1. Dificuldades do estudo da comunicação organizacional

1Normalmente, quando falamos em comunicação existe uma tendência para, de imediato, pensarmos nos contextos gerais da comunicação no âmbito, por exemplo, da comunicação intra ou interpessoal, ou da comunicação de massas. Quando levamos a cabo uma pesquisa bibliográfica, num centro de documentação ou numa biblioteca, sob o epíteto de “comunicação” deparamo-nos com inúmeros resultados, mas quase sempre limitados a textos sobre retórica, efeitos dos mass media, teorias da informação, comunicação interpessoal ou comunicação intercultural.

2Se formos persistentes e minuciosos na busca, conseguimos encontrar uma ou outra referência dedicada à comunicação organizacional – dispersa pelos mais variados escaparates: sociologia da comunicação, ciências da comunicação, comunicação, gestão, relações públicas, etc. A partir daqui, e fazendo uma atenta revisão da literatura, podemos então chegar a um pequeno leque de obras de referência nesta área.

3A pesquisa electrónica através de sites na Internet pode ser também um bom ponto de partida, mas apresenta outro tipo de dificuldades: os acessos às bibliotecas e aos registos documentais de Instituições Académicas ou Centros de Investigação de referência nem sempre estão disponíveis para cibernautas exteriores à instituição, ou, se estão, o facto de estarmos noutro país acaba por gerar constrangimentos; por outro lado, as referências obtidas por via do ciberespaço nem sempre são completas e oriundas de fontes suficientemente credíveis ou credenciadas...

4A busca nas livrarias virtuais (como o caso da Amazon.com) ou através de editoras que já se fazem representar online (como, por exemplo, a Lawrence Erlbaum Associates, a McGraw-Hill ou a Routledge) é outra opção útil, mas apenas quando já sabemos exactamente o que necessitamos – resta, contudo, que o investigador cibernauta seja apologista da utilização do cartão de crédito por via electrónica!

6Todos estes constrangimentos encontram justificação em vários factores que limitam o aprofundamento do campo da comunicação organizacional, com uma clara delimitação do seu objecto e articulação de teorias.

7Na realidade, o estudo da comunicação organizacional é uma área relativamente nova de pesquisa, com raízes noutras disciplinas, o que faz com que ela seja ainda vista, por muitos, como um campo pobre e periférico no âmbito das ciências sociais. Uma das críticas mais recorrentemente apontadas aos investigadores que se debruçam sobre estas matérias acusa-os de se concenrarem na recolha de dados em detrimento de uma articulação de teorias de comunicação organizacional (Jablin & Putnam, 1987, p. 11).

8Uma das razões para a aparente escassez das teorias de comunicação organizacional parece apontar para a natureza multidisciplinar desta área, que obriga os investigadores a dominarem conhecimentos em várias matérias, nomeadamente a teoria das organizações e a teoria da comunicação. E, hoje em dia, muito dificilmente um investigador está a par de todas as abordagens teóricas existentes nos campos da organização e da comunicação (ibidem, p. 11).

9Por outro lado, a comunicação organizacional integra uma tal variedade de conceitos e pressupostos teóricos que se torna um campo vasto e de difícil aceitação. Através da reconstituição histórica das origens da comunicação organizacional é possível constatar que o processo de autonomização desta disciplina das ciências sociais foi acontecendo em simultâneo com o desenvolvimento de outras áreas científicas, como a psicologia industrial, a psicologia social, o comportamento organizacional e a ciência administrativa, o que a moldou de acordo com as teorias, os modelos e os conceitos dominantes. Mais recentemente, a comunicação organizacional acaba por reflectir a influência da sociologia, da retórica, da antropologia, da filosofia, da ciência política e da linguística (Corman [et al.], 1995, p. 11).

10Ao mesmo tempo, o tópico da comunicação nas organizações é em certa medida paradoxal. Se, por um lado, as noções de comunicação e organização se assemelham e são indissociáveis, sejam quais forem os sentidos atribuídos e qual o ponto de vista adoptado, por outro lado, o conhecimento disponível sobre ambas aparece muito disperso (Sfez, 1993, p. 520).

12Vejamos, de forma muito breve, como as noções de organização e de comunicação se encontram intimamente associadas e se legitimam uma à outra, independentemente da abordagem adoptada.

13Etimologicamente, a raiz da palavra comunicar é «communis», isto é, «meter em relação» ou «meter em comum», de onde vêm também as noções de «comunidade» e de «comunhão». Comunicar significa, igualmente, «trocar», implicar-se numa comunidade de sentido. E um dos atributos pelos quais se reconhece e se manifesta uma comunidade é a língua, os códigos e os símbolos utilizados no seu seio.

14Na mesma medida, a maior parte das organizações possui um aparelho administrativo cuja função principal é recolher, conservar, tratar e transmitir informação utilizando precisamente códigos e símbolos particulares. Por exemplo, para Amitaï Etzioni, sociólogo americano especializado na sociologia das organizações,

as organizações são unidades sociais (ou agrupamentos humanos) deliberadamente elaboradas pela procura de fins específicos e que se caracterizam 1) pela divisão do trabalho, do poder e das responsabilidades; 2) pela presença de um ou vários centros de poder que controlam os esforços da organização e os dirigem para o objectivo; 3) pelo carácter substituível do pessoal (Etzioni citado por Thines & Lempereur, 1984, p. 670).

