Ressignificando o não-lugar durante a pandemia covid-19: homens, mulheres e crianças em situação de rua em São José dos Campos/SP, Brasil
Resumos
O artigo tem como tema as condições de vida da população em situação de rua durante a pandemia da COVID-19. O objetivo principal consiste em apontar questões referentes à condição vivida pelas pessoas em situação de rua do município de São José dos Campos/SP, considerando o uso dos espaços públicos como forma de sobrevivência. Propõe-se uma discussão a partir da teoria de Marc Augé sobre o « não-lugar », refletida à luz de uma análise das notas etnográficas dos lugares ocupados por pessoas em situação de rua. As considerações finais deste artigo indicam uma ressignificação dos espaços ocupados, principalmente os de passagem como ruas, rodoviárias e praças, pela população em situação de rua. Verifica-se que estes homens, mulheres e crianças agem de maneira a transformar os « não-lugares » da modernidade em lugares de disputa e significação.
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Artigo recebido em: 17/05/2021
Artigo aprovado em: 31/07/2021
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Introdução
1O artigo tem como proposta apresentar uma reflexão sobre a vida que transcorre nas ruas das cidades brasileiras durante a pandemia de COVID-19, especialmente de homens, mulheres e crianças em situação de rua na cidade de São José dos Campos, no interior de São Paulo. O decreto nº 7.053/2009 conceitua essa população como um grupo populacional heterogêneo que tem em comum a pobreza extrema, vínculos familiares fragilizados ou rompidos e a ausência de moradia regular e que utiliza de logradouros públicos como espaço de moradia e sustento, seja de forma temporária ou permanente. Estes espaços são lugares de vida para homens, mulheres e crianças vulneráveis.
2Para Certeau (1998), o lugar pressupõe a existência de uma certa estabilidade entre os seus elementos, enquanto o espaço indica o movimento, a vida que se dá no lugar, o qual ele denomina de « lugar praticado ». Nesse sentido, Santos (2010) também está convencido que o lugar toma forma a partir do cotidiano compartilhado entre as pessoas, sendo que é « quadro de uma referência pragmática ao mundo, do qual lhe vêm solicitações e ordens precisas de ações condicionadas » (SANTOS, 2010, p. 592).
3 Uma importante pesquisa publicada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2020) apontou que no contexto pandêmico houve o aprofundamento da condição de vulnerabilidade social da população em situação de rua dado o aumento da desocupação entre ela, a dificuldade de acesso à higiene e ao abrigamento e a alimentação. Segundo o estudo, até março de 2020 eram 220 mil brasileiros nessa condição, o que representa um aumento de 140% quando comparado com o registro de 2012.
- 1 O censo realizado em 2019, pela Prefeitura de São Paulo, constatou que 24.344 pessoas estão em situ (...)
4Neste contexto, cidades como São José dos Campos, apresentam problemas similares a outras cidades brasileiras quando analisados os lugares de vida da população em situação de rua, normalmente entendidos como os não-lugares de Augé (1994). Os não-lugares apresentam-se como novos lugares, surgidos com o intuito de acolher esses sujeitos em trânsito, aspecto típico da modernidade. Entre eles listam-se os aeroportos, as estações de trens, as autoestradas, os templos de consumo desenfreado e frenético, tais como os hipermercados e os shopping centers, bem como os espaços globais conectados e em rede. O estar de passagem constitui, nesta perspectiva, o não-lugar. De acordo o autor, « caminhar é ter falta de lugar. É o processo indefinido de estar ausente e à procura de um próprio. A errância, multiplicada e reunida pela cidade, faz dela uma imensa experiência social de privação de lugar » (CERTEAU, 1998, p. 183). No entanto, na mesma modernidade de que falam os autores acima citados, os não-lugares passaram a acolher não apenas as pessoas em trânsito, mas também homens, mulheres e crianças que utilizam estes locais como meio de sobrevivência e/ou fixação. Trata-se de lugares como a praça da Igreja da Sé, no centro de São Paulo1, que tem sido local de « moradia » da população que não consegue acessar as políticas de acolhimento do município. Essa situação também replicada em outras capitais, como na cidade do Rio de Janeiro, nas célebres escadarias da Igreja da Candelária, ou em Salvador, na região da Igreja de São Francisco, no Pelourinho. Em São José dos Campos, o padrão não se difere. Na última pesquisa realizada com a população em situação de rua, em 2019, verificou-se que cerca de 816 pessoas viviam em tal condição. Trata-se de um crescimento de 104% nos últimos dois anos.
5Considerando a problemática apontada acima, neste artigo, dedica-se à apresentação de dados preliminares relativos às experiências etnográficas das autoras em São José dos Campos/SP durante a pandemia da COVID-19. Dado o momento, durante o ano de 2020 e no início de 2021, os trabalhos de campo sofreram profundas alterações: o contato direto com a população em situação de rua foi minimizado, restringindo a realização de observações diretas das formas pelas quais tal população passou a ocupar a cidade durante a pandemia.
6Soma-se a essa experiência de pesquisa cruzada o levantamento realizado por uma das pesquisadoras durante sua dissertação de mestrado (GOULART, 2018), cujo intuito era compreender as percepções das pessoas em situação de rua que ocupam os lugares públicos e suas histórias de vivências nesses locais. Nesse sentido, a dimensão mais aproximada da visão da população em situação de rua sobre estar e se apropriar da « rua » foi recuperada nos relatórios da pesquisa anterior.
7O artigo está organizado em três partes. A primeira revisita a teoria da modernidade e a construção do conceito de não-lugar; a segunda mostra a problemática estrutural da população em situação de rua durante a pandemia; e a terceira centra-se na apresentação e análise das notas etnográficas produzidas entre os anos de 2020 e 2021. Elas foram organizadas a fim de valorizar o debate dos lugares de passagem e fixação em São José dos Campos. Para a observação foram selecionados cinco ditos não-lugares: as imediações de dois supermercados; as praças da Igreja Matriz e da Igreja de São Benedito; e a « Rodoviária Nova »/Terminal Rodoviário Frederico Ozanan, localizada na Vila Piratininga, a cerca de 2,5 km dos primeiros lugares, já distantes da região central da cidade.
8Certeau (1998) considera as questões relativas aos modos como o sujeito se insere no mundo, seja por meio da linguagem, das práticas comunicacionais ou de suas caminhadas pelas cidades, a partir dos significados das interações entre o sujeito, o lugar e sua forma de apropriação. No entanto, os questionamentos que sobressaem dessa constatação são: como a população em situação de rua redefine esses lugares transitórios? Como esta população sobrevive/resiste nesses locais, mesmo que eles sejam definidos como provisórios? E até mesmo como se apropriam dos mesmos? São estes os questionamentos que orientaram a produção do artigo.
Modernidade e suas implicações na produção do lugar e do não-lugar
9Reconhecendo a extensão do debate relativo à modernidade, esclarece-se que foi mobilizada apenas a literatura que nos ajuda a aprofundar os questionamentos da etnografia proposta. Portanto, não é objetivo desta seção esgotar ou atingir a complexidade da produção sobre modernidade e globalização. Nesse sentido, entende-se que a modernidade, conforme definiu Giddens (1991, p. 11), « refere-se a estilo, costume de vida ou organização social que emergiram na Europa a partir do século XVII e que ulteriormente se tornaram mais ou menos mundiais em sua influência ». Os lugares se tornaram fantasmagóricos na visão do autor, pois há relações entre ausentes que os moldam.
