2O trabalho doméstico remunerado é um fenômeno social marcado pela predominância feminina em todo o mundo, como consequência da divisão sexual do trabalho que naturaliza o trabalho reprodutivo (tarefas associadas à manutenção do ser humano) como responsabilidade das mulheres (Hirata & Kergoat 2007). Na América Latina e Caribe, essa ocupação tem um peso expressivo no mercado de trabalho feminino. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) (2021a), em 2019, 91,1% dos trabalhadores domésticos da região eram mulheres e elas correspondiam, em média, a 11,3% de todas as mulheres ocupadas. Essa participação chega a 35,3% entre as mulheres migrantes ocupadas, pois o trabalho doméstico remunerado é uma importante fonte de emprego para aquelas recém-chegadas no país de destino. No entanto, as condições laborais dessas mulheres geralmente são muito precárias, principalmente em países onde a regularização da migração é mais restritiva e a profissional permanece por um bom tempo - em alguns casos por toda a vida - com medo de ser deportada e sem proteção legislativa laboral (Lexartza, Chaves & Carcedo 2016).

3O trabalho doméstico remunerado no Brasil é também uma continuidade das relações de trabalho estabelecidas durante o período escravista, decorrente da divisão racial do trabalho (Teixeira 2021). Apesar da forma de remunerar esse trabalho ter mudado com o tempo, preconceitos, estereótipos e discriminações permanecem sobre a ocupação, que ainda é pouco reconhecida socialmente e desvalorizada monetariamente (Sanches 2009). Em razão também da herança escravista, as mulheres negras continuam sendo maioria na ocupação, que é caracterizada por alto grau de informalidade, baixa remuneração e extensas jornadas de trabalho (OIT 2021a).

5No Brasil, o peso do trabalho doméstico no conjunto da força de trabalho feminina já foi em torno de 20%, durante as décadas de 1990 e 2000, quando a ocupação era a mais frequente entre as mulheres ocupadas. Com o maior investimento em políticas públicas voltadas à educação e qualificação profissional, nos anos 2000, esse peso foi diminuindo. Em 2019, a participação das trabalhadoras domésticas entre as mulheres brasileiras ocupadas correspondia a cerca de 14% e o serviço doméstico era o segundo grupo de atividade mais frequente no mercado de trabalho feminino (PNAD Contínua 2019). Entre os países da América Latina, o Brasil era o terceiro com maior percentual de trabalhadoras domésticas entre as mulheres ocupadas, em 2019, sendo a primeira posição da Argentina (17,8 %) e a segunda do Paraguai (17,2%) (OIT 2021a).

7Diante do exposto, e como destacam a Convenção nº 189 e a Recomendação nº 201 sobre Trabalho Decente para as Trabalhadoras e os Trabalhadores Domésticos da OIT, o trabalho doméstico remunerado é um tema de grande relevância, pois:

(...) apresenta grandes desafios do ponto de vista da ação pública e da organização de atores sociais. Sua complexidade é colocada em função de suas características peculiares, de seu papel na estruturação do mercado de trabalho, bem como de seu entrelaçamento com aspectos fundamentais da organização social e das desigualdades de gênero e raça, como a divisão sexual do trabalho e a desvalorização do trabalho reprodutivo. Trabalhadoras/es domésticas/os sofrem sistematicamente com o desrespeito aos direitos humanos e aos direitos fundamentais no trabalho (OIT 2011, 2).

8Dada a relevância da temática, vêm crescendo nos últimos anos o número de estudos sobre o trabalho doméstico remunerado em diversas áreas do conhecimento. No Brasil, há algumas fontes de dados secundários que viabilizam nestes estudos a análise da categoria, sendo as mais utilizadas aquelas direcionadas à investigação do comportamento do mercado de trabalho, como a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e a PNAD Contínua. Contudo, essas pesquisas têm limitações amostrais e de cobertura geográfica, que dificultam determinadas desagregações e impedem estudos em áreas geográficas menores, como os municípios dos interiores.

9Os Censos Demográficos (CDs) também incorporam a temática do trabalho e rendimento, mas, ao contrário das pesquisas sobre o mercado de trabalho com amostras reduzidas, possibilitam analisar todas as variáveis e grupos populacionais específicos em nível municipal (Dota et al. 2018). Contudo, é uma fonte de dados ainda pouco utilizada nos estudos sobre o trabalho doméstico remunerado, principalmente devido a sua periodicidade decenal.

10Nesse sentido, o objetivo deste artigo é analisar as potencialidades e fragilidades dos CDs brasileiros de 2010 e 2022 para o estudo da categoria. Para tanto, inicialmente são apresentadas, em linhas gerais, as características das principais fontes de dados estatísticos que possibilitam estudar a temática do trabalho doméstico remunerado no Brasil. Em seguida, são apresentadas algumas estatísticas sobre o trabalho doméstico remunerado, elaboradas a partir dos dados do CD de 2010, como exemplo da utilidade dessa fonte de informação para estudos e para a formulação de políticas públicas. Por fim, são discutidos os quesitos disponíveis em ambos os Censos para as análises das características socioeconômicas e demográficas das trabalhadoras domésticas.