15O termo “organização” vem do grego «organon», que significa instrumento, utensílio. Mas “organização” evoca ao mesmo tempo vários conceitos e realidades. Esta polissemia deve-se, em grande medida, ao facto de o campo da organização despertar interesses junto de profissionais das mais variadas áreas técnicas e científicas. Mesmo que seja claro para todos que organização pode significar a “acção de organizar” e “conjunto organizado”, ainda resta compreender que sentido dar a estas construções. Por exemplo, ver a organização como “um conjunto organizado” pode indiciar a empresa no seu todo ou, simplesmente, remeter para a sua estrutura formal (organograma) – que não deixa de ser uma projecção redutora da realidade organizacional. Para ultrapassar possíveis confusões, e consequente perda de eficácia, procurou-se introduzir uma pluridisciplinaridade nas abordagens e práticas da organização. Por aqui se justifica que a área da teoria organizacional tenha sido enriquecida com tantas noções e conceitos de outras disciplinas (Bartoli, 1991, p. 17).

16Assim, num plano empírico, ao constatarmos que numa organização social as suas características tomam a forma de comunicações, seja sobre o conteúdo das mensagens, seja sobre a forma pela qual este circula, ou sobre a sua eficácia, então a comunicação joga um papel central no sucesso do processo administrativo. Os dispositivos comunicacionais podem tender a modificar o comportamento de um indivíduo ou de um grupo, a fim de os orientar para a realização de certos objectivos; como podem assegurar uma distribuição adequada das informações disponíveis, contribuindo para a eficácia do sistema de decisão. Não existem dúvidas de que comunicação e organização são consubstanciais, não sendo igualmente de estranhar que os pioneiros da ciência das organizações tenham sempre levado em conta o papel fundamental que a comunicação ocupa numa organização (Sfez, 1993, p. 521).

17Já em 1938, Chester Barnard defendia que «numa teoria da organização exaustiva, a comunicação iria ocupar um lugar central, porque a estrutura, extensão e o alcance da organização são quase inteiramente determinadas pelas técnicas de comunicação. (...) Os teóricos da organização já não são cépticos acerca da importância da comunicação nas organizações. Contudo, embora concordem que a comunicação deve ser tida em consideração nos seus estudos acerca do funcionamento das organizações, diferem na perspectiva a adoptar.» (Barnard, citado por More & Laird, 1985, p. 15)

18Mais recentemente, Tompkins critica a ideia de que as organizações são entidades que albergam a comunicação. Pelo contrário, «a comunicação constitui organização», isto é, «a organização deve ser vista como um sistema de indivíduos em interacção, que através da comunicação se envolvem activamente no processo de criar e recriar a sua ordem social única» (Tompkins, citado em Jablin & Putman, 2001, p. xxi).

19À parte as dificuldades anteriormente enunciadas, o estudo dos processos de comunicação organizacional tem vindo a aumentar significativamente nos últimos anos. Muitos têm sido os esforços no sentido de se aprofundarem conceitos e sugerir novas metáforas e estilos de pensamento úteis na melhoria das teorias já existentes, tanto ao nível da pesquisa empírica, como ao nível do desenvolvimento de quadros teóricos. Mas, apesar de tudo, a definição de um campo teórico que sustente a pertinência científica desta disciplina ainda está longe de ser alcançado.

À medida que entramos no novo milénio, num momento em que as organizações enfrentam um ambiente global complexo, os investigadores continuam a definir e redefinir os pontos de interesse e as fronteiras, procurando pistas para o futuro das Ciências da Comunicação no campo organizacional. (Tompkins & Wanca-Thibault, citados em Jablin & Putman, 2001, p. xvii)

2. História do desenvolvimento da comunicação organizacional

20A delimitação histórica mais clara e completa feita acerca da comunicação organizacional foi produzida por Redding, em 1985. Numa edição posterior (1988), e em colaboração com Tompkins, este trabalho foi aumentado para integrar uma perspectiva longitudinal capaz de dar conta da evolução da teoria, das práticas e dos métodos de pesquisa dos fenómenos da comunicação organizacional. Nesta obra, os autores distinguem o período entre 1900 e 1970, que suporta três fases: Formulário-Prescritivo (desenvolvimento de regras, baseadas na teoria retórica clássica, para uma comunicação de negócios eficaz), Empírico-Prescritivo (apresentação de estudos de caso que mostravam como promover uma comunicação eficaz) e Ciência Aplicada (utilização de formas tradicionais de avaliar objectiva e cientificamente os problemas organizacionais). Os trabalhos feitos depois de 1970 foram divididos em Modernistas (trabalhos que assumem as organizações como formas objectivas e naturais, sujeitas a previsão e controlo), Naturalistas (abordagens que partem do pressuposto de que as organizações são subjectivas e socialmente construídas pelos membros que as integram) e Críticos (trabalhos onde se ressalva uma certa emancipação dos próprios actores organizacionais) (Jablin & Putman, 2001, p. xxiii).

21O percurso histórico que levou à afirmação da comunicação organizacional como disciplina científica autónoma pode assim ser dividido em vários momentos (Taylor & Trujillo, in Jablin & Putnam, 2001, pp. 164-166).