10Sassen (2010) considera que a modernidade e os processos de globalização abrangem diferentes dinâmicas. Primeiro, ela favorece a criação de uma ordem cosmopolita de mercados financeiros e dispositivos políticos internacionalistas. Em segundo plano, intensificam-se os processos econômicos e sociais que ocorrem dentro dos territórios nacionais. Conforme Harvey (1998), verifica-se, neste contexto, a produção do espaço no interior da acumulação capitalista e intensificação da ordem de exploração da classe trabalhadora, que é um processo perverso e desigual em natureza.
11Desta forma, com a intensificação dos fluxos, principalmente econômicos, no final do século XX, Augé (1994) defende que a forma de ocupação dos espaços geográficos se deu por meio do que ele denomina sobremodernidade, que se define pela coexistência de realidades distintas a partir de fluxos de diferentes qualidades. Para o autor, a ocupação dos espaços também se dá pela supermodernidade definida por países, cuja lógica social é controversa, já que impele parte da população a viver o excesso de consumo, enquanto a outra parte vive na miséria e sem condições básicas de sobrevivência. Esse é « [...] um mundo prometido à individualidade solitária, à passagem, ao provisório, ao efêmero » (AUGÉ, 1994, p. 74). Neste contexto, verifica-se o excesso de informação, de imagens e de individualismo. Eles são fatores essenciais na sobremodernidade, bem como sua maior produção e consumo.
12De acordo com Augé (1994, p. 52) o lugar é « simbolizado, identitário, relacional e histórico » e se define a partir da « [...] possibilidade dos percursos que nele se efetuam, os discursos que nele se pronunciam e da linguagem que o caracteriza » (AUGÉ, 1994, p. 77). Na situação de rua, o lugar se completa por meio da interação das narrativas constituídas pelas experiências individuais e coletivas de seus ocupantes na ação da própria ocupação, na qual ocorre o compartilhamento de significados acerca do lugar e dos próprios sujeitos que ali inscrevem suas marcas. Neste contexto, observa-se que as jornadas das pessoas que ali se concentram podem ser marcadas pelo que Knowles (2017, p. 28) definiu como uma « criação e dramatização de uma habitação móvel », pois « na medida em que as pessoas percorrem as superfícies profundas de suas vidas cotidianas, e as rotinas esporádicas de viagens de longos percursos, elas mapeiam e conectam lugares distintos », criando, segundo a autora, geografias particulares co-criadas nos deslocamentos.
13Frente à questão social, os lugares de passagem em nossas cidades, conceituados anteriormente como não-lugares (AUGÉ, 1994), podem ser redefinidos. O próprio autor (AUGÉ, 2006 apud SÁ, 2014, p. 213) avança ao considerar que « se definirmos o não lugar não como um espaço empiricamente identificável [...], mas como o espaço criado pelo olhar que o toma como objeto, podemos admitir que o não lugar de uns [...] seja o lugar de outros ». A rua, por exemplo. Embora ela seja um lugar caracterizado pela ausência de fixação de significado, sua existência está relacionada à forma como os sujeitos se apropriam deste espaço.
14O conceito de lugar cunhado por Certeau (1998) apresenta-se nesse debate como uma possibilidade reflexiva interessante. O lugar, segundo o autor, pode ser entendido como « [...] uma configuração instantânea de posições. Ele implica uma relação de estabilidade » (CERTEAU, 1998, p. 201) acerca dos modos de configuração do urbano e pela interação das informações criadas e existentes nestes lugares. Assim, é possível definir um lugar como uma rua ou uma praça, que ao ser planejada e construída é ausente de significado. Ao mesmo tempo, pode-se entender o espaço como a prática do lugar, ou seja, a forma como os sujeitos transformam-no a partir das suas ocupações, apropriações e vivências.
15A partir dessas considerações, o conceito atribuído à rua pode ser associado à perspectiva do risco, tal como definiu Giddens (1991). Ou seja, ela agrega qualidades relativas ao imponderável, cujos resultados inesperados, tal como a violência, derivam do modo de produção de que se faz parte. No processo de submissão das ruas à ordem moderna, ela foi racionalizada e retificada. Somente com o advento e agravamento do capitalismo industrial, isto é, com o planejamento urbanístico, a rua se tornou outra, cujo sentido se orientava pela ideia de tráfego e sua eficácia, e a circulação nas cidades passou a ser tratada como fluxo, segundo a racionalidade do transporte e do deslocamento (LILLEBYE, 1996). Apenas assim a rua, que se tornava obra da classe dominante, passou a ser também utilizada por ela (CABRAL, 2005).
16No Brasil, essa dialética assume suas próprias características, colocando a casa e a rua em categorias diferentes de pessoas e de personagens. Isso, para o antropólogo Roberto Damatta (1997a), constitui duas classes sociológicas completamente opostas e particulares. Dessa maneira, o autor esclarece que:
Quando digo então que « casa » e « rua » são categorias sociológicas para os brasileiros, estou afirmando que, entre nós, estas palavras não designam simplesmente espaços geográficos ou coisas físicas comensuráveis, mas acima de tudo entidade moral, esferas de ação social, províncias éticas dotadas de positividade, domínios culturais institucionalizados e, por causa disso, capazes de despertar emoções, reações, leis, orações, músicas e imagens esteticamente emolduradas e inspiradas. (DAMATTA, p. 14, 1997b, grifos nossos).
17A rua, em oposição a casa, é lugar do individualismo, da subversão de valores dominantes na casa, que se fundam na hierarquia e no reconhecimento do lugar desigual que ocupa seus membros. É neste lugar que tomamos contato com o anonimato, no qual as leis universais deveriam condicionar a ação dos sujeitos. Estar na rua pode significar o rompimento com o grupo social que mantém a casa unida. Segundo Damatta (1997b), a ameaça de ir para o « olho da rua » significa tomar contato com o império da lei.
18Lefebvre (1999) apresenta um discurso positivo e negativo sobre a rua. Positivamente a rua não se constitui apenas como um local de passagem, mas também como um local de encontros e acessos. Para o autor, é o lugar onde « efetua-se o movimento, a mistura, sem os quais não há vida urbana [...] » (LEFEBVRE, 1999, p. 27). Negativamente, Lefebvre cita a superficialidade existente nesses encontros que ocorrem na rua, não havendo grande interação ou qualquer preocupação da existência de outra pessoa ocupando o mesmo lugar. No entanto, « a rua ainda pode ser vista como o local onde se percebem as diferenças sociais, na medida em que, na transitoriedade das pessoas por esse local, concretiza-se a espacialidade social existente » (CARLOS, 2007, p. 51).
19No trabalho de Damatta, a rua também é vista como « um espaço que está em contraste dinâmico com o espaço ‘da casa’: é a zona de individualização, da luta, onde cada um deve zelar por si; é, em suma, ‘um local perigoso’ » (DAMATTA, 1997, p. 57). É um espaço que pode ser ocupado por pessoas que passam a viver “como se estivessem em casa” (DAMATTA, 1997, p. 55).
