1Em Portugal durante a primeira década do século XXI, à semelhança do que acontecia um pouco por toda a Europa e noutras partes do mundo, teve lugar um conjunto significativo de iniciativas de política educativa que assentavam em novas formas de conceber o papel do conhecimento numa economia cada vez mais globalizada e competitiva, contemporânea de um novo modelo de governança dos estados e da educação.
2Na verdade, o movimento da educação permanente que assumiu uma expressão significativa em muitos países ocidentais nos anos que decorreram após a II Guerra Mundial, tendo como agente impulsionador a UNESCO, foi progressivamente reinterpretado e sobretudo a partir dos anos 1990 observou-se uma certa desresponsabilização do Estado pela promoção da educação de adultos, passando o adulto a ser incumbido de ter a iniciativa na sua formação sempre insuficiente. Uma análise da história das ações e posições da própria UNESCO revela a tensão entre uma visão mais humanista e emancipatória da educação, próxima dos ideais do movimento da educação permanente, e uma visão tecnocrática e racionalista no quadro da qual a aprendizagem ao longo da vida (ALV) é um direito individual pelo qual cada adulto assume a responsabilidade por forma a desenvolver o seu próprio potencial (Elfert, 2016). Sublinhe-se, ainda, que a educação de adultos passou a ser encarada na contemporaneidade tendencialmente como um projeto de adaptação social a decorrer ao longo da vida ativa, distanciando-se dos ideais humanistas e emancipatórios do movimento de educação permanente (Lima, 2003; Nóvoa, 2013).
3Assim, em finais dos anos noventa o conhecimento começou a ser entendido como um elemento com valor económico decisivo na construção de uma Europa competitiva, sendo a sua importância destacada pelo contributo que poderia dar para o desenvolvimento económico e social, mas também para a coesão social e para a promoção de uma cidadania ativa. Foi neste âmbito que a ALV surgiu “como o principal lema das políticas educativas europeias no início do século XXI”, (Alves, 2010, p. 9) associada, a partir do ano 2000, à intenção da União Europeia de melhorar a empregabilidade e a qualificação dos trabalhadores através de uma significativa prioridade atribuída à ALV como componente básica do modelo social europeu, favorecendo a competitividade e a adaptabilidade. A ALV, destacada enquanto um dos vetores fundamentais na produção de uma força de trabalho mais produtiva e competitiva, passou a ser considerada, a partir de 2005, a única via para atingir os objetivos da Agenda de Lisboa (Dale, 2008).
- 1 Documento de apresentação do Programa INO: MTSS, & ME. (s.d.). Novas Oportunidades. Iniciativa no â (...)
4Face à centralidade que a ALV adquiriu nas orientações europeias, os Estados-membros procuraram incorporá-la nos seus sistemas educativos. Em Portugal foram desenhadas medidas de política educativa, de emprego e de modernização tecnológica por forma a responder a alguns dos problemas internos, nomeadamente o baixo desempenho do país em indicadores de referência estabelecidos pela União Europeia e pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, que persistia, apesar de se reconhecerem os progressos das últimas décadas em matéria de escolarização dos portugueses. Do ponto de vista do XVII Governo Constitucional, de maioria parlamentar do Partido Socialista, impunha-se uma intervenção política sustentada de modo a “acelerar fortemente a qualificação dos portugueses, tendo em vista a convergência com os países mais desenvolvidos”1. Assim, em finais de 2005, surge o programa Iniciativa Novas Oportunidades (INO), tutelado conjuntamente pelo Ministério da Educação e pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, tendo por desígnio elevar o patamar de qualificação generalizada dos portugueses para o nível do ensino secundário.
- 2 De acordo com Barros (2016), entre 2000 e 2010, 386 463 indivíduos foram certificados, para o caso (...)
5Para alcançar esse desígnio, a INO assentou na ideia de dar novas oportunidades tanto aos jovens, através do incremento de cursos técnicos e profissionais, como aos adultos ativos, correspondendo a um momento de massificação da oferta na área de educação e formação de adultos (Barros, 2016). Com efeito, a INO registou uma larga adesão por parte da população portuguesa jovem e adulta2 e, para além disso, foi amplamente divulgada nos meios de comunicação social (media). A extensiva campanha, com slogans mediáticos associados ― refletindo a lógica da prática do campo dos media ―, que foi realizada na televisão, nos jornais, na rádio e em outdoors publicitários, despertou o interesse da opinião pública e atraiu a atenção dos jornalistas e de atores dos vários campos sociais, que participaram no espaço público e argumentaram, durante um longo período de tempo, em torno do assunto.
6 A atenção destacada dos media à INO é, em si mesma, um indício de alterações no processo de governança da educação, no sentido em que as políticas educativas são cada vez mais o resultado de processos complexos que estão sujeitos às influências e aos constrangimentos que guiam a ação dos agentes e dos Estados em diversos níveis de decisão (Alves, 2010). Neste cenário, os processos de regulação das políticas educativas são necessariamente afetados pelas interpretações mediadas e mediatizadas pelos media, particularmente no interior de cada Estado, as quais contribuem para as especificidades dos seus sistemas educativos.
