adversarial das partes que, amiúde, impede a comunicação com vista ao entendimento mútuo.

  • 8 Entende-se por fases da mediação: “O atendimento, geralmente sistematizado em três momentos – o ant (...)

33Estando a reflexão presente em todas as fases da mediação, o método maiêutico poderá ser usado antes, durante e depois8. Em conformidade, a proposta de categorias de perguntas que se segue terá em consideração todo esse processo. Para o efeito, adaptarei as seis categorias de perguntas de Paul e Elder (2006), enfatizando os pontos mais significativos para o âmbito da mediação.

34Assim sendo, as perguntas podem estar em qualquer uma das seguintes categorias, frisando que os exemplos não são exaustivos; o propósito é apenas ajudar a focar o diálogo em pontos fundamentais:

35(1) Esclarecimento. Predominam perguntas que visam obter uma explicação por parte dos mediandos: “Por que razão refere isso?” ou “Como é que isso se relaciona com X ou Y?”. O objetivo é essencialmente compreender o que as partes querem dizer. Se as afirmações não forem clarificadas, dificilmente se compreenderão os interesses e motivações dos mediandos.

36(2) Exploração do que se assume como verdadeiro. As perguntas conducentes à exploração do que os mediandos aceitam como verdadeiro têm a intenção de promover o pensamento crítico sobre pressupostos e crenças sobre os quais as partes se baseiam para afirmar as suas proposições. Por exemplo: “Em que se apoia para dizer X?” ou “Como pode confirmar ou refutar X?”.

37(3) As razões por detrás das posições. Esta categoria de perguntas pretende aferir acerca das razões subjacentes àquilo que as partes pretendem quando aceitam participar num processo como a mediação. As partes assumem frequentemente posições rígidas que têm como objetivo determinado resultado, sem que tivessem sido analisadas as causas que as levaram a posicionar-se daquela forma. Esta categoria de perguntas visa suscitar a reflexão em torno das razões que suportam posições ou interesses aparentes: “Como é que sabe que X é X?”, “Pode dar um exemplo?”, “O que acha que causa X?”, “Por que razão X está a acontecer?”. Por vezes, a solução pode surgir precisamente porque as perguntas identificaram as motivações reais de determinadas posições.

38(4) Pontos de vista e perspetivas. Aqui o principal objetivo é ampliar a visão das partes sobre a situação, mostrando que existem outros pontos de vista, igualmente válidos, possibilitando que sejam adquiridas novas visões a respeito dos problemas levantados pelo conflito. Perguntas como “Quais são as formas alternativas de entender X?”, “Quais são os pontos fortes e fracos de X e Y?”, “Como poderia olhar para X de outra forma?”, podem contribuir para uma visão mais ampla dos conflitos e, por conseguinte, das eventuais opções de resolução.

39(5) Implicações e consequências. Neste ponto, traça-se um cenário prospetivo, perguntando quais as implicações das razões apresentadas. Por exemplo: “Como será que isto faz sentido?”, “O que aconteceria se…?”, “Quais são as consequências dessa forma de pensar?”, “Como poderia X ser usado para Y? “Quais são as implicações de...?”, “Como é que X afeta Y?”.

40Finalmente, (6) Questões sobre perguntas. Aqui trata-se de promover a capacidade de compreender e refletir sobre as interrogações que vão sendo realizadas no decurso do processo dialógico. Isto permite que os mediados pensem sobre o sentido e significado das perguntas que vão sendo lançadas durante o processo, como, por exemplo: “Qual foi o objetivo de fazer essa pergunta?”, “Que mais poderia X perguntar?”, “Porque pensa que X fez esta pergunta?”, “Porque pensa que foi questionado sobre isso?”.

41Como reconhece o mediador Rosenberg (2021, p. 200): “Muitos têm dificuldade em expressar as próprias necessidades […]. Num qualquer conflito, ambos os lados gastam em geral muito tempo a tentar provar que estão do lado da razão, em vez de prestarem atenção às suas próprias necessidades e às dos outros”. À medida que o mediador se conecta com as partes envolvidas num determinado conflito e obtém mais esclarecimentos sobre o problema, é mais fácil para as partes entenderem as necessidades por trás das suas posições. A utilização do método socrático proporciona um diálogo mais profundo e produtivo entre as partes do que uma discussão apoiada nas suas posições. Mais do que encontrar um compromisso no qual as partes abdicam de qualquer coisa e nenhuma delas se satisfaz totalmente, desenvolver uma conexão apoiada pelo método socrático parece aumentar as hipóteses de atender às necessidades de todos, na medida em que aponta o foco da mediação para a criação de uma ligação entre as pessoas.