Fontes de dados estatísticos para o estudo do trabalho doméstico remunerado no Brasil

12A PNAD, a PME e PNAD Contínua são pesquisas desenhadas para suprir informações sobre o comportamento do mercado de trabalho sendo, por isso mesmo, as principais fontes de dados utilizadas para estimar as trabalhadoras domésticas existentes no país e caracterizá-las em termos sociodemográficos e ocupacionais. Essas pesquisas são baseadas em amostras representativas de todos os domicílios brasileiros e captam todas as formas de relação de trabalho existentes no país, com destaque para o trabalho formal e informal.

14Desde 1992, a PNAD também investigava outra temática muito importante para o estudo do trabalho doméstico remunerado que é a migração interna. De acordo com Cunha e Jakob (2011), a inserção dessa componente demográfica na pesquisa foi um avanço importante, porque abriu a possibilidade de acompanhamento anual do fenômeno migratório, que já era considerado pelo CD, mas em periodicidade decenal. Os autores também ressaltam que, na prática, a temática permaneceu pouco trabalhada, em que pese os dados anuais da PNAD, principalmente pelos demógrafos.

15De fato, o tamanho e o nível de representatividade da amostra da PNAD não permitem conhecer a realidade migratória dos municípios e das regiões dentro dos estados, com exceção de algumas regiões metropolitanas. Cunha e Jakob (2011) também chamam atenção para o fato de que o tamanho da amostra interfere na qualidade da informação para a análise de UFs menores, especialmente aquelas localizadas nas Regiões Norte e Nordeste. E, no caso de recortes espaciais envolvendo segmentos populacionais específicos, como o das trabalhadoras domésticas, as limitações amostrais são ainda maiores, em contraposição aos dados do Censo (Dota et al. 2018).

16Outra limitação é que a periodicidade anual da PNAD não permite um acompanhamento da situação conjuntural do mercado de trabalho, ou seja, uma avaliação mais frequente das flutuações e tendências de curtíssimo prazo da força de trabalho no país. Nesse sentido, nos anos 1980, surgiu mais uma pesquisa domiciliar, a PME, que teve como objetivo investigar mensalmente questões sobre trabalho, educação e características demográficas, em seis regiões metropolitanas (Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre) (IBGE 2016b).

18Desse modo, para subsidiar os estudos mais recentes sobre o trabalho doméstico no Brasil, a pesquisa mais utilizada tem sido a PNAD Contínua, apesar de suas limitações. De acordo com o DIEESE (2021, 37), os dados coletados nesta pesquisa permitem:

191) traçar o perfil demográfico da/o trabalhador/a e das pessoas que compõem o seu domicílio, com informações sobre idade, raça, região geográfica, escolaridade, local de moradia, posição no domicílio, arranjo domiciliar, presença de filhas/os, idade das/os filhas/os, presença de idosas/os, idade das/os idosas/os, entre outras características;

202) descrever as condições de trabalho e proteção social destas/es trabalhadoras/es, com informações sobre rendimentos, jornada de trabalho produtivo e reprodutivo, insuficiência de horas trabalhadas, tempo de permanência no trabalho, contribuição para a previdência social, forma de contribuição etc.;

213) traçar o perfil demográfico e descrever as condições de trabalho das/os trabalhadoras/es domésticas/os, segundo o local de residência (residentes ou não nos domicílios das/os empregadoras/es); número de domicílios nos quais trabalham, o que permite a distinção entre diaristas e mensalistas; horas semanais trabalhadas; formalização ou não do contrato de trabalho (formais e informais); e tipo de ocupação exercida (trabalhadoras/es nos serviços domésticos gerais, trabalhadoras/es nos cuidados pessoais em domicílio, profissionais da cozinha, e outras ocupações); e,

224) fazer estudos longitudinais ou de painel sobre a mobilidade ocupacional das/os trabalhadoras/es domésticas/os em determinado período, inclusive de forma intergeracional, considerando gerações ascendentes (avós e avôs, mães e pais) e as gerações descendentes (netas/os e filhas/os), de forma comparativa.

O Censo Demográfico e suas especificidades

26O CD, diferentemente das demais pesquisas domiciliares já descritas, tem dois questionários. O chamado questionário básico é aplicado em todos os domicílios brasileiros e investiga informações mais gerais sobre os mesmos e sobre seus/suas moradoras/es. Já o questionário da amostra é aplicado em uma amostra da população selecionada aleatoriamente e abarca várias temáticas mais específicas, incluindo perguntas sobre trabalho, rendimento, educação, religião, deficiência física ou mental, fecundidade, mortalidade, nupcialidade e migração (IBGE 2022b). Desde 1940, a periodicidade do Censo tem sido decenal, com exceção dos anos de 1990 e 2020, quando a pesquisa não aconteceu por dificuldades de natureza política e orçamentária. Na década de 1990, o censo teve como referência o ano de 1991 e o previsto para 2020 será realizado neste ano de 2022.

27O CD tem um processo de amostragem para a aplicação do questionário expandido distinto das demais pesquisas domiciliares descritas anteriormente, o que permite a análise de todas as suas variáveis e de grupos populacionais específicos, em nível municipal (Dota et al. 2018). De acordo com Cunha e Jakob (2011), uma das maiores vantagens dos censos demográficos é possibilitar inúmeros cruzamentos de variáveis e um maior número de categorias de respostas para cada uma delas. Essa característica é uma vantagem importante para o estudo sobre as trabalhadoras domésticas, principalmente as residentes nos interiores do país. Além disso, permite analisar os movimentos migratórios realizados por elas e os rendimentos familiares advindos de outras fontes, como por exemplo o PBF, PETI e BPC. Contudo, a periodicidade de 10 anos é a maior desvantagem do Censo para o estudo do trabalho doméstico remunerado, comparado às demais pesquisas domiciliares. Isso porque estas têm periodicidade bem menores, o que viabiliza análises essenciais de mercado de trabalho, como as de tendência e conjuntura.