20No contexto de discussão deste artigo, a rua representa o lugar de cotidiano compartilhado por pessoas e instituições. Dessa forma, o lugar é o quadro de referência pragmática ao mundo e da ação intersubjetiva (SANTOS, 2004, p. 314). E, tal como os assentamentos precários, como as favelas, cortiços e pensões, a rua acaba por ser também o lugar dos pobres na cidade, no sentido da fixação precária e, desta maneira, exige que se revisite sua categorização como não-lugar.
O aprofundamento da vulnerabilidade da população em situação de rua durante a pandemia
21Boaventura de Sousa Santos (2020, p. 16) esclareceu ainda no início da pandemia de COVID-19 que qualquer quarentena é discriminatória, sendo mais difícil para alguns grupos sociais do que para outros. Neste contexto, a população em situação de rua apresenta-se como exemplar da condição de vida em meio a injustiças causadas pela « exploração capitalista, pela discriminação, racial e pela discriminação sexual », conforme cita o autor. No Brasil, a questão das desigualdades sociais foi aprofundada na pandemia, visto que o aumento de desemprego fez com que famílias inteiras passassem a viver nas ruas.
22Diante da realidade apresentada, vale salientar o questionamento realizado por Maciel, Silva e Souza (2020): como se pode proteger do contágio do vírus COVID-19 quando o acolhimento institucional da população em situação de rua é a única saída? Segundo as autoras, o acolhimento em si não permite a prática do distanciamento social, dadas as condições oferecidas pelos serviços de acolhimento, que muitas vezes não oferecem número suficiente de vagas à quantidade de pessoas que se encontram em situação de rua. Os locais de abrigamento são casas alugadas pela Secretaria de Apoio Social ao Cidadão (SASC) e que, por vezes, não oferecem estrutura física suficiente para cumprir as normativas do trabalho com a população em situação de rua, não conseguindo cumprir, assim, normas eficazes de distanciamento social para a não contaminação por COVID-19.
23Com o decorrer da pandemia, fez-se necessária a definição de diretrizes nacionais para o enfrentamento do contágio nos serviços oferecidos à população em situação de rua. Muitas dessas orientações foram publicadas entre março e abril de 2020, quando a maioria dos estados e das capitais já havia iniciado medidas de isolamento social. Cabe destacar as recomendações para a continuidade e adequação das estratégias específicas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e Sistema Único de Assistência Social (SUAS), sob execução dos municípios.
24Complementando as diretrizes, os municípios vêm adotando medidas no intuito de amenizar a exposição das pessoas que se encontram em situação de rua, tais como a distribuição de máscaras, álcool em gel, orientações frequentes sobre higiene e formas de prevenção. Porém, ainda se pode pôr em pauta questões como o acolhimento e o atendimento na rede de saúde do SUS. Com um número de pessoas em situação de rua cada vez maior, tem sido um desafio aos municípios oferecer uma forma de acolhimento com o devido distanciamento social. A prefeitura da cidade de São Paulo, como medida emergencial, publicou um edital de credenciamento sob nº 001/2020/SMADS, que visa cadastrar estabelecimentos como hotéis e pousadas com intuito de acolher a população que não era absorvida pelos centros de acolhimentos disponíveis, dando assim condições de distanciamento social. Porém, não houve nenhuma instituição interessada, alegando apenas receber pessoas que tivessem sido realocadas ou sofrido ordem de despejo devido à pandemia.
25Contudo, há ainda barreiras relacionadas ao atendimento de pessoas em situação de rua no Sistema Único de Saúde, sistema este gratuito e preconizado a atender qualquer cidadão que dele necessitar. O preconceito é uma das barreiras mais evidentes enfrentadas por quem está em situação de rua e precisa do atendimento de saúde pública. Diversas pesquisas (GONÇALVES, 2014; HINO; SANTOS; ROSA, 2018; PAIVA et al. 2016; DANTAS, 2007) mostram nos relatos das pessoas em situação de rua o preconceito vivenciado nos atendimentos em Unidade de Pronto Atendimento, Unidades Básicas de Saúde e hospitais. Muitos ainda são vistos como « vagabundo », « drogado », « bêbado », adjetivos estes sempre presentes no cotidiano desta população.
26Dados levantados por Maciel, Silva e Souza (2020), a partir de jornais locais, em particular o jornal O Vale, evidenciaram, ainda em 2019, o aumento da população em situação de rua no município. E em maio de 2020 registraram-se 816 pessoas nesta mesma situação, sendo que o município alegou ser 50% advindas de outros municípios.
27Em setembro de 2020, segundo dados da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE), o município já aparecia na oitava posição em número de infectados pelo COVID-19, o que levou a prefeitura, segundo levantamento das autoras, a tomar providências no intuito de amenizar a taxa de contágio entre a população em situação de rua. As medidas tomadas foram: aumento das vagas nos abrigos; e criação de um abrigo para acolher as pessoas em situação de rua que necessitasse de isolamento devido ao contágio do vírus COVID-19.
- 2 Ver <www.seade.gov.br/coronavirus/#>. Acesso em: 28 de abril de 2021.
28Segundo dados fornecidos pela Fundação SEADE2, o estado de São Paulo, em 28 de abril de 2021, registrou 2.873.238 casos de contaminação e 94.656 óbitos por COVID-19, sendo que parte destes números (61.820 contaminados e 1.192 óbitos) era do município de São José dos Campos.
29Assunção (2020) publicou uma matéria no site Rede Brasil Atual ressaltando que até o mês de agosto de 2020 a cidade de São Paulo já registrava 29 óbitos por COVID-19 entre a população em situação de rua, porém ainda não foram divulgados dados atualizados e nada se sabe sobre o número de subnotificações.
30Dados da Fundação SEADE mostraram que, até o dia 23 de abril de 2021, São José dos Campos, mais especificamente o bairro Monte Castelo, onde se localiza o principal abrigo do município, registrou cerca de 40 mortes por COVID-19. No entanto, o município não publicou os dados de contaminação e morte pelo vírus entre a população em situação de rua.
Notas etnográficas da ocupação dos não-lugares por « moradores de rua » durante a pandemia em São José dos Campos3
- 3 O ensaio etnográfico foi produzido durante o ano de 2020, a partir de abril e nos cincos primeiros (...)
31No início do mês de abril de 2020, São José dos Campos/SP, como muitas cidades brasileiras, em decorrência da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19), passou a reorganizar suas funções, principalmente as comerciais. Neste contexto de restrições, a população em situação de rua tornou-se mais visível, considerando-se que ela vive entre a rua e o abrigo. A mensagem « fique em casa » que circulou durante a pandemia não fazia qualquer sentido para aqueles que têm a rua como seu lugar de fixação. A região central de São José dos Campos assumiu uma nova característica na pandemia, diferenciando-se daquilo apontado em estudo elaborado por Silva et al. (2014). Naquela ocasião, segundo os autores, o centro da cidade assemelhava-se a uma colcha de retalhos: « [...] permeada de memórias vivenciadas e construídas, em suas calçadas, pelos passantes e pelos vendedores ambulantes; em suas praças, pelos engraxates, pelas prostitutas, pelos pastores e pelos camelôs fixos » (SILVA et al., 2014, p. 84).