25A fase da maturidade e inovação, que pode ser apontada entre 1970-1990, caracteriza-se por uma sedimentação teórica e pela multiplicação de pesquisas de teor científico. Na década de 1970, depois de a abordagem positivista ter entrado em descrédito e ter sido abandonado o postulado da “verdade absoluta”, surgem modelos alternativos de investigação, que tornam possível o crescimento da pesquisa empírica e o desenvolvimento de novas premissas teóricas no campo da comunicação organizacional. Neste período, a grande mudança deve-se à afirmação das dimensões simbólica e expressiva das organizações nos estudos comunicacionais, com aproximação ao tema da cultura organizacional e dos domínios da fenomenologia, do estruturalismo, ou mais especificamente da semiótica (Ruão, 2004, p. 6). Já no período entre 1980 e 1990, a comunicação organizacional atravessa um momento de crise de identidade e representação, dado o questionamento introduzido pelas teorias críticas no seu domínio. Este questionamento obrigou a uma viragem teórica e empírica para perspectivas científicas mais centradas em análises de poder e dominação no processo de comunicação organizacional (Ruão, 2004, p. 8).

26Nestes últimos anos, os domínios de análise e as orientações teóricas que acompanham os desafios impostos aos estudos em comunicação organizacional são a teoria crítica, o feminismo, os estudos éticos, e o pós-modernismo, num contexto naturalista e modernista na tradição da pesquisa qualitativa. (Taylor e Trujillo, in Jablin e Putnam, 2001, pp. 165-166).

27Mas, para melhor caracterizar o cenário dos programas de investigação contemporâneos, adiantamos quatro abordagens (ou discursos) com objectivos e pressupostos diferentes (Deetz, in Jablin e Putnam, 2001, pp. 11-37):

28Normativo – trata-se de um discurso que surge do repensar das posições positivistas, servindo para enfatizar a centralidade da codificação e a procura de regularidades e normalizações; entende as organizações como objectos naturais sujeitos à previsão e ao controlo, existindo para fins instrumentais, sobretudo de cariz económico; representa a comunicação essencialmente em termos de informação e de administração.

29Interpretativo – discurso que vê as organizações como formas subjectivas, socialmente construídas pelos seus actores; a realidade organizacional ganha uma ênfase mais social que económico, e revela-se através de conversas, histórias, ritos, mitos e outras actividades diárias; os actores sociais não são encarados como objectos, mas como indivíduos activos que ajudam os investigadores a encontrarem sentido no material observado e recolhido; o objectivo central será guardar o sentido tradicional dos valores e práticas partilhadas entre grupos de pessoas numa dada comunidade; os estudos culturais nas organizações enquadram-se nesta abordagem interpretativa, que procura uma leitura profunda de significados e de sentimentos.

30Crítico – discurso que entende as organizações como “lugares políticos”, criações sociais e históricas, resultantes de lutas e relações de poder; o objectivo desta abordagem é denunciar e criticar formas de domínio, assimetrias e processos sociais e comunicativos distorcidos, para ajudar a criar fóruns de debate e modelos de discussão que levam a um consenso aberto; no fundo, o que se procura é criar condições favoráveis ao combate à hegemonia nas organizações.

31Dialógico ou Pós-Modernista – um pouco como a anterior, esta abordagem foca as assimetrias e o domínio nos processos de tomada de decisão; contudo, há nos estudos dialógicos uma maior atenção aos processos micropolíticos e à natureza do poder; ou seja, mais do que a reforma do mundo, procuram-se aspectos particulares da realidade e os focos escondidos de resistência e complexidade; alguns dos temas mais estudados são a centralidade do discurso, a fragmentação de identidades, os papéis e as ligações de poder, a hiper-realidade.

32À parte as anteriores abordagens, refira-se que a mais recente revisão de pesquisa e teoria da comunicação organizacional foi elaborada em 1996, através da identificação de várias perspectivas, na forma de clusters metáforicos, que serviam para caracterizar diferentes concepções e abordagens no estudo destas matérias. Para os autores deste trabalho, qualquer tópico ou tema no campo da comunicação organizacional pode ser examinado a partir de um dos seguintes clusters:

331. conduta (estudos onde as organizações são vistas como canais de fluxos de informação e onde comunicação equivale a transmissão);

342. lente (estudos que vêem as organizações como um sistema que monitoriza, observa, fornece e altera informação; aqui a comunicação equivale a um processo de recepção e percepção);

353. ligação (estudos que encaram as organizações como redes de múltiplas relações e onde a comunicação equivale a conecções e interdependências);

364. desempenho (estudos em que as organizações são vistas como um conjunto de acções coordenadas de acordo com regras próprias; aqui a comunicação equivale a interacção social, a um processo dinâmico de colaboração);

375. símbolo (pesquisas que entendem as organizações como textos literários ou novelas e que equivalem a comunicação com interpretação e representação de significados);

386. voz (pesquisas em que as organizações são um coro de diversas vozes e nas quais a comunicação é expressão, supressão e distorção dessas vozes);

397. discurso (estudos para os quais as organizações são textos, padrões ritualizados de interacção que vão para além das conversas imediatas; aqui a comunicação é equiparada com a conversação, enquanto processo e contexto) (Jablin & Putman, 2001, pp. xxv-xxvii).

40Para uma caracterização mais completa dos estudos levados a cabo sobre os fenómenos da comunicação organizacional, é possível apontar também os temas mais pesquisados. De seguida, apresentamos dois quadros que resumem as temáticas mais estudadas: primeiro, um resumo elaborado a partir da reflexão histórica de Teresa Ruão; a seguir, um trabalho feito por Allen, Gotcher e Seibert, datado de 1993, que aponta os tópicos mais analisados em revistas científicas da área, entre 1980 e 1991.