28Cabe destacar que os sistemas de classificação ocupacional e de setores de atividade econômica não são os mesmos utilizados em cada pesquisa. Contudo, de acordo com Barbosa (2014, 23) “as PNADs sempre se utilizaram dos sistemas empregados nos Censos Demográficos do início do decênio”. Além disso, o autor afirma que a Comissão Nacional de Classificações (Concla) do IBGE tem feito o esforço de compatibilizar os sistemas de classificação, mas chama a atenção para os possíveis problemas de confiabilidade nos níveis mais desagregados. No CD de 2010, por exemplo, o IBGE utilizou a Classificação de Ocupações para Pesquisas Domiciliares (COD), desenvolvida para as pesquisas domiciliares com base no International Standard Classification of Occupations – ISCO-08. A PNAD Contínua também vem utilizando a COD. Com relação à classificação das atividades, ambas as pesquisas utilizam a Classificação Nacional de Atividades Econômicas Domiciliar (CNAE-Domiciliar 2.0), que é uma adaptação da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE 2.0) para as pesquisas domiciliares.

29Os CDs são pesquisas que abarcam a temática trabalho e rendimento de uma forma mais resumida do que a PNAD e a PNAD Contínua. Isso porque, segundo Barbosa (2014), o trabalho é o tema central e estruturante das PNADs. Consequentemente, o total de quesitos destinados à investigação sobre o tema é maior do que nos Censos. No que tange ao estudo do trabalho doméstico remunerado, são notórias as maiores possibilidades de análises trazidas pela PNAD e PNAD Contínua, uma vez que há quesitos específicos direcionados à investigação sobre o serviço doméstico (remunerado e não remunerado) no Brasil para pessoas com 14 anos ou mais de idade. Porém, a limitação amostral das PNADs impede uma análise mais detalhada dos movimentos migratórios e da mobilidade pendular das trabalhadoras domésticas, bem como não permite que os estudos sejam realizados em todos os municípios brasileiros, o que é viabilizado pelos Censos. Além disso, os Censos possibilitam o conhecimento sobre as questões de trabalho e rendimento das trabalhadoras domésticas com 10 anos ou mais de idade, e o detalhamento das suas condições de vida, como as características dos domicílios, os arranjos familiares, a identificação étnico-racial e a escolaridade, informações que dizem muito sobre o contexto em que vivem essas mulheres.

Um panorama do trabalho doméstico remunerado no Brasil com base nos dados do Censo de 2010

30Para exemplificar a utilidade dos dados dos CDs nos estudos sobre o trabalho doméstico remunerado no Brasil, esta seção apresenta uma análise das características socioeconômicas e demográficas das trabalhadoras domésticas residentes no país, que estavam ocupadas na semana de 25 a 31 de julho de 2010, com base nos dados do CD de 2010.

32Segundo o CD de 2010, havia 4.949.965 pessoas ocupadas como trabalhadoras dos serviços domésticos em geral no Brasil, correspondendo a 5,7% da população ocupada (remunerada ou não) brasileira. As mulheres compõem 94,4% desse grupo. As trabalhadoras domésticas correspondem a 12,8% no grupo de pessoas ocupadas do sexo feminino. Tinham carteira assinada 34,2% delas, e 6,9% contribuíam com um instituto de previdência oficial, enquanto para as demais pessoas ocupadas no país esses valores eram de 47,2% e 22,3%, respectivamente. Em termos de posição no domicílio de residência, 75,0% eram responsáveis pelo domicílio ou cônjuges das/os responsáveis, e 4,3% eram trabalhadoras domésticas (enquanto as demais pessoas ocupadas registraram 69,2% e 0,3%, respectivamente).

33Com relação ao rendimento, a renda média em salário-mínimo (s.m.) das trabalhadoras domésticas correspondia a 0,89 s.m., enquanto para as demais pessoas ocupadas essa renda era de 2,37 s.m. Diante do baixo rendimento, as famílias dessas mulheres são mais frequentes entres as elegíveis aos programas de transferência de renda, o que denota situação de vulnerabilidade delas. De acordo com os dados, 16,1% das famílias das trabalhadoras domésticas no país acessaram o benefício do PBF ou do PETI. Contudo, as diferenças socioeconômicas regionais são significativas e, por isso, no Nordeste esse percentual foi quase o dobro (30,6%). No Censo de 2022, a informação sobre o rendimento de demais fontes foi resumida em uma única pergunta que indicará apenas o valor, ou seja, não será possível distinguir a fonte pagadora. Portanto, a análise sobre o acesso a políticas públicas de tranferência de renda não será mais viável com base nos dados do Censo de 2022. Pesquisadoras/es que queiram fazer esse tipo de análise terão que usar de muita criatividade na construção de proxis para inferir sobre as fontes pagadoras.