32Logo, a região central era caracterizada como lugar de construção de inúmeras narrativas, também construídas por homens, mulheres e crianças em situação de rua, conforme mostra Goulart (2018), em dissertação de mestrado, ao relatar a fala de uma entrevistada sobre seu processo de vivência na rua. Nesta citação, verifica-se a valorização da trajetória de vida de homens e mulheres que têm as ruas joseenses como seu espaço de vida.
[...] meu pai de São Paulo... me trouxe pequenininha... eu vim pra São José e fiquei aqui desde criança... só que eu não conheci minha mãe e fui criada desde pequena de abrigo em abrigo... ele é independente (dependente químico) ... a casa que mora não é dele... a casa é da minha madrasta. [...] então eu preferi sair de casa... mesmo... eu queria ser dependente (independente) da minha vida... desde criança.... como eu queria ser dependente (independente) eu fui pra rua... fiquei na rua… [Irani]. (GOULART, 2018 p. 62).
33Neste sentido, Frangella (2004) também colabora para a nossa discussão ao destacar que a população em situação de rua, dada uma série de condicionantes explicitados anteriormente, passa « [...] a habitar ‘cantos’ da cidade impensáveis ao planejamento urbanístico e ao imaginário coletivo dos citadinos: as ruas, os espaços vazios embaixo de viadutos, as praças, as calçadas » (FRANGELLA, 2004, p. 11). Estes lugares, segundo a autora, são espaços abertos da cidade.
34Passados quase vinte anos da elaboração do trabalho de Frangella (2004), o « estar » na rua ainda continua significando a ocupação de bancos de praças, escadarias, entornos das igrejas, bancos de rodoviária e calçadas de supermercados. Ainda é uma ocupação que não passa despercebida, considerando que a população em situação de rua possui uma corporalidade própria, quase sempre fácil de ser definida. Seu corpo:
[...] aparece como último território, sobre o que e por meio do qual singularizam-se as manifestações de sua experiência na cidade. Desprovidos de bens materiais, sem casa, absolutamente fora das práticas de consumo, envelhecendo na rua, corpo sujo e fétido que os mimetiza no asfalto, o morador de rua aparece como uma ameaça às definições normativas do espaço urbano e às projeções corporais idealizadas. (FRANGELLA, 2004, p. 61).
35É comum encontrar estes « corpos questionadores » notadamente acompanhados por seus animais de estimação, normalmente cachorros, alimentos e pertences de diferentes qualidades. Eles e elas são motivo de olhares desconfiados dos transeuntes, que os evitam sempre que possível. Verifica-se que a aproximação não se faz sem constrangimentos. No contexto da rua, de « não-lugares » e fluxos, esses humanos nem sempre são reconhecíveis como tais.
36Em São José dos Campos, selecionaram-se alguns reconhecidos não-lugares para desenvolver observações etnográficas, sendo eles: as imediações de dois supermercados (cercanias do comércio central e expandido); a Praça da Igreja Matriz e a São Benedito; e a « Rodoviária Nova », localizada na Vila Piratininga, cerca de 2,5 km dos primeiros lugares. Na Figura 1, visualiza-se a fachada da igreja São Benedito, fotografada no dia 13 de março de 2021, quando se realizou uma das observações. Havia ali muitas pessoas em situação de rua. O homem que ilustra a foto está em situação de rua e é uma figura marcada na região. Na imagem, ele parece contradizer a paisagem utilizada por munícipes e turistas para fotografias.
37Conforme Kojio (2009, p. 80), a partir da década de 1970, « o centro da cidade, que anteriormente concentrava residências dos segmentos mais abastados, passou a abrigar os menos favorecidos, juntamente com um grande número de lojas comerciais, órgãos públicos e espaços de lazer ». O Mercado Municipal de São José dos Campos, por exemplo, foi inaugurado em 1923, e há quase cem anos reúne comerciantes que hoje são cadastrados pela Prefeitura Municipal e comercializam diversos produtos, incluindo artesanato de diversas qualidades, verduras, legumes, peixes e carnes, bem como lanches. Esse também é um espaço de trânsito da população em situação de rua, pois muitos são vistos pegando alimentos descartados ou até mesmo papelão para venda.
38No século XXI, São José dos Campos ainda se destaca por possuir o maior parque industrial, comercial e de serviços da região do Vale do Paraíba Paulista e Litoral Norte. Iniciado na década de 1950, o processo de industrialização foi acompanhado por um rápido crescimento populacional e, consequentemente, por notáveis mudanças em sua área urbana. O aumento das atividades comerciais e bancárias, aliado à existência de um terminal rodoviário intra-urbano e intermunicipal e de grandes edifícios residenciais, acarretou a saturação da região central da cidade, interferindo nos investimentos imobiliários nesta área. O estrangulamento do sistema viário motivou a expansão das atividades comerciais e de serviços, bem como a ocupação por edifícios residenciais a partir da região central em direção à área conhecida como Vila AdyAnna, ou ainda em área um pouco mais a leste, mas ainda central.
39Nas décadas recentes, a região central continua sendo o ponto de maior concentração de atividades comerciais e de serviços. São José dos Campos, como muitas cidades brasileiras, possui uma alta concentração de empregos nesses setores. Estudos do Ministério do Trabalho e Emprego, realizados em 2015, apontam que, no município, cerca de 70% dos empregos formais eram derivados das atividades de comércio (39.661 postos) e serviço (98.703 postos), e ainda, no que se refere aos estabelecimentos, eram cerca de 16.449 diretamente relacionados às atividades de serviços e 10.259 a estabelecimentos comerciais. A frenética circulação no centro da cidade é representativa dessa condição econômica.
- 4 Ver Leitura técnica do Município para revisão do Plano Diretor. <http://planodiretor.sjc.sp.gov.br/resources/uploads/EstudoTecnico/Anexo/PD_VOLUME_1_C7_REGIOES_URBANAS.pdf>.
40Segundo estudos técnicos da Prefeitura Municipal de São José dos Campos4, a região do centro ocupa uma porção de 18,68 km² da área urbana e abrange quatro setores socioeconômicos nomeados de Centro, Jardim Paulista, Vila AdyAnna e Jardim Esplanada e vem sendo submetida a projetos de revitalização nos últimos anos. Dois projetos se destacam nesse momento: o Centro Vivo e o Novo Centro.
O projeto Centro Vivo logrou realocar em locais determinados e preparados pela Prefeitura os vendedores ambulantes que antes ocupavam calçadas e praças de forma dispersa. Além disso, reformou e revitalizou a Galeria Pedro Rachid, que passou a abrigar um equipamento da área da saúde. Já o projeto Novo Centro foi desenvolvido alinhado ao Plano de Mobilidade Urbana, que estimula o uso de transporte coletivo e de veículos não motorizados. O projeto objetivava a requalificação e revitalização da zona central, contemplando as avenidas São José, Madre Tereza, Rua Rui Dória, Travessa João Dias, Praça Padre João (Igreja Matriz) e a Avenida Nove de Julho. Nas avenidas São José e Madre Tereza, a área de intervenção tem uma extensão de cerca de 1,2 quilômetros e inclui a requalificação dos passeios com implantação de bancos, decks de contemplação do « Banhado », iluminação com barras de LED, quiosques e ciclovia. O Teatro Benedito Alves foi recuperado e defronte a ele foi construído um chafariz de piso, com jogos de água e luz. Na Avenida Nove de julho, o espaço da via foi reestruturado, passando a contar com três faixas de rolamento e uma ciclovia de 2,80 metros de largura, que se conecta às ciclovias da Borba Gato e da orla do Banhado. (Leitura técnica do Município para revisão do Plano Diretor 2006, p. 138).
