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Nozick, Robert, Invariances: The Structure of the Objective World, The Belknap Press of Harvard University Press, Cambridge, 2001, 416 pp.

Maria João Cabrita
p. 251-256
Referência(s):

Robert Nozick, Invariances : the structure of the objective world, Cambridge : The Belknap Press of Harvard University Press, 416 pp.

Texto integral

1O modo como Robert Nozick (1939-2002) concebeu a filosofia – enquanto espaço de abertura a uma pluralidade de ideias – revela a inquietação de quem, contemplando a paisagem no topo de um escadote milenário, assumiu a inexistência de pontos fixos e, por isso, declinou antever a direcção da humanidade e do pensamento. Pensador versátil, cuja curiosidade sobre o desconhecido o impeliu aos mais variados territórios da reflexão (ética, política, epistemologia e filosofia da mente), reconheceu em Sócrates o protótipo do filósofo – admirando-o não tanto como progenitor do pensamento ocidental quanto pela sua incomensurável lição de assunção da ignorância. Amante da reflexão, do ensino e da escrita; distinguiu-se como uma força criativa ímpar do universo académico, um dos filósofos mais brilhantes e originais do nosso século. Infelizmente, por cá pouco ou nada se tem dito sobre este filósofo de formação e vocação. Urge removê-lo dos recônditos para a galeria dos destacáveis – onde, desde cedo, deixou vestígios.

2Quando em 1970 John Rawls colocou à disposição do jovem professor de Harvard o manuscrito daquela que viria a ser considerada a maior obra de filosofia moral e política do nosso século, A Theory of Justice (1971), não estaria longe de imaginar que daquela mente brilhante nascesse uma das críticas mais ferozes à sua concepção de justiça como equidade – Anarchy, State, and Utopia (1974). Não foi por acaso que no prefácio à obra o professor do neo-contratualismo agradeceu o alento e apoio de Nozick, pela troca de impressões celebrada na fronteira entre os liberalismos moderno e clássico, o igualitarismo e o libertarismo. No antagonismo, tanto quanto Rawls, à teoria política dominante, o utilitarismo, Nozick acabaria por apresentar uma alternativa de feição libertária. Assente na compreensão da liberdade pessoal e da propriedade privada como direitos individuais inalienáveis, advogou as concepções de Estado como «guarda-nocturno» e de justiça como «justo título» – fundada em exigências cuja satisfação é um bem em si. A apreensão do Estado mínimo como estrutura da utopia do melhor dos mundos possíveis trouxe um novo ímpeto ao optimismo e à esperança na América, então sacudida pelo escândalo Watergate e o desastre do Vietname.

3Não obstante o sólido aparato conceptual de Anarchy, State, and Utopia, arreigado à moral kantiana e à política lockeana, o estilo acessível com que expôs as ideias libertárias e o imediato reconhecimento público – premiado pelo National Book Award, figurou na lista dos cem livros mais influentes do pós-guerra do The Times Literary Supplement; a obra foi referenciada pela comunidade filosófica não tanto pela proposta veiculada como pela crítica fomentada. Concebendo os bens como património de um sujeito, o anarquista libertário opôs-se à concepção de bem inerente à situação a-histórica da posição original rawlsiana – sob artifício do véu de ignorância despoja o «eu» de todos os seus atributos – e ao modelo da distribuição enraizado no princípio da diferença, que atribui ao Estado o protagonismo. Na fenda aberta por Nozick cresceria a objecção comunitarista ao individualismo exacerbado de Rawls.

4Destacando-se, deste modo, como interveniente de relevo na discussão despontada por A Theory of Justice no seio e para além da comunidade filosófica, Nozick viu cair sobre si o título de «filósofo político» quando, como ininterruptamente fez questão de sublinhar, a reflexão sobre a política constituiu um acidente de percurso do seu trabalho intelectual. Não refutou as objecções elevadas ao seu pluralismo libertário por crer só assim manter, em relação aos pontos de vista de que dimanam, a distância crítica necessária; por o seu estímulo intelectualmente provir não tanto da reformulação de cogitações prévias como de ideias novas sobre novos tópicos. Mantendo o projecto político em aberto alcançaria o propósito inicialmente traçado: lançar novas pistas sobre o anarquismo libertário. Jamais aspirou dizer a «última palavra».