34A Tabela 1 apresenta a distribuição das pessoas ocupadas em trabalho doméstico e as demais pessoas ocupadas no Brasil, em 2010, por faixas de idade. As trabalhadoras domésticas estão mais concentradas na faixa de 30 até 59 anos, indicando um grupo mais envelhecido que as demais pessoas ocupadas, as quais apresentam maior concentração nas faixas de 10 até 29 anos. De fato, o processo de envelhecimento tem sido mais acelerado para as trabalhadoras domésticas se comparado às demais ocupações como consequência de dois principais fenômenos: o crescimento da participação das mulheres com mais 60 anos de idade e a redução da participação das mulheres mais jovens (Pinheiro et al. 2021). Este último fenômeno pode ser explicado pelo aumento da escolaridade das meninas mais jovens, proporcionado pela expansão do ensino técnico e superior nos anos 2000. A melhoria da qualificação permitiu, por exemplo, a inserção das filhas das trabalhadoras domésticas, que tinham grandes chances de reproduzir a ocupação de suas mães, em outras ocupações menos estigmatizadas (Silva 2020), porém não necessariamente menos precarizadas (Pinheiro et al. 2021), como a atuação em centros de telemarketing.

35Tabela 1 – Brasil. Distribuição de pessoas segundo ocupação em trabalho doméstico e demais ocupações, por faixas de idade. 2010.

Faixas de idade em anos	%
	Trabalho Doméstico	Demais
10 a 14	0,8	1,2
15 a 19	4,4	6,2
20 a 24	8,1	12,4
25 a 29	10,9	14,1
30 a 34	14,0	13,6
35 a 39	14,8	12,1
40 a 44	14,5	11,2
45 a 49	12,4	9,9
50 a 54	9,3	7,7
55 a 59	5,8	5,4
60 e mais	4,9	6,1
Total	100,0	100,0

Fonte: Microdados do Censo Demográfico de 2010. Elaboração própria.

36A distribuição de pessoas ocupadas em trabalho doméstico e demais pessoas ocupadas por cor/raça é apresentada na Tabela 2. Conforme afirma Abreu (2021, 11), “o trabalho doméstico remunerado pode ser considerado um espaço racializado”, pois, historicamente, as mulheres negras são mais frequentes entre as trabalhadoras domésticas. Com efeito, as pessoas negras (soma das pessoas declaradas pretas com as declaradas pardas) correspondem a 61,3% das pessoas ocupadas no trabalho doméstico, enquanto somam 48,6% nas demais ocupações. As menores oportunidades de escolarização, mais responsabilidades domésticas e o racismo estrutural resultam na maior presença de mulheres negras em trabalhos precarizados, como o trabalho doméstico (Gonzalez 2018; Abreu 2021; Teixeira 2021).

Tabela 2 – Brasil. Distribuição de pessoas segundo ocupação em trabalho doméstico e demais ocupações, por cor/raça. 2010.

Cor/raça	%
	Trabalho Doméstico	Demais
Branca	37,5	50,0
Preta	12,5	8,2
Amarela	0,9	1,1
Parda	48,8	40,4
Indígena	0,3	0,3
Total	100,0	100,0

Fonte: Microdados do Censo Demográfico de 2010. Elaboração própria

37A Tabela 3 exibe a distribuição percentual das trabalhadoras domésticas e das demais pessoas ocupadas, por escolaridade. A elevada proporção de 63,0% de pessoas sem instrução ou com ensino fundamental incompleto no trabalho doméstico, em comparação aos 38,6% nesse nível para as demais ocupações, reforça a situação precarizada em que se encontram essas mulheres. De acordo com Pinheiro et al. (2021), entre 1995 e 2019, houve um aumento no total de anos de estudo das trabalhadoras domésticas, mas a baixa escolaridade permanece como uma característica frequente entre as mulheres ocupadas na categoria. Contudo, as autoras reconhecem que a ampliação do acesso à escolaridade minimizou as desigualdades raciais e regionais neste indicador, pois independentemente da cor/raça ou da região de residência, as trabalhadoras domésticas apresentaram em torno de sete anos de estudo, em 2019.

Tabela 3 – Brasil. Distribuição de pessoas segundo ocupação em trabalho doméstico e demais ocupações, por escolaridade. 2010.

Escolaridade	%
	Trabalho Doméstico	Demais
Sem instrução e fundamental incompleto	63,0	38,6
Fundamental completo e médio incompleto	21,4	17,9
Médio completo e superior incompleto	15,3	30,8
Superior completo	0,3	12,7
Total	100,0	100,0

Fonte: Microdados do Censo Demográfico de 2010. Elaboração própria.

38Segundo a Tabela 4, que mostra a distribuição das trabalhadoras domésticas e as demais pessoas ocupadas por lugar de trabalho, as pessoas ocupadas no trabalho doméstico desempenham suas atividades no próprio município em proporção ligeiramente maior que as pessoas de outras ocupações. Há, portanto, uma indicação de que aquelas realizam pendularidade para trabalhar em outro município em menor grau que estas.

Tabela 4 – Brasil. Distribuição de pessoas segundo ocupação em trabalho doméstico e demais ocupações, por lugar de trabalho. 2010.

Lugar de trabalho	%
	Trabalho Doméstico	Demais
No próprio domicílio	21,3	23,2
Apenas neste município, mas não no próprio domicílio	67,7	64,0
Em outro município	10,8	11,8
Em mais de um município ou país	0,2	1,0
Total	100,0	100,0

Fonte: Microdados do Censo Demográfico de 2010. Elaboração própria.