3. Definição do conceito de comunicação organizacional

42Definir o conceito de comunicação organizacional também não se revela uma tarefa fácil. As interpretações do que significa este conceito podem dividir-se entre aquelas que defendem a comunicação organizacional como um aspecto que integra a organização, por oposição àquelas que preconizam o conceito como a base estruturante da organização em si mesma. Como exemplo das primeiras interpretações, temos a definição de Drenth et al., para quem a comunicação consiste no envio e recepção de mensagens através de símbolos; aqui a comunicação organizacional é vista como um elemento-chave do clima organizacional. A segunda visão pode ser ilustrada por Mayers & Mayers, que consideram a comunicação organizacional como a «força unificadora central que permite a coordenação entre as pessoas, possibilitando assim um comportamento organizado» (Baker, 2002. p. 2). Nesta interpretação, há ainda os que consideram a comunicação como o «processo básico das organizações, a partir do qual todas as outras funções derivam» (Bavelas & Barrett, in Ferreira [et al.], 2001, p. 358).

43Numa perspectiva evolutiva, pode mesmo afirmar-se que, nas primeiras reflexões sobre comunicação organizacional, as definições de comunicação se centravam nos “meios”, o que limitava as pesquisas à clareza e exactidão das mensagens. Neste sentido, a comunicação era o «processo de enviar e receber mensagens» (Sanborn, citado em Corman [et al.], 1994, p. 11). Mais tarde, os estudos centrados em modelos emissor-receptor acabariam, também, por ser abandonadas a favor da noção de interacção ou de criação social da mensagem e do seu significado. Nesta perspectiva interactiva, adoptada em pesquisas mais recentes, a comunicação organizacional é definida como «o processamento e interpretação de mensagens, informação, significados e actividade simbólica, dentro das organizações e entre elas» (Putman, citada em Corman [et al.], 1994, p. 11).

44Hoje em dia, a interpretação mais consensual defende que a comunicação já não é só um aspecto essencial no panorama organizacional, mas, sim, a fundação das organizações modernas. Numa perspectiva interpretativa (subjectiva), a comunicação organizacional é o «processo gerador do sentido das interacções que constituem a organização» (Pace & Faules, 1994, p. 22). O conceito de “sentido” aqui expresso é relevante para a distinção que as perspectivas interpretativa (subjectiva) e funcionalista (objectiva) fazem do conceito de comunicação organizacional. Numa visão mais objectiva, o “sentido” está na mensagem, o que resulta em estudos que acabam por ignorar o indivíduo. Mas, na visão subjectiva, os “sentidos” das mensagens são negociados entre os participantes que estão activamente envolvidos no processo de troca (comunicação); ou seja, o “sentido” acaba por surgir da interacção que se estabelece num dado momento. Stewart & Thomas (1990) referem-se a este processo como o «esculpir de sentidos mútuos» (Pace & Faules, 1994, p. 23). Daqui pode concluir-se que a visão interpretativa (subjectiva) enfatiza a ideia de “processo” e dá importância ao papel dos “indivíduos”, por oposição a uma visão mais funcionalista (objectiva), que coloca a tónica central na ideia de “estrutura”, na medida em que faz uma leitura da organização como um «sistema composto por unidades de comunicação em relações hierárquicas e funcionando num dado ambiente.» (Pace & Faules, 1994, p. 21)

45Noutra definição, a comunicação organizacional é vista como o «estudo do envio e da recepção de mensagens que criam e mantêm um sistema de actividades ou forças coordenadas de forma consciente entre duas ou mais pessoas» (Tompkins, in Salwen e Stacks, 1996, p. 384). Esta ideia reflecte, precisamente, a evolução do entendimento que se foi estabelecendo à volta dos conceitos de comunicação e de organização: a comunicação é dinâmica e interactiva, e não estática e linear (como no passado); e as organizações são sistemas de indivíduos em interacção, em vez de entidades ou “contentores” nos quais a comunicação ocorre. Ou seja, na essência, «a comunicação é uma actividade processual que constitui a organização» (Salwen & Stacks, 1996, p. 384).

46Quando confrontado com a questão “o que é a comunicação organizacional?”, Deetz sugere inúmeras hipóteses, necessariamente arbitrárias e limitadas, no fundo confortáveis, mas que deixam muito de parte. Em última instância, considera a questão mal colocada (Deetz, in Jablin & Putnam, 2001, p. 4). E, para ultrapassar o impasse, adianta três formas distintas de conceptualizar a “comunicação organizacional”: a primeira consiste em ver a comunicação organizacional como uma especialização nos departamentos de comunicação; a segunda concebe a comunicação organizacional como um fenómeno existente nas organizações; e a terceira pensa a comunicação como uma forma de descrever e explicar as organizações, as suas estruturas sociais, as categorias dos seus membros, etc. Esta última concepção é a que ganha maior relevo na análise de Deetz, que considera a um “metanível” a possibilidade de interpretar os processos e os membros de uma organização numa perspectiva comunicacional (ibidem, pp. 4-6).