42Ajudar cada parte a compreender a perspetiva do outro é o cerne e objetivo final de uma mediação bem-sucedida, porque, “quando se forma a conexão, o problema resolve-se na maior parte das vezes” (Rosenberg, 2021, p. 198).

Conclusão

43Sócrates assume ante o interlocutor uma posição distanciada relativamente ao saber que se pretende alcançar; por princípio ou por impossibilidade, fá-lo através de um sistema de pergunta/resposta. Aqui, o método desenvolve-se essencialmente pela ironia e por levar os interlocutores à contradição: se no início coloca apenas questões, no decurso do diálogo leva frequentemente os interlocutores a reconheceram as suas limitações e, por fim, a refutarem-se – evidentemente que seria desadequado transpor literalmente a forma como Sócrates lidava com os seus interlocutores para o âmbito da mediação, por se tratar de um método que desarmaria intelectualmente as partes. O mediador deve criar um ambiente de confiança, sem o qual a cooperação não será possível. Mas quando Sócrates introduz a noção de maiêutica no seu método, aquela transposição adquire um novo sentido.

44A maiêutica surge como um método socrático de perguntas e respostas, capaz de auxiliar o interlocutor a gerar definições gerais mais próximas da verdade, cujas fundamentações já se encontram no próprio. Para tanto, precisará de um terceiro, metaforicamente o parteiro, que o ajudará no processo. Foi nesse sentido que se estabeleceu uma analogia entre a maiêutica e a mediação. Apesar de a mediação promover uma noção de verdade (acerca do conflito) que muda de acordo com a visão das partes sobre determinado objeto, a condução da mesma está estabelecida por diversos princípios que, no essencial, não dependem diretamente das partes. São, portanto, critérios gerais, abstratos e imutáveis, dispostos pela própria ética inerente à prática da mediação, mas também pelo coletivo, como, por exemplo, o respeito mútuo, a dignidade da pessoa humana, a igualdade entre as partes, a liberdade. Estas suscetibilidades aumentam consideravelmente na mediação penal, vítima-agressor, a que se acrescentam as exigências de prevenção geral e especial. Ora, na impossibilidade de reconhecimento de tais princípios, é difícil prosseguir com a mediação. Todos nós podemos compreender os princípios na sua componente linguística, mas não necessariamente, por exemplo, na dimensão ética. Só examinando o seu sentido e significado é que estes podem conferir uma referência diretiva ao nosso próprio comportamento: de nada serve exigir um compromisso de igualdade entre as partes se estas não tomarem consciência da importância desse compromisso para o sucesso da mediação.

45Quando um mediador se envolve em questionamentos socráticos, no fundo está a pedir que as partes partilhem a sua visão e aprofundem mais a justificação dos seus princípios, mas também o objeto do conflito em questão. E aqui a maiêutica pode ser útil para conhecer sobretudo factos que remetem para o passado: o porquê de as coisas terem acontecido daquela forma específica. Nesse sentido, conclui-se que a abordagem maiêutica pode ser proveitosa para alcançar aspetos mais subjetivos, e por isso talvez tivesse mais eficácia na pré-mediação, em entrevistas privadas com cada uma das partes, já que a ausência do outro pode viabilizar uma maior transparência e abertura de reflexão. No entanto, ao promover demasiado a reflexão, a maiêutica poderá ser menos diretiva; daí que a sua intervenção deva ser complementada por perguntas que ajudem a pensar em soluções particulares. A sua pertinência dependerá efetivamente do estilo do mediador e também dos objetivos específicos da cada mediação em particular.