7 Saliente-se que os media condicionam os temas em discussão, deixando alguns de fora, (re)conceptualizam os problemas de acordo com os interesses em jogo, moldando a forma como a opinião pública reflete sobre os assuntos (Tan & Weaver, 2010), influenciam as práticas dos agentes situados em campos sociais distintos (Lingard & Rawolle, 2004) e têm “o poder discricionário de falar e de decidir sobre quem pode ou não falar” (Barriga, 2007, p. 37). Sendo assim, “the media considerations increasingly affect education policy within the intermediate space between the sphere of formal political agency and the public” (Rönnberg, Lindgren & Segerholm, 2012, p. 1).
8 Neste artigo, apresentam-se resultados de uma pesquisa que visa contribuir para o conhecimento sobre o papel dos media na construção de políticas educativas, nomeadamente na das que se dirigem à população adulta. Procura-se, especificamente, dar conta da forma como a INO foi interpretada, enquanto notícia e reportagem, em dois jornais portugueses, Correio da Manhã (CM) e Expresso, no período compreendido entre 2005 e 2013. Deste modo, contribui-se para conhecer e problematizar o papel da imprensa escrita na regulação das políticas educativas centradas na ideia da ALV.
9A INO estabeleceu-se como programa e incorporou duas vertentes, uma dedicada aos jovens e outra aos adultos, com base no pressuposto de que o investimento na qualificação das pessoas contribuiria para o crescimento da economia, a empregabilidade, o atenuar das desigualdades sociais e a promoção da coesão social.
- 3 Maria de Lurdes Rodrigues foi ministra da Educação durante o XVII Governo Constitucional (2005-2009 (...)
- 4 Os cursos do sistema de aprendizagem estavam sob a tutela exclusiva do Instituto do Emprego e Forma (...)
10 O eixo de ação Jovem inseriu-se no âmbito do compromisso de cooperação europeia em matéria de ensino e formação profissional assumido por Portugal na Declaração de Copenhaga, em 2002, no sentido de valorizar o ensino e a formação profissional no espaço europeu como aspeto fundamental para o mercado e para uma economia europeia competitiva. Assim, Portugal propôs-se melhorar o desempenho, a qualidade e a atratividade do ensino e da formação profissionais. Com as medidas a implementar na vertente dos jovens pretendia-se “adequar a oferta formativa do secundário às expectativas dos jovens” tendo em vista a redução do insucesso e do abandono escolar, que, segundo Rodrigues3 (2010, p. 95), “vinham a produzir efeitos acumulados dramáticos”. À Agência Nacional para a Qualificação competiu o desempenho do papel de planeamento da oferta e mobilização de atores, a gestão, a coordenação, a regulação e a dinamização do processo de expansão da rede de vias profissionalizantes4, bem como da definição de prioridades a nível nacional.
- 5 Alberto Melo (2003) refere que parte do problema da subqualificação e subcertificação da população (...)
11 O eixo de ação Adultos assentou na ideia de que a população portuguesa, além de estar subqualificada, estava também subcertificada (Resolução do Conselho de Ministros n.º 173/2007, de 7 de novembro, p. 8141). Ou seja, o nível de escolaridade da população ativa não correspondia ao nível de competências que manifestava profissionalmente, defendendo-se que as pessoas possuíam competências adquiridas em contextos exteriores aos sistemas educativos que não eram reconhecidas ou não estavam certificadas5. Este ponto de vista justificou a urgência de multiplicar os processos de reconhecimento, validação e certificação das aprendizagens (RVCC) não formais e informais adquiridas pelos adultos ao longo da vida, sendo que estes processos já vinham sendo implementados desde 2001. Deste modo, a valorização do conhecimento adquirido à margem dos sistemas educativos por vias não formais e informais, que era defendida numa perspetiva educativa, passou a ser um elemento integrante das políticas educativas. Neste contexto, a INO tomou como público-alvo os adultos desempregados ou desfavorecidos no mercado de trabalho e os indivíduos ativos que, embora estivessem a trabalhar, tinham uma situação precarizada por deterem um baixo nível de qualificação.
12 A implementação deste programa incluía a realização de uma campanha de informação e sensibilização nos media com vista a promover a valorização social do investimento em educação de adultos, e em particular dos mecanismos de reconhecimento de competências, tendo sido realizadas oito campanhas mediáticas (Carneiro et al., 2010). Ainda que tenham sido assinalados alguns aspetos a melhorar, estes autores concluíram que a INO/ eixo de ação Adultos foi percecionada de um modo geral pelo público, pelos profissionais e pelas entidades empregadoras como “uma marca pública (de serviço)”, com valores e princípios subjacentes que incluíam “acessibilidade” (adotando ofertas flexíveis e adaptadas aos tempos e ritmos do público-alvo), “inclusão” (valorizando cada indivíduo e a sua história de vida) e “horizontes” (reforçando a motivação para continuar a estudar e mobilizar novas competências) (Carneiro et al., 2010, p. 18).