39Apesar de pendularem menos, são as trabalhadoras domésticas que levam mais tempo para chegar ao trabalho, com proporção de 14,2% dentre as que demoram mais de uma hora, enquanto 11,4% das demais pessoas ocupadas levam esse mesmo tempo de deslocamento (Tabela 5). Esse resultado evidencia que além de vivenciarem uma jornada média de trabalho elevada, as trabalhadoras domésticas também gastam muito tempo no deslocamento para o trabalho. Cabe ressaltar que pelo Censo de 2022 não mais será possível estimar o tempo médio da jornada de trabalho semanal, pois a pergunta sobre o tempo dedicado ao trabalho foi excluída do questionário. Por outro lado, como a resposta para a pergunta sobre o tempo de deslocamento passou a ser em horas e minutos, será possível calcular o tempo médio de deslocamento de cada ocupação.

Tabela 5 – Brasil. Distribuição de pessoas segundo ocupação em trabalho doméstico e demais ocupações, por tempo de deslocamento diário até lugar de trabalho. 2010.

Tempo de deslocamento em faixas	%
	Trabalho Doméstico	Demais
Até 05 minutos	11,2	13,1
De 06 minutos até meia hora	50,3	52,2
Mais de meia hora até uma hora	24,4	23,3
Mais de uma hora até duas horas	11,9	9,6
Mais de duas horas	2,3	1,8
Total	100,0	100,0

Fonte: Microdados do Censo Demográfico de 2010. Elaboração própria.

40Com relação à migração, os dados do Censo de 2010 registram que 1.129.461, ou 22,8% das trabalhadoras domésticas, eram migrantes interestaduais no Brasil em 2010. Em São Paulo, estado que historicamente recebeu mais migrantes das outras UFs, residiam 42% delas (475.683), indicando a atratividade migratória do estado também para as pessoas ocupadas nessa profissão. Dessas trabalhadoras, 62% eram nascidas em uma UF da Região Nordeste. O grupo de trabalhadoras domésticas imigrantes interestaduais residentes em São Paulo apresenta características semelhantes ao grupo ampliado das pessoas ocupadas nessa profissão, exceto na proporção de pessoas com carteira assinada (49%), das que contribuíam para um instituto oficial de previdência (10,3%) e no rendimento médio em salários-mínimos (1,17 s.m.). Ou seja, as trabalhadoras domésticas migrantes interestaduais residentes em São Paulo tinham situação ligeiramente melhor do que as demais pessoas ocupadas no trabalho doméstico em termos de segurança nas relações de trabalho.

41Por fim, ressalta-se que o CD permite que as análises aqui apresentadas sejam também realizadas para unidades geográficas menores, como UFs e municípios. Devido às significativas desigualdades regionais presentes no Brasil, a precarização dessa ocupação também ocorre de forma desigual. Por isso, estudos direcionados às regiões menores se fazem necessários para compreender a heterogeneidade do trabalho doméstico remunerado no território brasileiro.

Os quesitos dos Censos Demográficos Brasileiros de 2010 e 2022 para o estudo do trabalho doméstico remunerado

42Os Quadros 1 a 4 apresentam os quesitos dos CDs de 2010 e 2022 no que se refere à temática trabalho e rendimento. Na comparação entre os questionários (básico e da amostra) do CD de 2022 com aqueles aplicados em 2010, observam-se potencialidades e fragilidades dos dados para os estudos sobre o trabalho doméstico remunerado no Brasil. Para pessoas com 10 anos de idade ou mais, ambos abordam questões sobre trabalhos com e sem remuneração, trabalho principal, procura de trabalho, rendimento de todos os trabalhos, rendimento de outras fontes e deslocamento para o trabalho. Para facilitar a visualização dos quadros, os quesitos que sofreram modificações de um questionário para outro estão destacados em amarelo, os quesitos retirados estão em rosa e os em verde claro foram os inseridos.

44Infelizmente, os CDs não perguntam às trabalhadoras domésticas o total de domicílios para os quais prestam seus serviços e a quantidade de dias trabalhados em cada um deles. Contudo, o tempo semanal dedicado ao trabalho principal, no CD de 2010, pode ser utilizado como medida alternativa para estimar as diaristas, pois jornadas de trabalho menores que 40 horas semanais tendem a ser realizadas por elas. Contudo, essa proxi apresenta a limitação de não contabilizar as diaristas que têm jornadas de trabalho semanal superiores a 40 horas e pode incorporar mensalistas com jornadas menores que 40 horas semanais. Uma alternativa era casar essa informação com a quantidade de trabalhos assumidos pela trabalhadora doméstica. Contudo, a informação sobre “quantidade de trabalhos” no CD considera o serviço doméstico remunerado prestado para diferentes famílias como um único trabalho remunerado, por isso, a alteração neste quesito não afeta a mensuração das diaristas. Por outro lado, a retirada a informação sobre o tempo semanal dedicado ao trabalho principal (quesito 6.49, CD 2010, Quadro 3). compromete essa estimativa e o estudo sobre a jornada de trabalho de todas as trabalhadoras domésticas e sua remuneração por unidade de tempo. Essa mudança representa a abertura de uma lacuna em um importante parâmetro nos estudos sobre a temática.

Quadro 1 – Comparativo de quesitos sobre trabalho e rendimento entre os Censos Demográficos de 2010 e 2022.