- 5 O banhado é uma Área de Preservação Ambiental, localizado na região central, trata-se de uma área d (...)
41Passados dezesseis anos da proposição registrada nos estudos técnicos que orientaram o Plano Diretor (2006), pode-se considerar que os projetos de « requalificação do centro » foram exitosos para o poder público e comerciantes. Os passeios foram requalificados, bancos e decks de contemplação do « Banhado »5 foram instalados, com iluminação com barras de LED, quiosques e ciclovia foram criados, coibindo cada vez mais a presença das pessoas em situação de rua nestes locais. Verifica-se que o controle da Guarda Municipal na área, especialmente na entrada da Comunidade Nova Esperança, bairro irregular localizado no Banhado, foi intensificado.
42No espaço anteriormente citado, no que se refere à ocupação do centro por homens, mulheres e crianças em situação de rua durante a pandemia, explicita-se, inicialmente, a presença nas portas dos supermercados centrais, muitos dos quais são filiais de grandes redes de capital internacionais ou de redes de capital locais. Esses espaços permanecem cingidos por homens, mulheres e crianças que pedem qualquer ajuda aos clientes.
43Observou-se que, como em outras cidades, as portas dos supermercados, restaurantes e padarias são pontos em que se aglomeram homens, mulheres e crianças em situação de vulnerabilidade, que devido à pandemia do COVID-19 têm utilizado esses espaços como meio de trabalho e/ou local de dormir. É bastante comum encontrá-los dormindo debaixo das marquises durante a noite, ou até mesmo antes do estabelecimento abrir. No horário comercial, o proprietário do negócio, normalmente, dispõe de um serviço de segurança. O funcionário da portaria controla a entrada dessas pessoas, sendo também responsável por evitar que as pessoas em situação de rua se fixem nas muretas do estabelecimento ou « colem » nos clientes. É comum que, em busca de algum auxílio, haja o pedido de produtos que são vendidos no estabelecimento.
44No centro de São José dos Campos é comum notar a sensibilização do « cliente » que sai e deixa uma sacola com o homem ou mulher/criança que o abordou na entrada. Alguns atendem o pedido da pessoa e compram produtos como bolachas, salgadinhos, refrigerantes, leite, fralda etc., que são, normalmente, produtos de baixo valor agregado. Considerando as alterações nos últimos anos no setor de pagamento, com o emprego do cartão de débito ou crédito em transações comerciais, a entrega de dinheiro em espécie, seja na forma de papel ou moeda, aos homens e mulheres que se posicionam frente aos supermercados é pouco recorrente. Há também entre os clientes certa noção, que já faz parte da consciência coletiva, de que se der dinheiro eles/elas compraram bebida ou entorpecentes.
45Neste contexto, observa-se que também o circuito de venda informal é uma prática comum entre a população em vulnerabilidade social. Nesses últimos meses, durante a pandemia, notou-se que os produtos oferecidos no comércio informal eram doces, balas e panos de pratos, não se diferenciando dos produtos anteriormente vendidos. Sabendo da resistência das pessoas de pararem para ouvir alguém sem máscara, os então vendedores (homens, mulheres, crianças em situação de rua) se esforçam para colocá-la quando oferecem o produto.
46Homens e crianças, com a finalidade de construírem empatia, apresentam-se ao cliente que sai da loja por meio de um discurso que valoriza o drama da situação vivida. São recorrentes as frases « compra pra me ajudar », « preciso pagar essa conta », « preciso comprar leite para meu filho » e « estou desempregado ». Sabe-se que nem todos os vendedores informais habitam as ruas. No entanto, muitos relatam a situação precária que vivem, já que vender aqueles produtos é uma tentativa de sobrevivência. Para isso, o valor do produto deve ser apelativo, dessa forma não deve ultrapassar um ou dois reais.
47Em São José dos Campos, é destacada a presença de pessoas em situação de rua no centro e nos bairros próximos à região central que possuem supermercados e padarias. Nota-se que perto do supermercado mais central, em frente à praça Afonso Pena, concentram-se famílias em situação de rua que pedem na porta do estabelecimento, e muitos homens, também nessa condição, que fazem uso de bebidas alcoólicas, principalmente aos domingos pela manhã durante o funcionamento do supermercado (Figura 2). O uso do álcool por essa população, segundo Teixeira (2007, p. 5), « [...] assume, por vezes, o caráter de »anestesia« , principalmente em relação ao sofrimento cotidiano ». Eles chegam até mesmo a comprar bebida neste comércio. Uma rotina pouco presente quando se trata de um supermercado no bairro mais próximo, com perfil mais elitizado, em que se encontram mais famílias em busca de obtenção de algum auxílio.
48A presença do « Apoio Social », que é o serviço destinado à abordagem das pessoas que se encontram em situação de rua, oferecendo atendimento social e abrigamento, é frequente. A « Kombi da Prefeitura » e seus assistentes sociais realizam abordagens, e neste momento, é comum as crianças se esconderem perto do supermercado. Isso acontece porque algumas crianças podem ser levadas a abrigos e ficar sob a responsabilidade do Conselho Tutelar. Para as famílias que pedem nas portas dos supermercados, as crianças ainda são estratégicas, pois causam uma maior sensibilização do cliente do supermercado se elas estiverem juntas às suas mães, que normalmente apresentam as dificuldades vividas.
49A experiência etnográfica revela que, mesmo durante as fases restritivas devido à pandemia de COVID-19, há um grande movimento na praça Padre João, localizada na região central e nas imediações da rodoviária. Na « Praça da Matriz » acontece a « feira do rolo », onde se trocam e se vendem os mais diversos tipos de produtos. Neste local, misturam-se pessoas em diversas condições: transeuntes com objetivos diversos, trabalhadores do comércio local, e homens, mulheres e crianças que resistem e sobrevivem construindo sentido neste « não-lugar ». Verifica-se entre eles que poucos usam máscaras, e quase não existe distanciamento social.
50Na « Praça da Matriz », a circulação começa cedo. Às 8h da manhã já se vê uma movimentação dos que por ali dormiam, com seus cachorros, cobertores e pertences outros. Os comerciantes da « feira do rolo » disputam esse território de vida com aqueles que ainda estão acordando ao chegarem com suas mercadorias para negociação. Também se nota a presença da Guarda Municipal, que ali se instala todos os dias, sem falhar. É um espaço que requer controle e vigilância por estar localizado próximo ao centro comercial de maior importância de São José dos Campos, marcadamente popular e frequentado pela classe média da cidade. Esclarece-se que a classe média-alta, a « elite » como é conhecida na cidade e em outros contextos, dificilmente frequenta essa área, concentrando seu consumo em plataformas online ou nos shoppings da cidade, que durante a pandemia também se mantiveram total ou parcialmente fechados. Nas imediações desses shopping centers, cujo controle de circulação é maior, dificilmente se verifica a presença de população em situação de rua. Em realidade, dois deles estão localizados em lugares de difícil acesso ao transeunte.