5No seguimento do estudo sobre a filosofia da ciência em The Normative Theory of Individual Choice (1963) – tese de doutoramento defendida na Universidade de Princeton, sob a orientação de Hempel – a «vontade livre» constituiu o epicentro do seu interesse filosófico. A ele retornaria após a divulgação do seu pensamento político – devedor da paixão pela ética e adversidade a todas as formas de coacção – anexando-lhe questões sobre o conhecimento, o eu, o significado da vida ou modo como cada um de nós escolhe dispor do seu tempo. Esta última questão revelar-lhe-ia a estreiteza do solo em que havia nascido e dado os primeiros passos como filósofo, a filosofia analítica.

6Treinado para assinalar os pontos fracos da argumentação, acabaria por criticar a natureza coerciva deste método – análise que, a par da consequente prefiguração da alternativa libertária, constituiu o veio do seu pensamento. Anunciada em Anarchy, State, and Utopia, a seta apontada ao âmago da argumentação receberia uma fórmula mais explícita em Philosophical Explanations (1981). Neste ensaio assinala o princípio da compulsão fundamental da filosofia analítica: levar os leitores a acreditarem pela constância das consequências, quando as premissas dadas são anunciadas como prova. Rompendo com o espírito da disputa fomentado pelos mentores da filosofia e na esteira da «explicação científica» de Hempel – «modelo de lei de cobertura» em que explicar uma coisa consiste em inferi-la de uma lei e das suas condições gerais – propôs um método explicativo intimamente associado à noção de conhecimento como «persecução da verdade», em que a nossa crença persegue a evidência. Segundo a perspectiva não-justificacional, sugerida por Nozick, as condições que estabelecem as análises do conhecimento são todas externas – o conhecimento consiste numa relação real e específica com o mundo. Real porque apreendida independentemente do facto de alguém pensar ou não que isso aconteça.

7Em vez de encaminhar o leitor no pensamento conclusivo, a explicação estimula-o a explorar vias alternativas; a meditar sobre o que se lhe apresenta e o que é possível. O desejo e curiosidade de aprofundarmos a compreensão sobre o mundo fundamentam as nossas crenças – só podemos explicar aquilo que cremos ser verdadeiro, enquanto provamos sem crermos no provado. Com a proposta de actividade de conhecimento mútuo (autor/leitor) Nozick expôs o seu percurso intelectual sem aliciar ninguém a ir ao seu encontro. Acentuando a importância da introspecção e do desenvolvimento moral e concebendo o conhecimento como «persecução da verdade», abriu as portas ao pluralismo filosófico. O trabalho filosófico é, neste sentido, similar ao trabalho artístico – autor e leitor viajam juntos, crescem em frente um do outro. Em cada ensaio o filósofo espelha o estádio de um processo de maturação em curso; de uma demanda que, sob advertência da «cristalização» como morte da reflexão, se afigura ininterrupta.

8Redigido num período em que a sua leccionação universitária focalizou sobretudo a filosofia indiana, clássica e contemporânea, Philosophical Explanations constituiu o ponto de viragem do seu desígnio – interpretado, a partir de então, como uma alternativa radical à filosofia analítica. Sob forma kantiana reexaminou algumas questões teóricas fundamentais – a objectividade da verdade ética, a vontade livre, a identidade própria e os limites do conhecimento – e demonstrou que o propósito filosófico da explicação amplia o horizonte ético ao progresso moral. A temática «Filosofia e significado da vida», último capítulo deste extenso ensaio, seria retomada e aprofundada na exposição da filosofia como uma via da vida, em Examined of Life (1989). O fascínio com que, nesta obra, reveste a noção de «presença» no sentido em que a meditação pura do carácter pluralista da realidade se torna central – evidencia o enorme influxo da filosofia oriental no seu modo de pensar.

9A explicação sobre os tópicos da vida – o amor, a sexualidade, a felicidade e a morte, entre outros – pressupõe a compreensão da filosofia como uma aventura dinâmica da transformação do «eu» na concretização do que dá significado e valor à sua existência – não tanto a procura quanto à sabedoria. Entre as concepções do sentido da vida como procura (existencialista) e como sabedoria (zen), é evidente a proximidade do filósofo a esta última. É no âmbito particular que a vida adquire significado; dado caber a cada pessoa, por si e só por si, escolher o modo de despender do tempo que lhe é concedido. Significado limitado, mutável, não profundo e, enquanto estigma que deixa no mundo os seus vestígios, permanente – sobre ele a filosofia nada pode concluir. Questionar o significado da vida constitui um desafio tanto maior quanto nos lança na dialéctica entre ideias e factos subjacente ao desenvolvimento humano; glorifica-nos enquanto seres com capacidade de escolha.