4. Diferentes abordagens

47As questões colocadas pelos investigadores no campo da comunicação organizacional, bem como os métodos utilizados para analisar os dados recolhidos, são uma extensão directa das perspectivas usadas para analisar a comunicação humana. Partindo deste pressuposto, avançado por B. Aubrey Fisher em 1978, e da sua proposta de que os investigadores tendem a assumir uma de entre quatro abordagens para estudar a comunicação humana,

49Na Perspectiva Mecanicista, a comunicação humana é vista como um processo de transmissão no qual a mensagem viaja através do espaço (canal), de um ponto para o outro. Como o lugar (locus) da comunicação é o canal onde ocorrem as transmissões das mensagens, as explicações do processo de comunicação emanam precisamente desse canal. Os comunicadores estão ligados uns com os outros por via dos canais, que também ligam as funções de codificação e descodificação presentes em cada comunicador. Como ilustração dos estudos levados a cabo nesta perspectiva, temos a pesquisa de redes em comunicação organizacional, que é quase inteiramente mecanicista, por focar primeiramente os canais que permitem a comunicação “correr” entre os indivíduos. São, também, exemplo dos trabalhos desenvolvidos com este enquadramento as primeiras pesquisas que avaliavam a eficácia dos meios de transmissão de informação descendentes (das chefias para os empregados) e toda a pesquisa relativa à questão da transmissão de mensagens entre superior e subordinado.

51Quando se estabelece uma conceptualização mecânica ou psicológica da organização, esta assume as qualidades de um “contentor” no qual a interacção ocorre, o que significa que cada uma destas perspectivas assume implicitamente que as características organizacionais determinam o processo de comunicação (Jablin & Putman, 1987, p. 27). Por outras palavras, as propriedades organizacionais são encaradas como determinantes do processo de comunicação, ao invés de se considerar que são os processos de comunicação a moldar as características organizacionais. Nestes enquadramentos, a comunicação é tratada, quase exclusivamente, como uma variável dependente. Todavia, quando a organização é estudada numa perspectiva interpretativa, as comunicações que ocorrem no quadro organizacional constituem padrões de comportamentos coordenados que têm a capacidade de criar, manter e dissolver as próprias organizações. A Perspectiva Simbólico-Interpretativa, sendo talvez a mais humanista das quatro, defende que, em virtude da habilidade dos indivíduos para comunicar, estes são capazes de criar e moldar a sua própria realidade social (ibidem, p. 27). Os estudos que ilustram esta perspectiva remetem, por exemplo, para a exploração das regras de comunicação no interior dos grupos de trabalho e para a forma como estas regras representam uma cultura organizacional. Ou então trabalham a comunicação de gestão como performance, isto é, como certos gestores desempenham papéis decisores, informacionais ou interpessoais por forma a conseguirem promover uma relação de trabalho harmoniosa.

52Ao contrário da anterior, a Perspectiva Interaccionista-Sistémica concentra-se nos comportamentos externos como unidades fundamentais de análise. Nesta perspectiva, o lugar (locus) da comunicação é o que se denomina “comportamento sequencial padronizado”, i. e., o agrupar das sequências dos comportamentos comunicativos, em vez dos “filtros conceptuais” do indivíduo, ou em vez das interpretações partilhadas de acontecimentos e actividades (ibidem, p. 30). A comunicação é examinada através de um método qualitativo conhecido como análise de interacção, que busca sequências recorrentes de actos contíguos ao longo do tempo. Assim, os investigadores que seguem esta perspectiva concentram-se nas categorias, formas e padrões sequenciais do comportamento da mensagem, sem se preocuparem com as relações de causa-efeito entre as variáveis de comunicação, como sucede nas visões mecanicista e psicológica. Nas últimas décadas, os estudos baseados nesta perspectiva têm aumentado substancialmente, em particular os estudos acerca da comunicação superior-subordinado e da negociação entre a gestão a força de trabalho.

53Com uma opinião semelhante, Lucien Sfez refere que a dificuldade de enquadramento teórico da comunicação organizacional se deve, em parte, ao facto de as abordagens que servem de base ao estudo da comunicação individual serem diversas. Daqui decorre a possibilidade de uma grande heterogeneidade de interpretações e representações dos fenómenos da comunicação organizacional (Sfez, 1993, p. 525).

54É curioso notar como as abordagens enunciadas por este autor partilham uma grande semelhança com as anteriores perspectivas, havendo apenas a notar a referência à abordagem cibernética (que, mesmo assim, é enunciada como uma disciplina que integra a corrente sistémica).

55Numa caracterização mais alargada, e comprovando as raízes interdisciplinares da área da comunicação organizacional, encontramos uma classificação em seis escolas de pensamento centrais, que influenciaram o estudo e a prática desta área disciplinar: Abordagens Clássicas; Abordagens das Relações Humanas; Abordagens dos Recursos Humanos; Abordagens Sistémicas; Abordagens Culturais; Abordagens Críticas.

5. Funções da comunicação organizacional

56De um modo geral, as funções de comunicação básicas que são reconhecidas remetem para a forma como a comunicação deve afectar o conhecimento ou o comportamento do receptor através da informação, orientação, regulação, socialização e persuasão. De seguida apresentamos uma breve revisão de algumas perspectivas acerca das funções da comunicação organizacional.

57Neher (1997) propõe como funções primordiais da comunicação organizacional (Baker, 2002, p. 10):

• ganho de confiança

• aprender, motivar e influenciar

• dar sentido

• resolução de problemas e tomada de decisões

• gestão de conflitos, negociação, estabelecimento de acordos.

58Neher dá especial relevo às funções sociais e organizacionais da comunicação organizacional enquanto um todo, em vez de focar as funções de trocas de comunicação específicas. Atribui, também, grande importância ao papel da comunicação na gestão de ameaças à ordem e ao controlo organizacional, identificando a resolução de problemas, a gestão de conflitos, a negociação e o estabelecimento de acordos como as funções chave da comunicação organizacional.