Trabalho e rendimento para a pessoa de 10 anos ou mais de idade
Censo 2010	Censo 2022
6.41 - Trabalhou ganhando em dinheiro, produtos, mercadorias ou benefícios? Benefícios: moradia, alimentação, treinamento etc.	14.01.1 - Trabalhou ou estagiou em alguma atividade remunerada em dinheiro?
	14.01.2 - Trabalhou ou estagiou em alguma atividade remunerada de outra forma que não dinheiro?
	14.01.3 - Fez algum bico ou trabalho ocasional remunerado?
6.42 - Tinha algum trabalho remunerado do qual estava temporariamente afastado(a)?	14.01.5 - Estava temporariamente afastado de algum trabalho remunerado?
6.43- Ajudou sem qualquer pagamento no trabalho remunerado de morador do domicílio?	14.01.4 - Ajudou sem receber pagamento no trabalho remunerado de algum morador do domicílio ou parente?
6.44 - Trabalhou na plantação, criação de animais ou pesca, somente para alimentação dos moradores do domicílio? Inclusive caça, e extração vegetal	14.01.6 - Trabalhou para alimentação dos moradores do domicílio na roça, criação de animais, pesca, extrativismo, caça?
6.45 - Quantos trabalhos tinha?	14.02 - Quantos trabalhos tinha na última semana de maio? (passou a ter opção de 3 ou mais, importante para as diaristas)

Fonte: IBGE - Questionários dos Censos Demográficos de 2010 e 2022

47No questionário da amostra do Censo de 2022 também há uma melhor formulação em relação no quesito 6.48 (“nesse trabalho era:”) do Censo de 2010 (Quadro 2). Entre as possíveis respostas a essa pergunta, uma significativa mudança para a temática em escopo foi a inclusão do trabalho doméstico remunerado e não remunerado como possibilidades de respostas para o trabalho principal (quesito 14.05, CD 2022). No Censo de 2010, as possibilidades de respostas eram menos detalhadas e a trabalhadora doméstica remunerada se encaixava em uma das seguintes respostas: empregado com carteira de trabalho assinada ou empregado sem carteira de trabalho assinada, dependendo da condição de formalização. Esse destaque ao trabalho doméstico facilitará certamente as análises a serem feitas futuramente. Trata-se de mais uma potencialidade do novo Censo para as reflexões sobre a temática. No que se refere aos vínculos empregatícios, foi incluída uma pergunta específica sobre ter a carteira assinada ou não (quesito 14.06, CD 2022), informação que era investigada dentro do quesito 6.48 do Censo 2010, por meio das possíveis respostas. Além disso, a informação sobre o rendimento de todos os trabalhos passou a ter como opção de resposta, além do campo aberto, as faixas de rendimento (Quadro 3).

Quadro 2 – Comparativo de quesitos sobre trabalho principal e procura de trabalho entre os Censos Demográficos de 2010 e 2022.

Trabalho principal
Censo 2010	Censo 2022
6.46 - Qual era a ocupação que exercia no trabalho que tinha?	14.03 - Qual era a ocupação, cargo ou função que tinha nesse trabalho?
6.47 - Qual era a atividade principal do empreendimento (negócio, firma, empresa, instituição, entidade etc.) em que tinha esse trabalho?	14.04 - Qual era a principal atividade do negócio ou empresa em que tinha esse trabalho?
6.48 - Nesse trabalho era: (trabalhador doméstico com ou sem remuneração não estava incluído como possível resposta)	14.05 - Nesse trabalho era: (passou a compor as opções de resposta trabalhador doméstico, inclusive diarista, e trabalhador não remunerado em ajuda a algum morador do domicílio ou parente)
	14.06 - Nesse trabalho tinha carteira de trabalho assinada?
6.49 - Quantas pessoas empregava nesse trabalho?
	14.07 - Esse negócio ou empresa era registrado no cadastro nacional de pessoa jurídica - CNPJ?
6.50 - Era contribuinte de instituto de previdência oficial em algum trabalho que tinha na semana de 25 a 31 de julho de 2010?	14.08 - Era contribuinte de instituto de previdência oficial (INSS) nesse trabalho?
Procura de trabalho
Censo 2010	Censo 2022
6.54 - No período de 02 a 31 de julho de 2010 tomou alguma providência, de fato, para conseguir trabalho?	14.09 - No mês de maio, tomou alguma providência para conseguir trabalho, seja um emprego ou iniciar um negócio próprio?
6.55 - Se tivesse conseguido trabalho, estaria disponível para assumi-lo na semana de 25 a 31 de julho de 2010?	14.10 - Se tivesse conseguido um trabalho, poderia ter começado a trabalhar na última semana de maio?

Fonte: IBGE - Questionários dos Censos Demográficos de 2010 e 2022

48Por outro lado, o Censo de 2022 tem uma perda importante na informação sobre os rendimentos das trabalhadoras domésticas, o que pode comprometer estudos relativos ao acesso a políticas públicas por parte delas e de suas famílias (Quadro 3). A pergunta sobre outras fontes de rendimentos do questionário da amostra do Censo de 2022 agrupou as fontes oriundas de programas de transferência de renda, como PBF e BPC; fontes previdenciárias, como aposentadoria e pensão; e outras fontes, como aluguel (quesito 14.13, CD 2022). Cabe ressaltar que, no questionário da amostra do Censo de 2010, estas informações eram coletadas em quatro perguntas sobre outras fontes de rendimentos habituais mensais: uma primeira sobre aposentadoria e pensão (quesito 6.56, CD 2010); uma segunda sobre transferência de renda do PBF e do PETI (quesito 6.57, CD 2010); uma terceira acerca de rendimentos oriundos de outros programas sociais e de transferência de renda (quesito 6.58, CD 2010); e, por fim, a última sobre outras fontes, como aplicações financeiras, aluguel e previdência privada (quesito 6.59, CD 2010). A pergunta agrupada, como foi elaborada para o Censo de 2022, inviabiliza analisar o acesso das trabalhadoras domésticas às políticas públicas e a relevância destas no seu orçamento familiar.