51Ainda, na « Praça da Matriz » é comum a presença, algumas vezes no dia, da Kombi da Abordagem Social do município, o « Apoio Social », que com educadores sociais e um técnico assistente social oferece atendimento aos que « desejarem ». Por vezes, a equipe é acionada pelos comerciantes do entorno ou pela população que se sente incomodada com a movimentação e conflitos derivados da presença fixa na rua. Observam-se duas situações recorrentes nas abordagens, a primeira fundada no reconhecimento dessa equipe pelos atendidos, e até mesmo certa « alegria » quando eles aparecem, e uma segunda fundada em uma relação pouco amistosa de recusa e afronta ao atendimento, principalmente, quando os apoiados estão sob o efeito de algum entorpecente, como álcool. Quando há crianças, o drama aumenta, considerando que elas podem ser destinadas ao Conselho Tutelar.
52Como se vê, durante a pandemia, segue-se o ritual de utilização desses « não-lugares » para a mendicância. Dessa forma, muitos usam o espaço para pedir algum dinheiro para se alimentar, e outros usam o espaço para dormir com « certa segurança », aproveitando a presença da Guarda Municipal para se proteger da violência e dos perigos aos quais estão expostos. A presença dessas pessoas em situação de rua na « feira do rolo » não parece ser notada pelos transeuntes, que por vezes apenas desviam dessas pessoas deitadas no caminho, como se fossem objetos ali deixados. Durante o período de observação, quando os comentários desses transeuntes foram ouvidos, foi possível constatar que as pessoas que por ali caminham reconhecem esses corpos como pouco necessários, pois atrapalham o fluxo e, por isso, deveriam ser retirados do local.
53Não muito longe da « Praça da Matriz », pode-se observar e escutar vozes altas, dando direcionamentos ou ensaiando vender qualquer coisa. Logo avista-se na rua 15 de novembro, também no centro da cidade, mais pessoas marcadas pela situação de rua, que, mesmo em meio a uma fase restritiva da pandemia, utilizam o espaço público para « trabalhar », ou seja, ganhar algum dinheiro olhando carros que por ali estacionam ou vendendo alguns objetos no intuito de comprar algo para comer ou até mesmo para o uso de drogas ilícitas.
54É comum encontrar, nessas ruas centrais, casais em situação de rua e que juntos se oferecem para ajudar a estacionar e cuidar de carros no intuito de ganhar algum dinheiro para comprar marmita, para comer ou para beber. Mas a relação com essas pessoas nem sempre é tranquila. A grande maioria dos motoristas agradece-lhes e, quando retorna, dá algum dinheiro em forma de moeda ou notas, normalmente de dois reais. No entanto, é nítido o sentimento de descontentamento ou « incômodo » gerado pelo contato.
55A cerca de dois quilômetros dos supermercados e do comércio, da Praça Matriz e da Igreja São Benedito, está localizado o Terminal Rodoviário Intermunicipal Frederico Ozanan. Inaugurada em 1976, a « Rodoviária Nova », como é conhecida, constitui a porta principal de entrada no município para quem chega de ônibus. Na Figura 3 é possível dimensionar minimamente a distância entre a Praça Matriz e a « Rodoviária Nova », distantes em cerca de três quilômetros.
Figura 3 - Ilustração da distância entre o percurso « Praça Matriz » (A) e « Rodoviária Nova » (B)

Fonte: Elaboração própria a partir do portal Guiamais mapas (2021).
- 6 Somente em 1991 o CENTREN passou a atender exclusivamente os migrantes e a população em situação de (...)
56Por se tratar de uma rodoviária intermunicipal, o fluxo de pessoas advindas de diversos municípios é alto. Segundo informações institucionais, em 2019, antes da pandemia, cerca de cinco mil passageiros embarcavam diariamente e quase dez mil pessoas passavam pelo local (Figura 4). Este é também um ponto de concentração de adultos, homens e mulheres, e de crianças em situação de rua, não apenas por se tratar de uma rodoviária intermunicipal, mas porque, ao lado, encontra-se instalado um dos principais equipamentos de atendimento à população em situação de rua. Trata-se do Centro de Referência Especializado para População em Situação de rua (Centro Pop), criado em 1979 como Centro de Triagem e Encaminhamento (CENTREN)6, ligado à Secretaria de Saúde Municipal, com a finalidade de atender migrantes e munícipes em situação de vulnerabilidade (Figura 5).
57O dia a dia da « Rodoviária Nova » é movimentado. Entre chegadas e partidas, quase não se pode notar a presença de algumas pessoas em situação de rua que por ali circulam. Raras vezes se observa algum viajante sendo abordado por uma destas pessoas na intenção de conseguir algo para comer ou algum dinheiro. Os seguranças contratados pela empresa que administra a rodoviária frequentemente não permitem a permanência das pessoas em situação de rua no local. Também não é permitido usar o banheiro ou se sentar nos bancos de espera. Essas pessoas são sempre expulsas do local, considerando que seus corpos são facilmente identificáveis. Mas elas insistem em retornar. Trata-se de uma forma de resistência e demanda daquele espaço para si.
58Entre o vai e vem, é possível observar que as pessoas que por ali passam quase não notam a presença das pessoas em situação de rua, a não ser que sejam abordadas por uma delas ou que presenciem a forma pouco amiga pela qual são convidados a se retirar do local.
59Muitas vezes, essas pessoas são orientadas a procurar ajuda no Centro Pop, onde recebem atendimento social, alimentação e higienização, se desejarem. O atendimento social tem o objetivo de identificar a demanda de cada pessoa e encaminhá-la para o próximo município, quando um migrante, ou para o abrigo, quando identificado como um munícipe. Quando o migrante apresenta alguma questão de saúde, ele é encaminhado para o hospital e atendido com pernoites no abrigo até que se sinta curado e possa continuar sua viagem.
60Mesmo sofrendo determinada repressão por parte da segurança do local, há nos arredores da rodoviária uma ocupação por parte destas pessoas em situação de rua, seja próximo às árvores na parte externa ou na entrada do estacionamento. Essa movimentação pode ser observada no dia da realização da pesquisa de campo, quando um jovem, aparentando ter quase 30 anos e acompanhado de um cachorro amarrado por um cadarço de tênis, trazia consigo um pedaço de papelão e uma mochila bem grande, de onde retirou alguns pertences e um grande pano de juta preenchido por bijuterias.
61Observando esse jovem, que é representativo de muitos, percebeu-se que ele se sentou no chão junto a árvore e ao seu cachorro e começou a se ajeitar para fazer daquele local seu meio de trabalho. Ficaram ali, os dois, aguardando algum transeunte para oferecer sua arte. Não demorou muito para que os seguranças notassem o rapaz, mas decidissem não ir até ele. Com uma certa frequência passava alguém que era abordado pelo rapaz, que oferecia suas bijuterias sempre enfatizando que eram de sua própria produção e que a venda poderia ajudá-lo a abandonar a situação de rua. Algumas vezes a venda foi feita com sucesso. Outras vezes, as pessoas sequer pararam para ouvir o que o rapaz tinha para dizer. Algumas pessoas, ao passar, comoveram-se com o fato de o rapaz estar acompanhado de seu cachorro, que fielmente aguardava deitado ao seu lado, e se ofereceram para comprar ração ou água para o animal. Ao cair da noite, tanto rapaz quanto seu cachorro começaram a se movimentar, a recolher a mercadoria e a ajeitar o papelão embaixo da árvore. Ele, então, tirou alguns pertences da bolsa, isto é, uma blusa de frio e um cobertor, E ali os dois permaneceram, homem e animal, fazendo da rua seu local de trabalho e « casa ».
