2Isto tenderia a estabelecer a categoria - e sublinhar o dilema, no que diz respeito à Rússia - do “poder pobre”, desde os tempos modernos: um Estado com grandes ambições territoriais e políticas, capaz de agir dramaticamente em intervalos de tempo limitados, mas impedido de fazê-lo a longo prazo. E sempre impondo uma privação significativa a sua população, numa tentativa de manter sua posição.

4Para o PIB, uma das fontes mais confiáveis é o banco de dados do Banco Mundial: ele nos permitiu construir a Figura 1, que mostra tanto o volume total do PIB (pelo tamanho dos círculos), sua composição entre o PIB agrícola, industrial e de serviços (pela cor dos setores) e, finalmente, o PIB per capita (pela cor de fundo atribuída aos países), tudo para 2019, antes das perturbações introduzidas pela pandemia da COVID.

5De fato, neste mapa, a Rússia aparece em uma posição intermediária, tanto em termos de volume total e composição do PIB, quanto em termos de PIB per capita, ela está em um grupo intermediário entre os países ricos da América do Norte, da Ásia Oriental (Japão, Coréia do Sul, Taiwan) e da Europa Ocidental , mais a Arábia Saudita, Austrália e Nova Zelândia, e os países realmente pobres da África e da Ásia (mais a Bolívia, Venezuela e alguns países da América Central).

6Como essa análise- muito simplificada - da riqueza se relaciona com a do poder militar? A probabilidade de vencer uma guerra está de fato apenas parcialmente correlacionada com os elementos gerais do poder econômico e militar. Eles determinariam o número de guerras que poderiam ser travadas e vencidas, mas não garantiriam que todas elas seriam vencidas, devido à diversidade das formas assumidas pelos conflitos e às complexidades crescentes quando se trata de coalizões.

• O índice não se baseia apenas no número total de armas disponíveis para um determinado país, mas também se concentra na diversidade da força de ataque disponível;

• Enquanto os estoques de armas nucleares não são levados em conta, as potências nucleares reconhecidas ou suspeitas recebem um "bônus";

• O desenvolvimento econômico dos estados está incluído na análise;

• Fatores geográficos, confiabilidade logística, recursos naturais e indústria local são importantes;

• O total da força de trabalho disponível é um fator chave, pois influencia muitos outros indicadores;

• Os Estados sem litoral não são penalizados por não terem uma marinha, mas as marinhas existentes são penalizadas pela falta de diversidade de bens;

• Os Estados membros de uma aliança militar (por exemplo, a OTAN) recebem um bônus devido à partilha teórica de recursos;

• A estabilidade financeira dos Estados é levada em conta;

• A influência diplomática não está incluída na análise.

8Deve-se observar que a metodologia de cálculo do Power Index é revisada quase todos os anos para levar em conta os vários avanços/ mudanças tecnológicas no campo da defesa nacional. Portanto, qualquer comparação deste indicador de um ano para outro ou durante um determinado período deve ser tratada com cautela.

9A figura 2 combina um mapa produzido a partir deste índice (invertendo o esquema de cores para destacar os países com o índice mais baixo e, portanto, a maior potência militar), com outro indicador também extraído das bases de dados do Banco Mundial, a porcentagem das despesas militares no PIB em 2019.

10Em ambos os casos, a Rússia está simultaneamente no primeiro grupo de países do mundo, enquanto outros estão em categorias diferentes nos dois mapas: A China já está entre as principais potências militares, apesar de consagrar uma parte menor de seu PIB aos gastos militares, enquanto outros países, apesar de gastar muito nesta área, não obtêm poder militar significativo em troca: este é o caso de países onde os gastos militares são dissipados em guerras civis, como na Líbia ou na Colômbia, ou em conflitos regionais, como aquele em que a Arábia Saudita está envolvida

11Para relacionar o poder econômico (medido pelo ranking de PIB) ao poder militar (medido pelo Power Index), foi adotado o método estatístico de resíduos de regressão linear, que é a base da figura 3. Baseia-se no princípio do desvio à relação linear entre as duas variáveis (onde os países estão próximos da média mundial), distinguindo pelo jogo de gradações de cores os países onde o poder econômico é maior que o poder militar (em azul claro ou azul escuro no mapa) e aqueles onde é o oposto (em amarelo, laranja e vermelho no mapa)

12O resultado coloca a Rússia no grupo dos países mais “belicosos” (com uma potência militar maior do que se poderia esperar com base em seu PIB), o que a aproxima do Egito, Paquistão, Argélia e Congo. Em contrapartida, o grupo dos países mais “pacíficos” (com menos poder militar do que seria de se esperar dado seu PIB) inclui Irlanda, Bélgica, Países-Baixos, México, Canadá, Alemanha e Japão. Pode ser uma surpresa encontrar os Estados Unidos na lista, mas seu PIB é tão superior ao de qualquer outro país do mundo que pode ser tanto a maior potência econômica mundial quanto a maior potência militar do mundo.

13Esta análise tende a mostrar que o belicismo estatal é talvez a ameaça mais importante no atual contexto global, especialmente quando os belicistas agem além de suas possibilidades. Para completá-lo, seria necessário avaliar o peso dos militares (importantes) e da instituição militar (variável) no sistema social e político russo. Ele é sempre muito importante, mas nunca diretamente no poder, e seria necessário verificar se atualmente trata-se, de fato, de um setor militar-industrial, militar-burocrático, militar-máfia, ou uma mistura dos três.

14Em qualquer caso observamos – sendo muito cautelosos se quisermos fazer o menor prognóstico – que os russos não implementaram a arte operativa, que eles desenvolveram e que deu bons resultados no passado. Há duas hipóteses: ou eles não têm inteligência suficiente, ou eles não têm os meios para travar uma guerra longa e generalizada, com operações profundas.

15Isto leva a outra hipótese (a ser verificada por indicadores precisos), que as ditaduras dos séculos XX e XXI seriam melhores no início das guerras (pelo menos as guerras clássicas entre estados, não as assimétricas) e guerras curtas, mas que as democracias seriam melhores quando os conflitos duram...