Quadro 3 – Comparativo de quesitos sobre rendimento de todos os trabalhos e rendimento de outras fontes entre os Censos Demográficos de 2010 e 2022.

Rendimento de todos os trabalhos
Censo 2010	Censo 2022
6.51 - No trabalho principal, qual era o rendimento bruto (ou a retirada) mensal que ganhava habitualmente em julho de 2010?	14.11 - Qual era o rendimento bruto mensal que recebia normalmente neste trabalho? (passou a ter como opção de respostas além do campo aberto, faixas de rendimento).
6.52 - Nos demais trabalhos, qual era o rendimento bruto (ou a retirada) mensal que ganhava habitualmente em julho de 2010?	14.12 - Qual era o rendimento bruto mensal que recebia normalmente neste e nos outros trabalhos? (passou a ter como opção de respostas além do campo aberto, faixas de rendimento)
6.53 - No trabalho principal, quantas horas trabalhava habitualmente por semana?
Rendimento de outras fontes
Censo 2010	Censo 2022
6.56 - Aposentadoria ou pensão de instituto de previdência oficial (federal, estadual ou municipal)?	14.13 - Recebeu rendimento bruto mensal de aposentadoria, pensão, bolsa família, BPC, aluguel ou outra origem?
6.57 - Programa social bolsa-família ou programa de erradicação do trabalho infantil - PETI?
6.58 - Rendimento de outros programas sociais ou de transferências?
6.59 - Outras fontes (juros de poupança, aplicações financeiras, aluguel, pensão ou aposentadoria de previdência privada etc.)
6.591 - Em julho de 2010 qual foi o valor total deste(s) rendimento(s)?	14.13.1 - Valor: R$

Fonte: IBGE - Questionários dos Censos Demográficos de 2010 e 2022

49Com relação à Seção trabalho e rendimento, o último destaque a ser feito refere-se à inclusão no Censo de 2022 da pergunta sobre o principal meio de transporte utilizado para chegar ao local de trabalho (quesito 15.04, CD 2022, Quadro 4). Essa nova pergunta, associada aos dados oriundos da pergunta sobre o tempo de deslocamento, já existente no Censo de 2010, pode evidenciar aspectos importantes sobre a mobilidade urbana, em especial os gargalos de mobilidade para mulheres negras e periféricas que são maioria entre as trabalhadoras domésticas. Além disso, também viabiliza os estudos sobre exposição a doenças de alta transmissibilidade, como foi o caso da Covid-19. Cabe ressaltar que houve uma melhoria na forma de responder à pergunta sobre o tempo de deslocamento entre trabalho e casa no questionário do Censo 2022 (quesito 15.03, CD 2022), pois a opção de resposta deixou de ser limitada a faixas de tempo, o que permitirá a resposta exata em horas e minutos. Essa mudança viabiliza, por exemplo, a estimativa do tempo médio de deslocamento das trabalhadoras domésticas entre casa e trabalho. Os dados decorrentes de ambas as perguntas podem trazer subsídios para estudiosos sobre o tema, mas, sobretudo, para gestoras/es públicas/os, em especial para aquelas/es da área de transporte urbano e metropolitano.

Quadro 4 – Comparativo de quesitos sobre deslocamento para o trabalho entre os Censos Demográficos de 2010 e 2022.

Deslocamento para o trabalho
Censo 2010	Censo 2022
6.60 - Em que município e unidade da federação ou país estrangeiro trabalha?	15.01 - Em que município ou país estrangeiro trabalha?
6.61 - Retorna do trabalho para casa diariamente?	15.02 - Retorna do trabalho para casa diariamente?
6.62 - Qual é o tempo habitual gasto de deslocamento de sua casa até o trabalho?	15.03 - Quanto tempo leva entre sua casa e o local de trabalho normalmente? (a resposta passou a ser aberta para minutos e horas)
	15.04 - Qual o principal meio de transporte utilizado para chegar ao local de trabalho?

Fonte: IBGE - Questionários dos Censos Demográficos de 2010 e 2022

50Na temática migração ocorreram poucas mudanças, conforme demonstra a comparação entre os quesitos dos dois recenseamentos no Quadro 5. A primeira mudança foi a exclusão da pergunta sobre há quanto tempo a/o respondente reside na UF. Este dado é um elemento importante para se discutir o fenômeno da migração interna brasileira, especialmente dos interiores para as capitais e das regiões mais empobrecidas do país para as mais ricas. A ausência dessa informação, ademais, diminui a possibilidade de se verificar se o trabalho doméstico se constitui como ocupação de chegada das trabalhadoras migrantes, restringindo essa análise ao tempo de residência no município. A presença dessa pergunta em 2010 permitia, por exemplo, a observação de mais uma etapa migratória na UF de destino, especialmente na situação em que a/o migrante não se adaptava, ou não se inseria no mercado de trabalho no município de chegada, e se deslocava para novo destino dentro da mesma UF. Cabe destacar que, no Censo de 2022, foram excluídas as perguntas relativas à emigração internacional. Apesar da intrínseca relação entre trabalho doméstico remunerado e a emigração internacional, devido à elevada inserção das mulheres emigrantes nesta ocupação no país de destino, o bloco de quesitos sobre essa temática no Censo de 2010 já não permitia identificar a ocupação da emigrante. Nesse sentido, a retirada da temática não muda tanto as possibilidades do Censo 2022 para os estudos sobre o trabalho doméstico remunerado.