62Na região central, está localizado também o Terminal Urbano Central, mais conhecido como « Rodoviária Velha », ponto de chegada e partida dos ônibus que ligam diversos bairros do município. Por estar localizada bem ao lado da « Praça Matriz », o movimento da população em situação de rua neste local é intenso para uso do banheiro e para consumo de água. Mas, assim como na « Rodoviária Nova », eles não podem permanecer no local, e logo são controlados e expulsos pelos guardas municipais que ali trabalham.
63O fluxo de pessoas na Rodoviária Velha é bem mais intenso que na « Rodoviária Nova », possibilitando assim a estas pessoas em situação de rua uma maior chance de conseguir algo para comer ou até mesmo um dinheiro. O local muitas vezes é usado por essas pessoas como forma de fugir da chuva, sol, frio e violência, pois, mesmo sendo retirados do local, eles sempre retornam.
64É comum encontrar uma ou mais pessoas em situação de rua sentadas nos bancos, tirando um cochilo ou simplesmente observando o vai e vem das pessoas apressadas para seus compromissos. Locais como estes têm um significado maior do que ele representa para essas pessoas, pois significam « abrigo », oportunidade e, muitas vezes, segurança.
65Neste quadro apresentado por nosso pequeno ensaio etnográfico, considera-se que o circuito dos « não-lugares », ocupados por pessoas em situação de rua em São José dos Campos, abre-se a partir da « Praça da Matriz » e da Igreja São Benedito, incluindo os supermercados, e se fecha na « Rodoviária Nova », ou o inverso. Esses homens, mulheres e crianças em situação de rua constroem suas trajetórias de vida marcadas por diferentes experiências de exclusão ou inclusão perversa. Fome, frio, alcoolismo, xingamentos, disputas e conflitos, mas também pequenas alegrias ao conseguir algum dinheiro, seja pelo trabalho ou mendicância, são expressões do cotidiano nos « não-lugares ». Para as autoras deste artigo, a existência dessas pessoas em situação de rua, em São José dos Campos e em outros contextos citadinos, são expressões perversas daquilo que na teoria se chama de capitalismo.
Considerações finais
66Diante da realidade descrita por meio do presente trabalho etnográfico, pode-se voltar à discussão sobre o « não-lugar » de Augé (1994), que considera que os « não lugares » são espaços multifuncionais, cujo objetivo é possibilitar a cada um fazer cada vez mais coisas em um mesmo espaço. São espaços para consumir e para criar « novas necessidades » (publicidade, informação). São eles que caracterizam a sobremodernidade, discutida neste artigo. Há a existência de uma diversidade que nos leva a questionar o que atrai os homens, mulheres e crianças em situação de rua até os centros comerciais dentro de uma lógica de ocupação do espaço, que vai além da lógica do consumo e do lazer.
67A relação existente entre corpo e a rua permite entender as interfaces entre o espaço e a vida, assim como a possibilidade de ressignificação destes espaços, que não é isenta de tensões. A população em situação de rua, apesar de fazer uso dos lugares públicos, nem sempre é vista, ou é vista, mas de maneira pouco amigável pelas pessoas que por ali passam.
68A pandemia de COVID-19 colocou em evidência questões sociais gritantes, e a situação de rua é a mais cruel delas, pois atinge todas as formas de desassistência social e humana e fere todos os direitos constitucionais dessas pessoas. Isso deixa ainda mais evidente que a cidade é pensada e vivida com limites bem nítidos, assim esses homens, mulheres e crianças que vivem a situação de rua protagonizam o papel de transgressores, isto é, aqueles que cruzam os limites e, por isso, entram nas zonas de perigo.
69Toda a reflexão acerca das condições da situação de rua impostas a estes homens, mulheres e crianças nos remete aos dispositivos que regem a vida, ou seja, o biopoder e a necropolítica impostos pelo Estado como formas de extermínio e de negligência para com as populações consideradas descartáveis, sujeitando esses corpos à exploração e às condições de vida precárias. Ao abordar a necropolítica, Achille Mbembe (2018) propõe um direcionamento à centralidade das definições em torno da vida e da morte de populações em vulnerabilidade. Entre as urgências e permanências, a COVID-19, além de evidenciar, vem questionar as bases e os limites da política brasileira e as condições sob as quais se exerce o direito de matar ou deixar viver a população em questão.
70ASSUNÇÃO, Clara. Brasil não sabe quantas pessoas em situação de rua foram contaminadas pela covid-19. Rede Brasil Atual. 06 set. 2020. Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2020/09/pessoas-situacao-de-rua-contaminadas-covid-19/ . Acesso em: 27 abr. 2021.
71AUGÉ, Marc. Não lugares: introdução a uma antropologia da supermodernidade. Campinas: Papirus, 1994.
72AUGÉ, Marc. Para que vivemos? 1a edição francesa. Lisboa: 90 Graus, 2006.
73CABRAL, Luciana Francisca. A rua no imaginário social. Scripta Nova. Revista eletrónica de geografía y ciencias sociales, v. IX, n.º 194, 1 ago. 2005.
74CARLOS, Ana Fani. A cidade. 8. ed. São Paulo: Contexto, 2005.
75CARLOS, Ana Fani. O lugar do/no mundo. São Paulo: FFCLH, 2007.
76CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1998.
77DAMATTA, Roberto. Carnavais, malandros e heróis: para uma sociologia do dilema brasileiro. Rio de Janeiro: Rocco, 1997a.
78DAMATTA, Roberto. A casa & a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. Rio de Janeiro: Rocco, 1997b.
79DANTAS, Mônica Lúcia Gomes et al. Construção de políticas públicas para população em situação de rua no município do Rio de Janeiro: limites, avanços e desafios. 2007. Tese (Doutorado) - Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2007. [
80FRANGELLA, Simone Miziara. Corpos urbanos errantes: uma etnografia da corporalidade de moradores de rua em São Paulo. 2004. Tese (Doutorado) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Unicamp, Campinas, 2004.
81GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: Unesp, 1991.
82GONÇALVES, Márcio Augusto. Organização e funcionamento do SUS. Florianópolis: Departamento de Ciências da Administração/UFSC; Brasília: CAPES: UAB, 2014.
83GOULART, Marília. Vida nas ruas: políticas e despolíticas. 2018. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Serviço Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2018.
84GUIMARÃES. Antonio Carlos; ZANETTI, Valéria. São José dos Campos: cotidiano, gênero e representação. São José dos Campos: UNIVAP, 2014.
85HARVEY, David. O problema da Globalização. Revista Novos Rumos, v. 27, n. 13, p. 1-9, 1998.