13 Todavia, um conjunto de pontos críticos, especificamente relacionados com os processos RVCC, foi assinalado por autores, nomeadamente Almeida (2011) e Canário, Alves, Cavaco e Marques (2012). De entre os aspetos mais referidos, assinalam-se as exigências no plano da duração temporal e a associação entre o financiamento dos Centros Novas Oportunidades (CNO) e o cumprimento de metas quantitativas relativas ao número de inscritos, em processo e certificados. É que estas circunstâncias, argumentam os autores, não se coadunam com o facto de os processos RVCC não terem um tempo de duração previamente definido, emergindo o risco de associação dos CNO e dos processos de RVCC ao facilitismo e a um certo desvirtuamento das práticas; deste modo, “o reconhecimento de adquiridos obtidos por via experiencial representa[ou], neste programa, um objetivo em si, ou seja, um ponto de chegada, em vez de representar um ponto de partida de um novo e mais rico percurso formativo” (Canário, Alves, Cavaco, & Marques, 2012, p. 8). Almeida (2011) destaca, também, a ênfase dada aos resultados, afirmando: “os números tão frequentemente referidos nos discursos políticos, funciona[ra]m como factor de descredibilização” (p. 178).
14Decorrido um curto período após a tomada de posse do XIX Governo constitucional, a política de educação de adultos entrou numa nova fase. Os CNO deixaram gradualmente de receber financiamento e muitos encerraram. A 28 de março de 2013, a Portaria n.º 135-A extinguiu-os e regulamentou a criação e o regime de organização e funcionamento dos Centros para a Qualificação e o Ensino Profissional.
15O impacto dos media na educação tornou-se para muitos investigadores em educação um foco de interesse (Cohen, 2010; Rawolle, 2010), registando-se atualmente uma quantidade relativamente significativa de publicações, sobretudo a nível internacional, que têm procurado conhecer e compreender: (a) o modo como os media interagem com o poder político e quais os efeitos dessa interação nos processos de microrregulação das políticas educativas, nomeadamente na procura de consensos para as iniciativas de política educativa no interior de cada Estado (Franklin, 2004; Levin, 2004; Stack, 2010; Ungerleider, 2006); (b) a forma como os media analisam e defendem o recurso a determinadas tecnologias educativas em nome da modernização do sistema educativo, como, por exemplo, a questão da publicitação dos rankings escolares (Melo, 2009); (c) o impacto num país de determinados mecanismos de regulação das políticas educativas, como, por exemplo, o impacto do PISA em Portugal (Lemos & Serrão, 2015); (d) o modo como os jornalistas e outros atores se envolvem na divulgação e análise dos acontecimentos e nos processos de implementação das políticas educativas, como, por exemplo, sucedeu durante a primeira fase de implementação do novo modelo de avaliação de desempenho dos docentes (Serra & Natal, 2012); (e) a imagem que os media constroem da escola pública e da profissão docente e o modo como criam expectativas sobre as políticas educativas e influenciam a construção da identidade profissional dos professores (Blackmore & Thorpe, 2003; Cohen, 2010; Freitas, 2013); (f) o discurso político do debate mediatizado pelos media no Chile sobre a garantia da qualidade do ensino superior, que sucedeu na sequência do movimento estudantil de 2011 (Cabalin, 2014); entre muitos outros trabalhos no âmbito do papel dos media nos processos de mediação e mediatização das políticas educativas.
16Em suma, existem atualmente bastantes indícios que mostram que a rapidez e a forma como tanto os meios de comunicação como a comunicação social têm transformado o espaço social têm, de facto, conduzido a alterações quer na forma como os problemas da educação são (re)conceptualizados a nível global, nacional e local, quer nos processos de regulação das políticas educativas, as quais necessariamente são também afetadas pelas interpretações mediadas e mediatizadas pelos media. Como destacámos, uma parte dessas pesquisas tem procurando conhecer a forma como este campo interage com o da educação e quais os efeitos dessa interação nos processos de construção das políticas educativas no interior de cada país. Saliente-se ainda que este tipo de trabalhos tem sido também influenciado pelos resultados obtidos na pesquisa em áreas do conhecimento em que os conceitos de mediação e de mediatização têm vindo a ser trabalhados. Todavia, apesar da proliferação de estudos em torno da mediação e da mediatização, as perspetivas sobre cada um destes conceitos não são consensuais (Couldry, 2008; Rawolle, 2010). Particularmente, o conceito de mediatização tem sido analisado sob diversos ângulos em estudos sobre comunicação, sociologia e pós-modernismo e talvez, também por isso, como Rawolle (2010) refere, tenha admitido, enquanto processo de mudança, interpretações diferentes. No que respeita à mediação são-lhe atribuídos pelo menos dois entendimentos.