46A mediação apoiada na construção lógica do processo maiêutico que abordámos aqui assentou num modelo reflexivo e transformador de resolução alternativa de conflitos, que pretende desconstruir posições inflexíveis e potenciar, assim, a oportunidade de alcançar a pacificação pretendida com a mediação. E se, por acaso, chegar à aporia – entenda-se, a nenhuma solução –, isso não significa que o seu recurso foi em vão e que nada ficou: o seu processo está no centro da possibilidade de construção de uma consciência, além dos limites daquele conflito específico, sem o qual, não se pode atingir a humanidade.

Referências bibliográficas

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73- Receção: 13.06.2022

74- Aprovação: 05.11.2022

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Notas

1 Apesar de ser designada nominalmente apenas no Teeteto, a maiêutica surge já descrita em Ménone, de Platão (cf. Platão, 1945, pp. 35 e ss).

2 Disse solução e não acordo, porque poderá acontecer que a solução do conflito não se traduza necessariamente num acordo. Mais do que alcançar um acordo, a mediação procura encontrar uma forma de comunicação positiva, capaz de promover a pacificação e o apaziguamento entre as partes, sendo, portanto, possível atender a necessidades sem a existência de um acordo propriamente dito. Subjacente a isto está a ideia de que existe qualquer coisa de proveitoso no ato de participar num diálogo. O processo é, em certo sentido, o próprio produto. Tal remete-nos para a defesa de um Modelo Transformativo de mediação, segundo o qual o mais importante não é atingir um acordo, mas antes garantir os vários momentos encadeados que abrem a oportunidade de (res)estabelecimento dos laços sociais quebrados pelo conflito.

3 Sobre a diferença entre arbitragem, mediação e conciliação, cf. Ferreira (2006, p. 110).

4 A dialética, isto é, o método de procurar o conhecimento através de pergunta e resposta, tem sido frequentemente associada a Sócrates. No entanto, segundo Russell (2017, p. 100), não foi inventada por ele: “Parece que Zenão, discípulo de Parménides, foi o primeiro a praticá-la sistematicamente”. Ainda assim, tudo leva a crer que só a partir de Sócrates é que ela atingiu o nível máximo do seu desenvolvimento.

5 Há um aceso debate entre os estudiosos acerca da possibilidade de aproximar a conceção de Sócrates, como parteiro do saber, à teoria da reminiscência, como é exposta em Ménone, apesar da evidente diferença que as separa: a maiêutica é essencialmente uma caracterização metafórica de um processo, ao passo que a reminiscência tem o carácter de uma teoria.

6 Para uma lista mais completa dos requisitos do mediador, cf. a Lei n.º 29/2013, de 19 de abril, que estabelece os princípios gerais aplicáveis à mediação realizada em Portugal, bem como os regimes jurídicos da mediação civil e comercial, dos mediadores e da mediação pública.

7 As posições geralmente surgem numa fase inicial do processo, apesar de se poderem manter até ao fim, e dizem respeito àquilo que a parte quer ou pretende; por seu lado, a motivação – alguns autores, como Fisher, Ury e Patton (2019), optam pelo termo interesse – diz respeito às razões que estão por detrás da posição e que traduzem o que convém às partes. Aqui optei pelo termo motivação por entender que o interesse nem sempre corresponde às verdadeiras necessidades das partes.

8 Entende-se por fases da mediação: “O atendimento, geralmente sistematizado em três momentos – o antes (reunião da equipe, prévia à reunião com os mediandos), o durante (reunião com os mediandos) e o depois (reunião da equipe, pós-reunião com os mediandos)” (Almeida, 2014, p. 149).

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Para citar este artigo

Referência do documento impresso

JOÃO TIAGO GOUVEIA, «A Maiêutica como Técnica na Mediação de Conflitos»Configurações, 30 | -1, 113-128.

Referência eletrónica

JOÃO TIAGO GOUVEIA, «A Maiêutica como Técnica na Mediação de Conflitos»Configurações [Online], 30 | 2022, posto online no dia 02 janeiro 2023, consultado o 03 novembro 2024. URL: http://journals.openedition.org/configuracoes/16370; DOI: https://doi.org/10.4000/configuracoes.16370

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Autor

JOÃO TIAGO GOUVEIA

Escola de Letras, Artes e Ciências Humanas da Universidade do Minho (ELACH); Centro de Ética, Política e Sociedade (CEPS).

Joao_gouveia_@hotmail.com

ORCID ID: https://orcid.org/0000-0002-9388-7792

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