86HINO, Paula; SANTOS, Jaqueline de Oliveira, ROSA, Anderson da Silva. Pessoas que vivenciam situação de rua sob o olhar da saúde. Revista Brasileira de Enfermagem, v. 71, p.732-740, 2018.
87IPEA – INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Nota Técnica –Estimativa da população em situação de rua no Brasil – setembro de 2012 a março de 2020. Atlas de vulnerabilidade social dos municípios brasileiros. Brasília: Ipea, 2015. n. 73. 2020.
88IPEA – INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Nota Técnica –População em situação de rua em tempos de pandemia: um levantamento de medidas municipais emergenciais. Atlas de vulnerabilidade social dos municípios brasileiros. Brasília: Ipea, 2015. n. 74. 2020.
89KNOWLES, Caroline. Nas trilhas de um chinelo: uma jornada pelas vias secundárias da globalização. São Paulo: Annablume, 2017.
90KOJIO, Nadia Csoknyai del Monte. Políticas Públicas de Patrimônio em São José dos Campos. 2009. Dissertação (Mestrado] Programa de Pós-graduação em Planejamento Urbano e Regional, Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), São José dos Campos, 2009.
91LEFEBVRE, Henri. Da cidade à sociedade urbana. In: LEFEBVRE, Henri. A revolução urbana. 3 ed. Belo Horizonte: UFMG, 1999.
92LILLEBYE, Einar. Architectural and functional relationships in street planning: an historical view. Landscape and Urban Planning, v. 35, p. 85-105, 1996.
93MACIEL, Lidiane Maria; SILVA, Marília Goulart; SOUZA, Adriane A. M. A população em situação de rua diante da pandemia: um estudo de caso ampliado entre São José dos Campos/SP e São Paulo/SP. GC - Revista Nacional de Gerenciamento de Cidades, v. 8, , n. 63, p. 205-225, 2020.
94MBEMBE, Achille. Necropolítica: biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte. Tradução Renata Santini. São Paulo: N 1 edições, 2018.
95MTE - MINISTÉRIO do Trabalho e Emprego. Dados e estatísticas. Disponível em: São José em Dados -Prefeitura de São José dos Campos (sjc.sp.gov.br). Acesso em: 14 mai. 2021.
96PAIVA, Irismar Karla Sarmento et al. Direito à saúde da população em situação de rua: reflexões sobre a problemática. Ciência & Saúde Coletiva, v. 21, p. 2595-2606, 2016.
97PLANO DIRETOR. Leitura técnica do Município para revisão do Plano Diretor. Disponível em: http://planodiretor.sjc.sp.gov.br/resources/uploads/EstudoTecnico/Anexo/PD_VOLUME_1_C7_REGIOES_URBANAS.pdf. Acesso em: 06 mai. 2021.
98SA, Teresa. Lugares e não lugares em Marc Augé. Tempo Social, São Paulo, v. 26, n. 2, p. 209-229, dez. 2014.
99SASSEN, Saskia. Sociologia da globalização. Porto Alegre: Artmed, 2010.
100SANTOS, Boaventura de Sousa. A cruel pedagogia do vírus. Coimbra: Almedina, 2020.
101SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2000.
102SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 4. ed. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2004.
103SANTOS, Milton. O lugar e o cotidiano. SANTOS, Boaventura de Souza Santos; MENESES, Maria Paula (org.). Epistemologias do sul. São Paulo: Cortez, 2010.
104SEADE. Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. Disponível em: https://www.seade.gov.br/coronavirus/#. Acesso em: 23 abr. 2021.
105SILVA, Antonio Carlos Oliveira da et al. A Cidade e seus significados: olhares subjetivos sobre São José dos Campos. GUIMARÃES, Antonio Carlos; ZANETTI, Valeria. São José dos Campos: cotidiano, gênero e representação. São José dos Campos, SP: UNIVAP, 2014
106TEIXEIRA, Paulo André Sousa. Vivência de rua e alcoolização: a produção de sentido em (ex) moradores de rua. Monografia - Departamento de Psicologia, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2007.
Notas
1 O censo realizado em 2019, pela Prefeitura de São Paulo, constatou que 24.344 pessoas estão em situação de rua na cidade, sendo que 11.693 estão acolhidas em centros de atendimento municipais e mais 12.651 fazem de locais públicos seu local de sobrevivência.
2 Ver <www.seade.gov.br/coronavirus/#>. Acesso em: 28 de abril de 2021.
3 O ensaio etnográfico foi produzido durante o ano de 2020, a partir de abril e nos cincos primeiros meses de 2021, na pandemia de COVID-19, por duas das pesquisadoras que assinam este artigo.
4 Ver Leitura técnica do Município para revisão do Plano Diretor. <http://planodiretor.sjc.sp.gov.br/resources/uploads/EstudoTecnico/Anexo/PD_VOLUME_1_C7_REGIOES_URBANAS.pdf>.
5 O banhado é uma Área de Preservação Ambiental, localizado na região central, trata-se de uma área de Várzea do Rio Paraíba do Sul.
6 Somente em 1991 o CENTREN passou a atender exclusivamente os migrantes e a população em situação de rua. E em 1996, com a Lei nº 4800/96, o CENTREN passou a ser Centro Pop e parte da então Secretaria de Desenvolvimento Social. Informações disponíveis em: <https://www.sjc.sp.gov.br/media/49007/plano-municipal-de-assistencia-social.pdf>.
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Título | Figura 1 - Igreja São Benedito, 2021 |
Créditos | Fonte: Autor (2021). |
URL | http://journals.openedition.org/geografares/docannexe/image/2854/img-1.png |
Ficheiro | image/png, 1,2M |
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Título | Figura 2 - Proximidades do supermercado da rua Nelson D´Ávila |
Créditos | Fonte: Autor (2021). |
URL | http://journals.openedition.org/geografares/docannexe/image/2854/img-2.png |
Ficheiro | image/png, 1,1M |
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Título | Figura 3 - Ilustração da distância entre o percurso « Praça Matriz » (A) e « Rodoviária Nova » (B) |
Créditos | Fonte: Elaboração própria a partir do portal Guiamais mapas (2021). |
URL | http://journals.openedition.org/geografares/docannexe/image/2854/img-3.png |
Ficheiro | image/png, 311k |
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Título | Figura 4 - Entrada da « Rodoviária Nova » |
Créditos | Fonte: Autor (2021). |
URL | http://journals.openedition.org/geografares/docannexe/image/2854/img-4.jpg |
Ficheiro | image/jpeg, 97k |
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Título | Figura 5 - Entrada do Centro Pop com as Kombis do Apoio Social |
Créditos | Fonte: Autor (2021). |
URL | http://journals.openedition.org/geografares/docannexe/image/2854/img-5.jpg |
Ficheiro | image/jpeg, 140k |
Para citar este artigo
Referência eletrónica
Marília Goulart Silva, Lidiane M. Maciel e Adriane Aparecida Moreira de Souza, «Ressignificando o não-lugar durante a pandemia covid-19: homens, mulheres e crianças em situação de rua em São José dos Campos/SP, Brasil», Geografares [Online], 33 | 2021, posto online no dia 15 dezembro 2021, consultado o 05 dezembro 2023. URL: http://journals.openedition.org/geografares/2854
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