17 Segundo Mazzoleni e Schulz (1999) e Rawolle (2010), a mediação coloca o enfoque em aspetos funcionais dos meios de comunicação que permitem às instituições operarem e contribuírem para melhorar a comunicação; neste sentido, os media são vistos como intermediários ou mediadores. Por seu lado, Roger Silverstone (citado por Couldry, 2008) entende a mediação como um processo dialético, desigual, não linear, que requer, antes de mais, que se compreenda como os processos de comunicação alteram os ambientes social e cultural, bem como as relações entre os indivíduos e entre estes e as instituições e a sociedade em geral (Couldry, 2008). Nesta ordem de ideias, dada a sua função de mediação, os media permitem que se estabeleça uma dinâmica de fluxos de produção, circulação, interpretação e receção, descontínuos e assimétricos, que condicionam a formulação dos problemas e a interpretação e a implementação das políticas (Couldry, 2008), o que está, hoje, longe de ser um processo neutro e linear. Sendo assim, os processos de mediação levados a efeito pelos media, enquanto fórum de discussão de questões de interesse público, nomeadamente das que respeitam aos problemas da educação, contêm quer uma função cognitiva quer uma dimensão estratégica, de poder e influência.
- 6 Strömbäck (2011; 2013), na sua análise sobre os processos de mediatização da política, conceptualiz (...)
18Embora, de um modo geral, a mediatização denote um processo de mudança que se gere por uma lógica de dependência de umas instituições sobre outras (Strömbäck, 2013)6 esta prende-se, do ponto de vista de Rawolle (2010), sobretudo com questões relacionadas com a forma como o envolvimento dos media altera e formata as relações e influencia as práticas dos agentes situados em campos sociais distintos. Nesta ordem de ideias, os media exercem um importante papel nos processos de obtenção de poder por parte dos agentes, das pessoas e das instituições, cujas vozes são validadas no campo (Cabalin, 2014), assumindo, em contrapartida, um papel estratégico considerável na definição dos problemas e na circulação das suas soluções. E, por conseguinte, “it would be unwise to ignore the effect that media has on the strategies of education policy agents” (Rawolle, 2010, p. 21).
- 7 Rawolle (2010, p. 26) considera a prática “the way that individuals and groups made meaning of the (...)
19Do ponto de vista de Couldry (2008), pese embora os conceitos de mediação e de mediatização se complementem, o primeiro “in spite of its apparent vagueness, […] has a multivalence which usefully supplements accounts of the ‘mediatization’” (Couldry, 2008, p. 375). Particularmente, Rawolle (2010) conceptualiza a mediatização das políticas como um conjunto de práticas ― jogo jogado num campo social temporário ― de que resultam efeitos cruzados do jogo da prática entre os agentes posicionados em campos distintos7, sinalizando, conjuntamente com Lingard, um conjunto de seis efeitos, designados cross-field effects: efeitos estruturais, de acontecimentos, sistémicos, temporários, hierárquicos e verticais. Os efeitos estruturais têm, na opinião destes autores, uma importância fundamental na articulação que se estabelece entre os campos sociais, pois estão relacionados com as estruturas de ligação; uma vez que a eficácia de muitas medidas de política depende da forma como estas são interpretadas pelos media, existem agentes especializados num campo com funções no outro campo, designadamente assessores de imprensa e todo um aparelho complexo, de modo a influenciar a forma como o outro campo trabalha ou interpreta os assuntos, ainda que nem sempre com êxito (Lingard & Rawolle, 2004). Na verdade, o processo de mediatização da política e das políticas envolve sempre “a tricky dance” da qual ambas as partes procuram tirar proveitos (Stack, 2010, p. 107). Para além disso, a relação entre agentes posicionados em campos distintos, hierarquicamente estruturados, como são por exemplo o campo jornalístico e o campo político, implica o uso do prestígio e da legitimidade ― assentes numa dialética de conhecimento e reconhecimento (Stack, 2010) ― de que estes agentes são portadores e que são reconhecidos nos dois campos. Por outras palavras, esta interação entre práticas localizadas em diferentes campos sociais leva geralmente ao reposicionamento hierárquico dos agentes no respetivo campo, ou seja, ao eventual acréscimo de capital social e simbólico decorrente do sucesso das suas práticas.
20Consideramos que as pesquisas que contribuam para aprofundar conhecimento sobre o papel dos media nas políticas educativas são particularmente oportunas. Note-se que os próprios documentos orientadores da INO sublinham a importância do envolvimento dos media na divulgação da Iniciativa com vista ao seu sucesso, o que evidencia o reconhecimento por parte dos decisores políticos de que os media são um agente relevante a ter em conta no processo de governança da educação.
- 8 Segundo os “indicadores anuário da comunicação” publicado pela Obercom (disponível em: <http://www. (...)
21 Com a intencionalidade de perceber a forma como a INO foi interpretada nos media nacionais, os dados que apresentamos nas secções que se seguem decorrem da análise de textos dos géneros jornalísticos notícia e reportagem, publicados, entre 2005 e 2013, em dois jornais portugueses generalistas: o CM, diário popular com elevada tiragem em Portugal8, e o Expresso, um dos jornais de referência portugueses. Globalmente, a pesquisa procurou responder às seguintes questões: (a) Que estratégias dominaram na forma como a INO foi apresentada? (b) Que recursos mobilizaram os jornalistas na construção da notícia? (c) Quais as temáticas tratadas em cada um dos pilares da INO e quais os aspetos sublinhados? e (d) Quais as tensões que os discursos evidenciaram?