59Mayer & Mayers combinam funções primárias da comunicação organizacional similares às anteriormente enunciadas, mas propondo um nível mais elevado (ibidem, pp. 10-11):

• Coordenação e regulação das actividades de produção: com a complexificação e a redução das rotinas dos processos produtivos, torna-se necessária uma comunicação mais dinâmica, recíproca, lateral entre os operários e os gestores. Aqui a comunicação assume um papel central e mais complexo ao nível da coordenação e da regulação.

• Socialização: Esta função ganhou relevo com a abordagem das relações humanas que defende o pressuposto de que é necessário “ganhar o coração e a mente” dos membros da organização para conseguir uma coordenação eficaz da acção organizacional e alcançar os objectivos colectivos. A função da socialização tem implicações directas no estabelecimento de um clima e uma cultura organizacional adequadas.

• Inovação: Cada vez mais se dá importância ao papel que a comunicação pode desempenhar na promoção da inovação, tal como do controlo e da coordenação.

60Anteriormente, já Farace et al. referem a função da inovação, da mudança e da adaptação ao discutirem a comunicação em termos das relações de trabalho, manutenção, apoio e motivação, que levam à integração do indivíduo na organização.

61A função da coordenação é, igualmente, apontada como primordial por Sanford et al., para além das referências às funções de integração, manutenção, orientação, tomada de decisão e crescimento individual (More & Laird, 1985, p. 17).

62Num outro registo, mas ainda recorrendo ao conceito de “função”, Lucien Sfez refere a possibilidade de podermos abordar o estudo da comunicação organizacional, e perceber a sua eficácia, a partir da análise dos efeitos ou das funções da comunicação – sem que isso implique aderir ao ponto de vista funcionalista. (Sfez, 1993, pp. 526-527).

• Função de controle – Trata do estudo da comunicação sob o ângulo dos efeitos da transmissão de informações sobre os resultados das actividades dos membros da organização.

• Função de coordenação – Centra-se sobre o estudo da comunicação feita acerca dos dados ou das instruções necessárias à realização de uma tarefa, ou, ainda, na aplicação de uma estratégia, de um programa (no sentido de programa de execução) ou de um esquema de acção particular.

• Função de motivação – Estuda a comunicação de tipo “persuasivo” destinada a colocar em conformidade os objectivos individuais e organizacionais, para além de colocar em análise os processos de mobilização e de integração.

6. As várias formas da comunicação organizacional

63Como se tem vindo a afirmar ao longo deste texto, o campo da comunicação organizacional é demasiado vasto e diversificado, fazendo com que qualquer tentativa de caracterização unificada seja sempre incompleta. Contudo, é possível delimitar várias categorias/formas que permitem aceder a uma melhor compreensão deste extenso campo disciplinar.

Comunicação formal versus informal

64O carácter formal ou informal da comunicação inscreve-se no exercício normal da função, quer se trate de comunicações pretendidas pela organização, previstas ou mesmo planificadas, quer sejam comunicações não previstas.

65No passado, a preocupação dos gestores das grandes organizações burocráticas, e consequentemente o alvo de muitos estudos empíricos, era a comunicação formal, ou comunicação oficial, que circulava verticalmente, sobretudo do topo para a base. A comunicação formal funciona através de canais estrategicamente criados e controlados pela organização, que tendem a estar sujeitos a regras estritas relacionadas com a eficácia do seu funcionamento. Normalmente, o sistema de comunicação formal é determinado pela estrutura organizacional e pela cadeia de poder. A comunicação formal regula os fluxos verticais de informação e de decisão, situados para cima e para baixo da linha hierárquica (Mintzberg, 1995, p. 62).

66Os canais formais de comunicação servem, principalmente, para transportar mensagens funcionais de rotina sobre o trabalho operacional e destinam-se a facilitar a coordenação e o controlo. Estas mensagens são usualmente escritas, de tom autoritário e muito bem planeadas (More & Laird, 1985, pp. 19-20).

68A comunicação informal começou a ser mais notada a partir das experiências de Hawthorne, que desvendou uma actividade considerável situada à margem dos sistemas de autoridade formal e dos processos dos fluxos regulados. Existem, portanto, redes complexas e ricas de comunicação informal, que por vezes contornam e complementam os canais estabelecidos (Mintzberg, 1995,p. 66). Estas redes não oficiais, também denominadas oficiosas, têm subjacentes duas razões essenciais para a sua existência nas organizações. Uma relaciona-se directamente com o trabalho, que, sendo cada vez mais complexo, obriga a que haja um certo grau de comunicação informal, sem o qual certas tarefas são impossíveis de executar. A outra razão é de carácter social e remete para o facto de as pessoas necessitarem de se relacionar umas com as outras como seres humanos, seja por amizade, seja para descomprimirem das suas tensões e incertezas (Mintzberg, 1995, pp. 69-71).

69O sistema informal de comunicação permite aos membros da organização evitar as limitações do sistema formal, sendo por vezes mais credíveis na difusão de informação, sobretudo em momentos de crise e stress. Tal acontece em parte como resposta à formação de relacionamentos sociais na organização, já que o sistema informal é mais orientado para necessidades humanas e sociais, ao contrário do sistema formal, que se preocupa mais com a produção e as directrizes institucionais (More & Laird, 1985, p. 20). Contudo, a comunicação informal encerra um perigo latente: o descontrolo das mensagens que circulam e o surgimento de rumores e boatos capazes de prejudicar o bom funcionamento da organização – quer ao nível das tarefas regulares, quer ao nível das relações entre as pessoas. Este é um dos maiores receios dos gestores.