10A teoria da escolha racional ou da decisão configura, a par da estrutura da «explicação», um dos tópicos das cogitações de Nozick – tema que, de resto, constituiu o cerne da sua tese de doutoramento. Na introdução a Socratic Puzzles (1997) – colectânea de artigos escritos entre as décadas de 60 e 90 – ao elucidar as problemáticas dos ensaios «Coercion» (1969) e «Moral Complications and Moral Structures» (1968) sublinha o papel determinante da teoria da decisão quer no seu pensamento político, em Anarchy, State, and Utopia, quer nas suas reflexões sobre o alcance e limite da racionalidade, em The Nature of Rationality (1993). No primeiro, nuclear ao pensamento sobre a acção individual que está na origem do Estado e aplicada na análise da utopia; no segundo, reformulada pela inclusão do significado simbólico das acções e, sob proposta da maximização do valor-decisão, ministrada às decisões da crença racional – concebendo a racionalidade como uma adaptação evolucionista com propósito e função delimitada.

11Quando nos finais de 1998 a Gazette da Universidade de Harvard comunicou a nomeação de Robert Nozick a Joseph Pellegrino University Professor, cume da carreira académica, anunciou aquela que viria a ser a sua última obra, Invariances: The Structure of the Objective World. Vítima de um cancro no estômago desde 1994, o filósofo libertário esperava ser-lhe concedido o tempo indispensável ao desfecho dos seus estudos sobre a natureza da verdade e da objectividade e a função da consciência subjectiva no mundo objectivo, nos próximos dois anos. A obra viria a ser publicada em finais de 2001, dois meses depois o filósofo morreu. «We do not know what the philosophy of future will be like; we do not even know what the philosophers of the future will be like» (pág. 301), eis as últimas palavras de quem acima de tudo prezou a liberdade.

12Colectânea de textos dos cursos leccionados pelo filósofo em 1997, por várias universidades europeias e americanas, sobre epistemologia, filosofia da mente e ética, Invariances: The Structure of the Objective World irradia o alcance de quatro décadas de intenso labor filosófico; num desenlace que dilucida a expressividade da filosofia nos tempos que correm. Nela colige uma série de reflexões sobre problemas nucleares ao pensamento contemporâneo – verdade e relativismo, invariância e objectividade, o domínio da consciência e a genealogia da ética – em dois capítulos temáticos: a estrutura do mundo objectivo e o mundo humano como parte do mundo objectivo. Assinalando a abertura e exploração de novos horizontes como especialmente adequada à expansão do conhecimento filosófico, esta obra constitui uma rampa de lançamento para considerações futuras.

13No seguimento dos ensaios precedentes, evidencia como pelo procedimento exclusivo do método da prova se torna impossível evitar a mentira; como é um falso amigo da verdade. Em Invariances os temas são explanados pela aplicação de um método que, alternativo, consiste numa série de incursões filosóficas sob propósito de explorar territórios diversos em prol da diligência e iluminação intelectuais – eco da pluralidade de ideias advogada desde cedo pelo filósofo. A série de incursões filosóficas funda aquilo a que I. Lakatos denominou de «programa de investigação progressiva»; caso alcance, continuamente, posições que anunciem, no seu todo, uma estrutura interessante e fértil em sugestões. É graças às novas vias de aplicação dos velhos métodos, aos novos métodos de incursão, à imaginação e audácia, que o interesse intelectual por obras tão distantes de nós quanto as de Platão se mantém inabalável. Elas continuam a estimular os leitores não pelas fórmulas conclusivas veiculadas mas pelas portas que abrem à reflexão.