22A opção pela imprensa escrita prendeu-se com um conjunto de fatores, nomeadamente com o facto de: (a) os jornais “constituir[em] um importante meio para a formação de uma ‘opinião pública’” (Melo, 2009, p. 112); (b) os indivíduos terem um controlo razoável sobre o meio de comunicação, no sentido em que podem controlar com eficiência a leitura dos artigos que selecionam; (c) os jornais potenciarem a “prática da reflexividade social” (Melo, 2009, p. 112); (d) os jornais terem capacidade de assumir um papel importante na ampliação e na mobilização social em torno de assuntos que despoletam ou que decorrem nas redes sociais, de comunicação horizontal, atraindo novos grupos para a causa e favorecendo a abertura de “policy windows”, exercendo, assim, um papel de mediação importante nos protestos políticos, mas sendo também influenciados por estes acontecimentos; (e) a imprensa de referência possuir um capital simbólico mais elevado e continuar a “sugestionar fortemente os outros media” (Barriga, 2007, p. 30), incluindo a agenda noticiosa da televisão (Melo, 2009); e, por último, (f) em questões de política, em particular, a imprensa escrita ter capacidade de influenciar a agenda de decisão (Barriga, 2007, p. 30).
- 9 Publicados a 25.05.2006; 13.03, 29.04, 03.05, 25.05, 01.06 e 11.12 de 2007; 11.01 e 31.03 de 2008; (...)
- 10 Publicados a 11.07 e 12.12 de 2009; 18.09, 25.09, 23.10 e 11.12 de 2010; e 21.05.2011.
- 11 Publicados a 05.05. 2007 e 01.09.2012, e a 17.05.2008 e 27.06.2009, respetivamente.
23 A análise incidiu sobre uma amostragem recolhida do caderno principal do CM e do Expresso, subordinada à expressão “novas oportunidades”. Os textos recolhidos correspondem às notícias e reportagens com mais de 150 palavras cujo conteúdo se relaciona com a INO publicadas semanalmente pelo Expresso, e, em dias de número ímpar, pelo CM. Assim, a amostra é composta por 20 artigos do género jornalístico notícia publicados no CM9, sete artigos do género jornalístico notícia10 publicados no Expresso, duas reportagens e ainda dois artigos que contêm as duas componentes11 publicados neste último jornal.
24 Dos 20 artigos do CM, 19 são assinados por 13 autores diferentes. Na sua maioria (80%) estes textos constituem a notícia principal da página onde se encontram e contêm, em média, 345 palavras. Neste jornal, nenhum dos artigos fez manchete do dia ou foi notícia de primeira página. Por sua vez, oito dos 11 artigos publicados pelo Expresso são da autoria de uma mesma jornalista, tendo dois deles sido escritos em parceria. Os artigos têm, em média, 874 palavras. Um dos artigos foi manchete do Expresso e dois foram notícia de destaque na primeira página.
25Com vista a alcançar o objetivo geral do estudo, utilizámos o método de análise do discurso proposto por Carvalho (2000) por permitir compreender e interpretar quer os discursos dos jornalistas quer as estratégias discursivas utilizadas na construção da realidade por outros atores sociais que serviram de fonte aos jornalistas, tal como a autora sublinha. Noutros termos, trata-se de um processo de análise completo, na medida em que inclui diversas formas de análise (textual, aplicada a cada texto individualmente, diacrónica e sincrónica-comparativa), possibilitando considerar os textos sem perder de vista os respetivos autores, os seus interesses e os capitais mobilizados, bem como o contexto social e político em que eles surgiram.
26Assim, numa primeira fase, realizámos uma análise textual, considerando seis dimensões — descritores de superfície e organização estrutural, temas/tópicos, agentes, linguagem e retórica, estratégias discursivas, e posições ideológicas —, e numa segunda fase efetuámos uma análise contextual numa perspetiva diacrónica, recorrendo a uma ferramenta de análise qualitativa de dados assistida por computador (Atlas.ti).
27A apresentação dos dados divide-se em duas secções organizadas por jornal. Esta organização revelou-se a mais adequada para dar conta do modo como a INO foi interpretada em ambos os jornais, evidenciando as estratégias utilizadas, os temas tratados, os recursos mobilizados, os atores envolvidos no debate e as perspetivas e os interesses que estiveram em jogo em cada um dos jornais.