70A maioria das discussões à volta do tema da comunicação informal tende a realçar a forma como se gere o clima e a cultura organizacionais, de modo a evitar uma oposição conflituosa entre a comunicação formal e informal. D’Aprix (1996) desenvolveu uma matriz DIZ-FAZ (porque os gestores dizem uma coisa e fazem outra), que permite compreender a relação entre a comunicação for- mal e informal. Nesta matriz, a comunicação ideal situa-se no quadrante ALTO DIZ/ ALTO FAZ, indicando a existência de uma comunicação suficiente e na qual as acções dos gestores correspondem às suas comunicações. Em contraste, uma organização que se situe no quadrante ALTO DIZ/ BAIXO FAZ terá provavelmente uma cultura em que a comunicação formal e informal entram em conflito (Baker, 2002, p. 5).

Comunicação vertical, horizontal e diagonal

71A direcção da comunicação ou da difusão da informação pode ser vertical, horizontal, ou diagonal (também chamada comunicação entre pares). Inicialmente, era atribuída maior atenção à comunicação organizacional vertical, por comparação com a comunicação lateral. Mas, hoje em dia, esta tendência alterou-se e a comunicação diagonal ganhou um destaque especial na literatura acerca da comunicação organizacional.

72A comunicação vertical segue a hierarquia de autoridade e pode envolver fluxos de comunicação descendentes e ascendentes. A comunicação descendente (também designada hierárquica) é mais prevalecente que a comunicação ascendente (ou salarial), que só recentemente começou a receber mais atenção. A comunicação descendente segue do topo para a base, destinando-se, normalmente, a transmitir aos escalões inferiores da organização informações funcionais e directrizes relacionadas com a produção, os valores culturais, as características gerais do negócio, da envolvente ou de práticas específicas da organização. Trata-se de um instrumento de gestão (Westphalen, [s.d], p. 68), que se torna mais eficaz se os gestores de topo comunicarem directamente com os supervisores imediatamente abaixo e estes comunicarem com o seu staff (Baker, 2002, p. 7). Esta eficácia é comprovada na medida em que o aumento do poder entre os supervisores aumenta a satisfação e a performance entre os empregados. As vantagens desta comunicação são a coordenação, o controlo e a recolha de informações necessárias à tomada de decisões e ao estabelecimento da política organizacional. Como desvantagem surge a potencial falta de feedback, a distorção e o bloqueio de mensagens, o possível excesso ou falta de informações e, também, o perigo de um timing inapropriado (More & Laird, 1985, p. 22).

74Temos ainda a comunicação horizontal ou lateral, que envolve trocas de informação entre pessoas da mesma categoria ou escalão hierárquico, tendo como objectivo central coordenar as actividades entre estas categorias. Embora cumpra funções formais de coordenação, o trajecto lateral da comunicação é normalmente informal, estimando-se que ocupe dois terços dos processos comunicacionais numa organização (Katz & Kahn, in Ferreira [et al.], 2001, p. 375). Este tipo de comunicação apoia-se, sobretudo, no contexto “socioemocional” que os membros da organização desenvolvem. As recentes tendências para nivelar os papéis nas organizações aumentaram a importância desta comunicação, apesar de os estudos que lhe são dedicados ainda serem poucos (Baker, 2002, p. 9). Os benefícios deste tipo de comunicação são a rápida resolução de problemas, a maior participação e colaboração entre equipas de trabalho, um melhor planeamento e coordenação de esforços e uma grande partilha de informação, que pode evitar desacordos entre departamentos ou serviços. O problema apontado relaciona-se com o perigo de substituir a comunicação vertical, especialmente quando está fortemente associada aos fluxos informais de comunicação (More & Laird, 1985, p.23).

75Finalmente, temos a comunicação diagonal, que caracteriza a comunicação entre gestores e trabalhadores localizados em diferentes divisões funcionais. Este conceito ganha destaque à medida que a verticalidade e horizontalidade dos processos comunicacionais já não servem as necessidades e os fluxos da maioria das organizações modernas. O conceito de comunicação diagonal foi introduzido para fazer face aos novos desafios da comunicação, associados às novas formas organizacionais, como as empresas em rede e as empresas organizadas por projectos (Baker, 2002, p. 9).

Comunicação orientada internamente e externamente

76A distinção entre a comunicação no seio da organização e a comunicação da organização com o ambiente que está ao seu redor é outro critério significativo a ter em conta na caracterização deste campo. Todavia, esta distinção pode ser enganadora se tomarmos em consideração que a comunicação de orientação externa engloba, por um lado, a comunicação que é da responsabilidade dos serviços especializados, como as relações públicas, o marketing, a publicidade, o patrocínio, etc., cujos objectivos podem estar mais vocacionados para promover a imagem da organização, e, por outro lado, a comunicação desenvolvida por empregados de serviços não especializados com indivíduos ou grupos exteriores (Sfez, 1993, p. 525).

77A quantidade de trabalhos sobre a comunicação orientada internamente excede em muito a daqueles que focam a problemática externa da comunicação organizacional. Contudo, esta é uma característica que tem vindo a inverter-se à medida que os tópicos da comunicação externa ganham mais destaque, nomeadamente o desenvolvimento de relações com grupos de stakeholders tradicionalmente menos estudados, como os investidores, os parceiros estratégicos, os grupos de pressão, as comunidades cibernáuticas, os institutos ou centros de investigação técnico-científica, etc.