14Uma análise evolucionista de alguns dos nossos conceitos fundamentais tranquiliza e abala, em simultâneo, a estrutura de categorias e teorias pela qual compreendemos e explicamos o mundo. Convém ter presente que o mundo humano, e com ele a linguagem, as redes conceptuais e as teorias, fazem parte do mundo objectivo – as conjecturas sobre ele, concorrendo para a sua fisionomia, não são necessariamente e estritamente precisas. As teorias, como sublinhou Einstein em relação à ciência, são criações livres da mente humana, e estas abarcam os conceitos que aquelas empregam. Nem mesmo a aplicabilidade de noções como «desejo» e «crença» pode ser tomada como uma garantia – na perspectiva de alguns filósofos contemporâneos essas categorias da «psicologia popular» são substituíveis por conceitos explicativos de uma neurociência desenvolvida. A cada momento somos obrigados a repensar o mundo, a revermos ou revolucionarmos as redes conceptuais que sobre ele lançamos em demanda de uma melhor compreensão. É sob crença na possibilidade de um mundo melhor que o fazemos.

15Em Invariances Nozick transpõe o horizonte meramente filosófico, estendendo o olhar sobre outros domínios do conhecimento. E isto porque as questões sobre a objectividade dependem de um leque de transformações às quais subjaz algo de invariante; algumas questões éticas da explicação da sua ubiquidade; algumas questões sobre a consciência da sua função biológica; assim como o entendimento sobre a existência de um mundo objectivo da cosmologia. Neste sentido lembra não ser a filosofia tão só uma disciplina a priori – pode estar misturada com o conhecimento comum e perseguir as suas promessas e enigmas; assim como frequentemente se cruza com o conhecimento científico. Tal como a geometria integra uma via mais global; a filosofia faz parte de uma teoria global mais profunda.

16Em «A estrutura do mundo objectivo» – primeira parte da obra – mostra que, não obstante coerente, o relativismo é falso. A sedução que influi sobre o pensamento contemporâneo decorre da sua conexão ao menor constrangimento, à maior tolerância, à igualdade ou, ainda, do nexo entre a verdade (relativa) e as «construções sociais». Na sua análise Nozick evidencia que da verdade relativa a um determinado espaço-tempo não é possível inferir a inexistência da verdade para todo o espaço-tempo; que a «verdade local» não determina a sua estrutura global. Ao minar esta noção de verdade relativa, abala os alicerces do «relativismo social» – a verdade relativa à cultura, ao sexo, ao género e à posição social. É a verdade social relativa? Em que medida é relativa? É relativa entre quem? É relativa, segundo Nozick, entre um ser humano e um outro ser (existente ou possível) do universo; nunca entre seres humanos contemporâneos.

17Considerando o relativismo sobre a verdade irrisório e limitado, evidencia a necessidade de se chegar a uma caracterização geral da verdade em qualquer mundo possível; a uma enunciação que elucide o que existe de comum a todas as verdades; a uma teoria do que seja a verdade e não a uma teoria da verdade. Neste âmbito, refuta as teorias da verdade como coerência e como correspondência. Esta por não nos apresentar uma teoria substantiva e completa da verdade. Aquela por nada nos dizer sobre a verdade num universo distinto; pois conquanto caracterize a direcção actual de todas as verdades, não indica o que seja a verdade em todos os mundos possíveis. Na perspectiva do filósofo libertário a profundidade e rigor de uma teoria da natureza da verdade requer a compreensão de factores ontológicos.

18A intelecção de algo pressupõe o conhecimento daquilo que subjaz a todas as suas transformações, da sua invariância. E, como sublinhou B. Russell, do alcance e limite dessa invariância. Conquanto não constitua um critério absoluto, fundamenta a objectividade dos factos ou da verdade – diferentemente da objectividade da crença, dependente da índole do processo que está na sua origem, decorre do conteúdo e carácter dos eventos. No seguimento da distinção entre objectividade da crença – a exposição evoca as emoções e intuições como parte desse processo – e a objectividade dos factos, tece considerações sobre a verdade objectividade e subjectiva. Porque a objectividade nem sempre é o que se procura ou precisa, a verdade objectiva mobiliza-nos menos que a subjectiva – a coloração que lhe reveste a emoção lança-nos na acção. Confessando o seu cepticismo ante a extensão e estatuto da verdade necessária – dado pressupor a verdade em todos os mundos possíveis – estende a abordagem à problemática dos graus de contingência e com ela alumia a natureza da explicação.