28No CM os títulos destacaram os agentes citados no texto, dando realce ao poder político. Este diário deu ênfase à política, à estratégia e à ação do governo, bem como ao jogo político e a questões de liderança/personalização, abordando assuntos maioritariamente em torno do eixo Adultos. Nos artigos publicados até 2010, a INO foi apresentada sobretudo numa perspetiva otimista e na ótica de que teria reflexo nas vidas profissionais dos formandos, na empregabilidade, na economia e no desenvolvimento e na modernização do país. Os enfoques, no que respeita ao eixo Jovem, centraram-se particularmente na mais-valia que parecia representar na facilitação da inserção no mercado de trabalho. Aliás, a importância e a necessidade de qualificar a população portuguesa, a formação de adultos como forma de combater o desemprego e o sucesso da INO manifestado na procura de uma qualificação de nível secundário por parte das pessoas ativas empregadas, proporcionando-lhes uma segunda oportunidade, foram muito enfatizados. Esta lógica coexistiu nos discursos, designadamente nos de José Sócrates, com a ideia de que a INO também daria um contributo para a justiça social, pela oportunidade que oferecia aos portugueses de ascenderem socialmente. Todavia, alguns aspetos menos positivos foram, também, sublinhados durante este primeiro período de implementação da INO: (a) a persistência do abandono escolar ― associado à criminalidade e à exclusão social e interpretado como uma incapacidade de a escola ir ao encontro de situações que respeitam também à política social, mas também ela própria foi apresentada como geradora de exclusão social ―, e a defesa da manutenção dos planos curriculares alternativos; (b) o financiamento da INO, designadamente com os atrasos nos pagamentos aos formadores dos CNO; e (c) a introdução no Orçamento do Estado da obrigatoriedade de os desempregados com direito a Rendimento Social de Inserção e com nível de habilitações inferior ao 12.º ano se inscreverem no programa INO.
29 A forma predominante de exploração dos assuntos foi para a mobilização de autoridades, preferencialmente de cariz político, como ministros e secretários de Estado. Ou seja, as fontes oficiais e institucionais, designadamente atores governamentais, foram privilegiadas. Por um lado, confirmando a ideia de Schoemaker e Vos (2011) de que as fontes governamentais (que incluem os assessores de imprensa e o restante staff do governo responsável pela comunicação) continuam a ser uma fonte credível de informação, cujo fluxo é garantido sem custos acrescidos para os jornalistas. Por outro lado, permitindo aos governos controlar a informação que deve ser partilhada com os media (Shoemaker & Vos, 2011). Deste modo, ao funcionar como uma espécie de facilitador da formação da opinião pública e da interpretação da política, este jornal exerceu um importante papel de mediação na fase de implementação da INO. Tal pode, em parte, justificar a forte adesão dos portugueses, pois, como Lingard e Rawolle (2004), Rönnberg, Lindgren, e Segerholm (2012) referem, o sucesso de muitas medidas de política depende do modo como são interpretadas pelos media.
30Porém, este processo evidencia também uma certa dependência do campo político em relação ao campo dos media no que respeita ao spin dos políticos, ou seja, ao modo como os políticos usam o seu capital simbólico para controlar a forma como o público recebe as políticas (Stack, 2010). Por outras palavras, parece transparecer uma espécie de governação por spin no sentido atribuído por Ungerleider (2006, p. 77-78), ou seja, uma marca de gestão: “Governments monitor the media vigilantly as barometers of public sentiment. They try to anticipate issues to which they might be required to respond, and to assert tactical advantage in the provision of information to influence perception and understanding”.
31No período de 2011 a 2013 a atenção do CM dirigiu-se, em tom crítico, para as alterações na educação e formação de adultos e para o modo como estas foram introduzidas pelo XIX Governo Constitucional. A dinâmica teve início durante o período de campanha eleitoral para as legislativas de 2011 e fez intervir um conjunto de atores e instituições com prestígio e credibilidade no espaço público, nomeadamente a Associação Nacional de Profissionais de Educação e Formação de Adultos.
32Contudo, embora de modo menos intensivo, este jornal parece não ter deixado de funcionar durante este período como uma plataforma de divulgação da política educativa do XIX Governo; este facto é evidenciado na publicação do artigo de 19.05.2012 no qual é apresentada a visão, claramente neoliberal, do XIX Governo para a educação e formação de pessoas, predominantemente ao serviço da racionalidade económica e desenvolvida numa ótica de eficiência e redução de custos.
33O Expresso privilegiou as questões de substância a propósito da INO, quase exclusivamente relacionadas com aspetos respeitantes à vertente dos Adultos, verificando-se, em alguns artigos, uma identificação da INO com esta vertente. À exceção do conflito entre José Sócrates e Passos Coelho gerado em período eleitoral em torno da perspetiva de cada um perante a INO, pouca importância deu ao posicionamento de atores em torno do jogo político ou sequer à voz dos governantes, optando por destacar um conjunto diversificado de atores. Com efeito, nos recursos utilizados verificou-se uma incidência no relato de pequenas histórias de vida de pessoas e a mobilização da opinião de autoridades na argumentação e apresentação de pontos de vista. Salvo raras exceções em que a informação prestada serviu de pretexto para a análise e argumentação, a componente meramente informativa de caráter neutro esteve presente, mas pouca expressão teve. Ou seja, o posicionamento do jornalista surgiu, por vezes, de uma forma bastante clara, mostrando um envolvimento dos jornalistas e do Expresso em torno de causas como a educação e a formação de adultos, respeitando e valorizando a validação e certificação de aprendizagens, quer formais quer não formais e informais, adquiridas ao longo e ao largo da vida.