78Por fim, devemos manter-nos atentos ao facto de esta distinção vir a esbater-se perante a nova realidade organizacional, que sobrevive sem fronteiras, sem estruturas delimitadas. Referimo-nos às já enunciadas organizações em rede e organizações virtuais, que estão a mudar o cenário e os limites da comunicação organizacional.

Comunicação institucional versus comercial

80A comunicação de natureza institucional está mais associada a mensagens de cariz informativo e motivante. Nesta comunicação, são evocados os procedimentos e as regras tidas como obrigatórias por lei ou por convenções, bem como as exigências legais em matéria de informação financeira que são assumidas pelas organizações. É, igualmente, uma comunicação que se estabelece no sentido de criar e manter relações de simpatia e confiança com grupos de stakeholders, tanto internos como externos, sem envolver fins comerciais ou promocionais.

81Em contrapartida, a comunicação comercial trabalha com mensagens promocionais e publicitárias acerca dos produtos/ serviços da organização, no sentido de persuadir e envolver os clientes, actuais ou potenciais, numa relação negocial. Normalmente, o objectivo final é a venda de um produto/ serviço.

7. Redes de comunicação13

83De uma forma simples, podemos considerar as redes de comunicação como padrões ou caminhos regulares de quem comunica com quem. A preocupação central não é com o comportamento de comunicação individual, mas antes com as relações de comunicação constantes entre membros de uma organização. Uma rede é um grupo intermediário entre o indivíduo e o conjunto de todas as pessoas numa organização. Por isso, quando falamos de redes centramo-nos em

grupos informais de indivíduos que foram regularizando os seus comportamentos e contactos dentro de um sistema formal. Cada rede é um pequeno conjunto de pessoas que comunicam muito umas com as outras, ou uma variedade desses conjuntos que estão ligados por fluxos de comunicação (Corman [et al.], 1994, p. 334).

84Estes fluxos de comunicação podem tomar diferentes formas, associadas a uma maior ou menor eficácia do grupo em interacção.

85O termo “rede” é o conceito de comunicação análogo ao conceito sociológico de “grupo”. Contudo, “rede” distingue-se de “grupo” na medida em que se refere a um número de indivíduos (ou outras unidades) que interagem uns com os outros, de forma persistente e de acordo com padrões estabelecidos (ibidem, p. 334). O que mantém uma rede unida pode ser uma preocupação mútua com uma tarefa partilhada, uma atracção entre indivíduos ou um interesse comum por um dado assunto.

86Uma forma de resumir a base conceptual do termo “rede” é perspectivá-lo em três níveis diferentes, que vão do micro ao macro, sendo este último aquele que se reveste de maior interesse para o estudo da comunicação organizacional (Rogers & Rogers, citados por More & Laird, 1985, p. 24):

• num nível micro existem redes pessoais centradas em indivíduos interligados que comunicam constantemente de acordo com um padrão regular;

• num nível intermédio encontramos o grupo restrito (“clique”), de 5 a 25 membros, que comunicam mais uns com os outros do que com os restantes membros da organização;

• num nível macro está toda a rede do sistema, que consiste nos padrões de comunicação existentes entre todos os membros de uma organização.

87Podemos ainda categorizar as redes existentes na organização em diferentes propósitos, relacionados, por exemplo, com a autoridade, os subsistemas de troca de informação, a formação ou as especialidades técnicas, o conhecimento e a performace, a amizade e as ligações socioemocionais e o estatuto dos membros (Sanford & Bracey, citados por More & Laird, 1985, p. 24).

8. Considerações finais

88Ao longo deste artigo, procuramos dar uma visão alargada do campo da comunicação organizacional, o seu desenvolvimento, os temas de interesse, as abordagens de estudo, as teorias de suporte e as várias dimensões do seu estudo.

89A comunicação organizacional, enquanto ciência social, amadureceu muito no seu percurso desde o início do século XX até ao raiar do século XXI. Contudo, ainda há progressos a fazer na conquista de um reconhecimento junto dos pares do meio académico nas áreas da sociologia, antropologia e ciência política. Essa credibilidade permitirá reunir apoios para programas de pesquisa cada vez mais completos e relevantes.

91Em segundo lugar, há uma tendência para o aumento da ênfase da pesquisa sobre os processos, papéis e relações dentro do contexto organizacional. Nos anos de 1970-80, deu-se muita atenção ao indivíduo e aos grupos enquanto receptáculos e consumidores no processo de comunicação. Agora, o destaque vai para as dinâmicas que afectam as relações de comunicação e as produções comunicacionais nas organizações (Salwen & Stacks, 1996, p. 544). Em terceiro lugar, os fenómenos emergentes da virtualidade e do ciberespaço permitem colocar novos problemas teóricos e novas questões empíricas. Estes tópicos põem em funcionamento diferentes forças económicas, culturais, políticas e tecnológicas que transformam a realidade organizacional pós-fordista (Taylor & Trujillo, in Jablin & Putnam, 2001, p. 185). Este cenário obriga os investigadores a serem mais sensíveis com as redes de computadores e os espaços de trabalho virtuais, que destabilizam as estruturas formais das organizações, centralizando hierarquias, alterando rotinas, modificando alianças.

92Em suma, a comunicação organizacional tem de encontrar maneiras de tornar mais significativas as mudanças que estão a ocorrer nas organizações e no universo comunicacional (Taylor & Trujillo, in Jablin & Putnam, 2001, p. 186).