19Perscrutando o território da filosofia da ciência – relembre-se que nele encetou as suas investigações –, aborda a questão da objectividade sob apreciação das reacções radical e defensiva às dificuldades inerentes ao modelo standard da ciência, propondo como alternativa a via funcional. Distinguindo o contributo destes diques para o progresso, racionalidade e objectividade da ciência; assinala a concepção kuhniana de «revolução científica» como paradigmática de uma boa estratégia de investigação – cada nova pesquisa deve acolher, sob o manto da crítica, o trabalho desenvolvido até à data. Na perspectiva de Nozick, a invariância que subjaz às constantes transformações acaba por ampliar a competência da lei – o «universo» a que é ajustável cresce. É à luz dos preceitos sobre a constância que os universos oriundos de processos de evolução cosmológica se tornam compreensíveis. A evolução cosmológica dá-nos mundos objectivos e essa invariância é precisamente o que constitui a sua objectividade.

20Na segunda parte da obra – «O mundo humano como parte do mundo objectivo» – a explanação irrompe dos domínios da filosofia da mente e da ética. Nozick dilucida o papel da consciência nas nossas vidas, pensamentos e concepção de nós próprios; mostrando ter por função tornar a nossa vida mais precisa, subtil e flexível em relação ao mundo. Ao dilucidar a função da nossa «consciência consciente» mostra que a evolução nos dá a capacidade de, a cada momento, detectarmos factos objectivos – sendo algo objectivo quando apreendido de diversos ângulos. Transpondo as fronteiras do fenomenológico – enaltecendo o seu papel enquanto estrutura particular com elevado grau de especificidade estende a análise à relação mente/corpo, à assimetria entre as superveniências fraca e forte e incoerência da sua verdade – contingente no primeiro caso e necessária no segundo. Na medida em que cada nível ou grau de consciência pressupõe a actividade de determinadas partes do cérebro, lança o olhar sobre o domínio biológico.

21No capítulo ético a exposição remete para os temas da escolha objectiva e imparcial dos princípios; das suas características invariantes e função coordenadora. Ante o dilúvio de tentativas mal sucedidas para se fundar a base da verdade ética – de que a história da filosofia nos dá testemunho – convém enveredar-se por um propósito mais modesto, a objectividade ética. Sobre a aplicabilidade da noção de verdade à ética a discussão do filósofo aflora dois estádios: o da caracterização da crença verdadeira e o da identificação da propriedade verdadeira. Mostra estar a objectividade ética intimamente ligada à produção de enunciados sobre a função: ministrar a actividade coordenada em vista de beneficios mútuos; funcionando as suas normas como guias do nosso comportamento. Todavia, que as normas existam para aclarar essa coordenação explicita o porquê da sua existência mas não como surgem. Esta questão requer ser explicada e não justificada – daí a apreciação do filósofo sobre alguns detalhes do sistema de coordenação e cooperação de beneficios mútuos.

22Nozick elucida a interacção entre as nossas capacidades normativa e avaliativa – enunciadas, a par do prazer e dor, dos desejos, necessidade e preferências, como mecanismos gerais de regulação do comportamento. Os princípios éticos são aceitáveis na medida em que são favoráveis ao critério geral conforme os princípios de coordenação e cooperação. O acordo ético decorre da partilha de intuições – noção que nos remete para o horizonte da ubiquidade ética. Contra o relativismo o filósofo lembra que, tal como a alternativa de preferência na escolha social pressupõe a constância, o estatuto ético de uma acção ou política é invariante sob permuta de uma pessoa por outra. Este ensaio acaba por alumiar a ideia nuclear ao seu pensamento político; a noção de direitos como exigências cuja satisfação é um bem em si, comprometido apenas em caso de catástrofe moral. É que na perspectiva de Nozick a política tem por pano de fundo a moral.

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Para citar este artigo

Referência do documento impresso

Maria João Cabrita, «Nozick, Robert, Invariances: The Structure of the Objective World, The Belknap Press of Harvard University Press, Cambridge, 2001, 416 pp.»Cultura, vol. 20 | 2005, 251-256.

Referência eletrónica

Maria João Cabrita, «Nozick, Robert, Invariances: The Structure of the Objective World, The Belknap Press of Harvard University Press, Cambridge, 2001, 416 pp.»Cultura [Online], vol. 20 | 2005, posto online no dia 01 dezembro 2023, consultado o 12 novembro 2024. URL: http://journals.openedition.org/cultura/6003; DOI: https://doi.org/10.4000/cultura.6003

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Maria João Cabrita

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