34Apesar de este jornal ter destacado esta medida de política educativa na primeira página, realçou-a, sobretudo em termos de notícia, por um prisma que em nada dignificou a INO. Um aspeto que contribuiu para a construção de uma imagem desfavorável prende-se com a questão dos conhecidos “recibos verdes”, que foi salientada em maio de 2008, perspetivando a INO, do ponto de vista político, como uma medida que sustentou a precariedade no trabalho.
35Um outro aspeto, apresentado como uma espécie de sombra que, de alguma forma, se abateu sobre a INO remete para as metas estabelecidas no eixo Adultos. Estas foram encaradas por Luís Capucha, autor referido e citado, como um desafio à manutenção da procura, mas, de um modo geral, foram vistas com preocupação por serem demasiado ambiciosas e, em 2010, dadas já como não cumpridas. Todavia, a problemática foi construída através da sua relação com o rigor e com a qualidade, designadamente dos processos de RVCC, uma vez que foi em torno destes que a questão se colocou. A pressão exercida pela via financeira para o cumprimento de metas, o crescimento apresentado como demasiado rápido dos CNO, a imposição de metas a priori face à necessidade de dar resposta a públicos diversos e a finalidades estatísticas, interpretadas como estando subjacentes à estratégia do governo, foram exemplos de aspetos salientados na argumentação em torno do assunto que mostraram a difícil relação entre a manutenção do rigor e da exigência dos processos (e da INO em geral) e o cumprimento das metas. Porém, ao enfatizar a relação entre a qualidade e o rigor da formação e o financiamento dos CNO, o Expresso funcionou também, no nosso entender, como uma forma de chamar a atenção do poder político para a necessidade de discutir e repensar o modelo de programa da INO e a sua forma de financiamento.
36A luta discursiva que este jornal encetou em torno da lei de acesso ao ensino superior acabou por contribuir para a descredibilização dos cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA) e, por conseguinte, da própria INO. Com efeito, os cursos EFA foram apresentados como uma forma fácil e rápida de acesso ao ensino superior e uma via utilizada, abusivamente, por alunos que não conseguiam completar o ensino secundário nos cursos científico-humanísticos ou que, na melhor das situações, não conseguiam alcançar a média desejada. Por outro lado, na luta discursiva em torno desta lei de acesso ao ensino superior, o Expresso, fazendo uso do seu prestígio enquanto jornal de referência em Portugal, conseguiu influenciar quer as práticas de outros media quer as práticas no campo das políticas, evidenciando o poder que um jornal pode exercer no processo de regulação das políticas educativas. Aliás, a própria jornalista, num artigo publicado a 21.05.2011, realça o efeito que os textos anteriormente publicados pelo Expresso em torno da lei de acesso ao ensino superior produziram e, simultaneamente, evidencia o poder do jornal nos processos de regulação das políticas educativas, quando diz que “a decisão do ministro do Ensino Superior [de alterar a referida lei] foi tomada na sequência de uma notícia do Expresso (em setembro de 2010)”. Neste jogo parece-nos ter sucedido, também, o que Rawolle (2010) designa por mediatização das políticas, pois formou-se um campo social temporário em que foi jogado o jogo da prática e do qual resultaram efeitos cruzados entre os agentes posicionados em campos distintos. Além disso, a seguinte passagem desse mesmo artigo - “Numa nota enviada ao Expresso, o gabinete de Mariano Gago explica agora que as regras vão mudar já no concurso deste ano” - parece também ser bastante esclarecedora da consciência, por parte dos decisores, da influência da imprensa, nomeadamente da imprensa de referência, na forma como os problemas da educação são interpretados e no sucesso ou insucesso das medidas de política educativa.
37Uma ótica mais otimista ficou patente no âmbito das reportagens. Recorrendo sobretudo a histórias de vida de adultos que passaram por processos educativos e formativos no âmbito da INO, foi construída uma imagem favorável da política de qualificação de adultos, concretizada na INO, no combate às desigualdades sociais. A INO foi apresentada como uma componente fundamental do processo de integração e inclusão na sociedade desenvolvido por instituições sociais, tendo em conta a oportunidade que ofereceu de (re)qualificar públicos adultos marginalizados, através da possibilidade de reconhecer e validar aprendizagens efetuadas ao longo e ao largo da vida, viabilizando o acesso a uma qualificação e certificação profissional.
38Os processos de RVCC, em particular, foram perspetivados de uma forma muito favorável, quer pelo impacto significativo que afirmaram ter na melhoria da autoestima e do sentido de autorrealização dos adultos quer pelo facto de as aprendizagens informais ou não formais ao longo e ao largo da vida, mesmo que em situações de exclusão social (como foram referidas algumas no texto de 27.06.2009), poderem ser valorizadas e reconhecidas formalmente.