Quadro 5 – Comparativo de quesitos sobre migração entre os Censos Demográficos de 2010 e 2022.

	Quesitos	2010	2022
	Município/Estado/País de nascimento	X	X
	Nacionalidade	X	X
	Ano em que fixou residência no Brasil (estrangeira/o)	X	X
	Tempo de residência na UF	X	--
	Tempo de residência no município	X	X
	Município/UF/País de última etapa (<10 anos de residência)	X	X
	Município/UF/País de data fixa (<6 anos de residência e idade 5 anos e mais)	X	X
	Município/UF/País estrangeiro em que estuda	X	X
	Município/UF/País estrangeiro em que trabalha	X	X
	Retorna diariamente para casa?	X	X
	Tempo de deslocamento	X (faixas)	X (m/h)
	Meio de transporte para o trabalho	--	X

Fonte: IBGE - Questionários dos Censos Demográficos de 2010 e 2022

51Em suma, essa análise evidencia que houve algumas mudanças positivas e negativas para o estudo do trabalho doméstico remunerado, nos questionários (básico e da amostra) do CD de 2022 se comparados aos do Censo de 2010. Contudo, o CD permanece como uma importante fonte de dados para o estudo da categoria, principalmente em escalas geográficas menores, onde as demais pesquisas amostrais não chegam, e nas temáticas que envolvem os temas pendularidade e migração.

Considerações Finais

52As discussões apresentadas neste artigo evidenciam que os CDs de 2010 e 2022 são ricas fontes de dados secundários para o estudo do trabalho doméstico remunerado no Brasil e podem ser utilizadas com mais frequência. Essas fontes de dados possibilitam o conhecimento sobre as questões de trabalho e rendimento das trabalhadoras domésticas com 10 anos ou mais de idade, diferentemente das demais pesquisas que focam em pessoas com 14 anos ou mais. Essa é uma vantagem importante, porque entre as trabalhadoras domésticas ainda existem meninas ocupadas com idade entre 10 e 14 anos, apesar da legislação proibir. Além disso, as variáveis de ambos os Censos possibilitam o detalhamento das condições de vida das trabalhadoras domésticas, como as características dos domicílios, os arranjos familiares, a identificação étnico-racial e a escolaridade, informações que dizem muito sobre o contexto em que vivem essas mulheres. Outra vantagem da pesquisa é viabilizar análises mais detalhadas sobre os movimentos migratórios e a mobilidade pendular das trabalhadoras domésticas, bem como permitir que os estudos sejam realizados sobre todos os municípios brasileiros.

53O interstício de 10 anos entre um Censo e outro se apresenta como a principal limitação para o uso dessa fonte de dados em estudos sobre o mercado de trabalho, principalmente para aqueles focados nas análises de tendência e acompanhamento da situação conjuntural do mercado de trabalho. Ou seja, não é uma fonte adequada para analisar flutuações e tendências de curto e médio prazo da força de trabalho no país.

54No questionário do Censo de 2022, houve duas alterações que vão prejudicar os estudos sobre as trabalhadoras domésticas: a retirada do tempo dedicado ao trabalho principal e o detalhamento da fonte pagadora dos rendimentos advindos de outras fontes. A primeira impede estudos sobre jornada de trabalho e a construção de uma proxi para a categorização das trabalhadoras em diaristas e mensalistas. E a segunda, não mais permitirá identificar quais são os benefícios assistenciais acessados pelas trabalhadoras domésticas ou suas famílias, comprometendo os estudos relativos ao acesso a políticas públicas.

55Por outro lado, alguns quesitos tiveram melhorias na redação e na forma de responder, bem como houve três importantes mudanças para o estudo das trabalhadoras domésticas. A primeira foi a dedicação de uma pergunta sobre a atividade remunerada de outra forma que não dinheiro, o que permite analisar o percentual de trabalhadoras domésticas que ainda não são remuneradas monetariamente. A segunda refere-se à inclusão do trabalho doméstico remunerado e não remunerado como possibilidades de respostas para o trabalho principal, já que no Censo de 2010 as trabalhadoras domésticas remuneradas não tinham destaque nesse quesito e eram classificadas como empregada com carteira de trabalho assinada ou empregada sem carteira de trabalho assinada, dependendo da condição de formalização. A terceira consiste na inclusão da pergunta sobre o principal meio de transporte utilizado para chegar ao local de trabalho, o que pode auxiliar em estudos sobre exposição a doenças de alta transmissibilidade, como foi o caso da Covid-19, e sobre mobilidade urbana.

56Por último, cabe pontuar também a inserção do quesito “fez algum bico ou trabalho ocasional remunerado?”, que pode captar trabalhos domésticos remunerados feitos de forma esporádica ou bicos que mulheres ocupadas realizam para complementação da renda. Portanto, é importante reconhecer que houve mudanças positivas e negativas nos quesitos do questionário do Censo de 2010 para o Censo de 2022, no que tange ao tema em questão.