39Num tempo de crise económica e numa economia em que o conhecimento é entendido como um bem precioso no mercado de trabalho, a INO assumiu a validação das aprendizagens não formais e informais, que assenta em pressupostos do paradigma da educação permanente (Barros, 2016), como uma componente importante do programa no eixo Adultos. Ainda que se reconheça nesta modalidade educativa uma clara convergência com os ideais do movimento da educação permanente, o modo como é implementada no quadro da INO traduz uma reinterpretação que enfatiza a ALV como uma responsabilidade individual centrada em aspirações profissionais. Na verdade, o potencial contributo para a empregabilidade e a competitividade económica da validação de aprendizagens não formais e informais, bem como de outras medidas tomadas no âmbito deste programa, e a sua transformação numa forma rápida de acesso à certificação foram aspetos que não passaram despercebidos aos media e que contribuíram decisivamente para o afastamento entre as orientações de educação de adultos e os referenciais da educação permanente.
40Em nossa opinião, os dois jornais considerados nesta pesquisa exerceram um importante papel de mediação da INO. Com efeito, a análise efetuada aos artigos publicados pelo CM e pelo Expresso vem confirmar que no processo de mediação há sempre interesses em jogo, pois esta implica a descodificação e a recodificação dos acontecimentos, das mensagens, enfim, de tudo quanto é passível de ser noticiado por forma a tornar o mundo compreensível, procurando reduzir a sua complexidade e, simultaneamente, acelerando a sua transformação. Além disso, parece ter-se, também, observado em ambos os jornais “o mito da imparcialidade”, que Freitas (2013) refere na seguinte passagem:
[…] o mito da imparcialidade ou da objetividade no jornalismo, não se sustenta [sic]. Porque de forma implícita, ou muitas vezes explícita, a ação jornalística resulta de direcionamentos político-ideológicos, que confirmam a subjetividade do trabalho midiático e denunciam a presença dos filtros jornalísticos na produção noticiosa. (p. 219)
41Desde modo, o papel de mediação exercido pela imprensa escrita terá contribuído para reforçar uma visão de ALV que se afasta dos ideais do movimento da educação permanente, ao privilegiar a orientação das políticas educativas para a adaptabilidade, a empregabilidade, a responsabilidade individual dos adultos pela sua própria formação e a produção de vantagens competitivas de Portugal no contexto global (Lima, 2003).
42Por outro lado, se olharmos para os media como “objectos de apropriação social” (Cardoso, 2009, p. 28), observamos que estes podem ser utilizados quer para revitalizar o espaço público, gerar apoio e mobilizar a opinião pública, quer para conferir protagonismo ao poder político e às agendas políticas. Ora, os resultados desta pesquisa parecem-nos revelar, também, indícios da presença, sobretudo no CM, desta segunda valência. Nesta ordem de ideias, os processos de mediação e de mediatização estão necessariamente interligados e coexistem, numa relação dialética, na forma como os jornalistas interpretam os assuntos e trabalham as problemáticas.
43Por último, não podemos deixar de destacar um outro aspeto que despertou a nossa atenção, que foi o facto de a imagem e a voz da ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, surgirem com mais frequência nas notícias do CM quando o assunto dizia respeito à Escola ou ao Ensino Básico ou Secundário, nomeadamente aos Cursos Profissionais. É que, na pesquisa efetuada, encontrámos algumas notícias que trabalhavam questões relacionadas com a INO, mas que não continham qualquer referência explícita a este programa e, por esse motivo, não integraram o corpus de pesquisa. Uma boa parte dessas notícias prende-se com os cursos profissionais: aumento da oferta e da procura deste tipo de qualificação, vantagens resultantes do facto de conferirem uma dupla certificação e iniciativas simbólicas em prol destes cursos. Estes dados parecem evidenciar uma associação da INO predominantemente à educação e formação de adultos, mas, mais importante ainda, indiciam também que esta Iniciativa parece ter sido associada primordialmente ao campo das políticas sociais e do emprego. Observa-se, assim, a tendência para reduzir a educação às designadas necessidades da economia e à preparação de profissionais, tal como afirma Nóvoa (2013), referindo-se às orientações políticas europeias.
44Uma análise das questões educativas menos empolada por tensões políticas e de governação esteve mais presente no Expresso. Porém, o recurso mais frequente a vozes de especialistas em Educação, que quase não se fizeram ouvir em ambos os jornais, contribuiria, no nosso entender, para um confronto construtivo e um debate de ideias mais enriquecido em torno de conceitos e da substância dos problemas e das questões educativas, pois estas, como quaisquer outras (por exemplo, ligadas à Medicina, à Física, à Economia, à Ciência Política ou a outros ramos da Ciência), requerem análises científicas. Designadamente, estes contributos são cruciais para contrabalançar e criticar as atuais abordagens, tendencialmente hegemónicas, em torno da ideia de ALV, as quais arriscam limitar as possibilidades de a educação concretizar todo o seu potencial humanista e emancipatório, nos planos pessoal e social, na contemporaneidade (Nóvoa, 2013).