Texto integral
1Para o estudo da comemoração dos mortos em tempos medievais, os investigadores contam com fontes muito variadas, que incluem, além da documentação escrita (a que faremos alusão já de seguida), os vestígios materiais, a começar pelo espaço eclesial e as suas dependências, que eram os principais lugares onde estavam sepultados os defuntos por alma de quem as cerimónias tinham lugar e onde estas se realizavam. Para estudar essas fontes no seu conjunto, é imperativo criar uma equipa multidisciplinar, que associe historiadores, historiadores da arte, especialistas em liturgia e música, arqueólogos. Será pelo cruzamento dos dados fornecidos por cada área do saber que conseguiremos chegar a um conhecimento efetivo dessas cerimónias e formas de comemoração.
2No que toca à documentação escrita que pode ser usada para esse estudo, ela é composta essencialmente por obituários, testamentos, doações por alma, instituições de capelas, inventários, bem como os livros litúrgicos usados na catedral e outros manuscritos que, de algum modo, refiram os encargos dos vivos para com aqueles que já partiram deste mundo. Neste trabalho, iremos dedicar-nos somente a uma destas fontes, os obituários, e a uma instituição, a Sé de Coimbra, numa abordagem exploratória que nos permitirá perceber melhor o tipo de informações que estes manuscritos fornecem e colocar algumas questões e problemas quanto às suas limitações.
- 1 DAVID, Pierre; SOARES, Torquato de Sousa (eds.) – Liber Anniversariorum Ecclesiae Cathedralis Colim (...)
3O grande e precioso obituário da Sé de Coimbra, normalmente designado por Livro das Kalendas, é, sem dúvida, o mais bem conhecido obituário medieval português, dado ter sido o primeiro dos principais manuscritos deste tipo a ser alvo de uma publicação, em 19471. Essa edição permitiu que tão importante livro estivesse facilmente acessível, e por isso muitos são os investigadores, de diversas áreas, que o têm usado como fonte para os seus trabalhos; ninguém, no entanto, o estudou com o objetivo de reconstituir as cerimónias de comemoração dos mortos que menciona.
- 2 COUTINHO, José Eduardo Reis – “Introdução geral ao Liber Anniversariorum Ecclesiae Cathedralis Coli (...)
- 3 A realização de cópias e de atualizações dos obituários era um fenómeno muito comum; veja-se a este (...)
- 4 ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4.
- 5 ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5.
- 6 BGUC, Reservados, manuscrito nº 1092.
4A análise codicológica deste obituário foi já em grande medida realizada2, pelo que não constitui um dos nossos propósitos. Refira-se apenas que o Livro das Kalendas chegou até nós em três versões3. A mais antiga, medieval, está conservada no Arquivo Nacional Torre do Tombo4. Escrita em pergaminho, em bom estado, faltam‑lhe, contudo, alguns fólios e pedaços de outras folhas, e não é o livro original, mas uma cópia de outro ou outros manuscritos anteriores, como se percebe pelo facto de registos de datas muito diferentes terem sido escritos pela mesma mão, de identidade desconhecida. Existe no mesmo arquivo um traslado deste manuscrito, em papel, realizado no século XVI, que completa o livro anterior nas suas falhas5. Uma terceira versão, em papel, feita no século XVII a partir da cópia quinhentista, pertence ao fundo de manuscritos da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra6.
- 7 ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fl. 111, segundo registo da primeira coluna.
- 8 ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fl. 111, registo com letra diferente que ocupa a maior parte (...)
- 9 ANTT, Colegiada de Sta. Cruz do Castelo de Lisboa, m. 1, nº 25, de 1313 julho, 28, Lisboa, Agradece (...)
5O manuscrito medieval, que mais nos interessa, tem sido datado dos séculos XIII ou XIV. É possível, porém, indicar um intervalo cronológico mais preciso para a sua elaboração: o livro terá sido escrito entre 28 de julho de 1322 ou 1326 e o mesmo dia de 1328. A primeira data é a do último registo de óbito copiado por aquela que pensamos ser a mão original7; a segunda corresponde à da mais antiga inscrição que apresenta outra grafia8, constando ambas das comemorações do dia 4 das calendas de agosto (fig. 1). A incerteza relativamente ao termo a quo prende-se com a forma como a data do registo está escrita: Era Mª CCCª LXIIIIª Kalendas mensis Agusti. O dia do mês é, forçosamente, 4 das calendas de agosto (correspondente, na contagem progressiva dos dias, a 28 de julho), porque a inscrição diz respeito a esse dia; pode-se interpretar como estando a data completa e as unidades corresponderem ao dia do mês, sendo, portanto, a Era hispânica de 1360 (1322 da Era cristã), ou que o ano inclui as unidades e se trata da Era de 1364, ou seja, 1326 da Era cristã, tendo o escriba, por lapso, esquecido a indicação do dia das calendas. Para complicar um pouco mais esta datação, acrescente-se que o registo em causa diz respeito a João Peres de Alporão, deão de Viseu e cónego de Coimbra, que outras informações indicam já não estar vivo em 13139, o que significa que nenhum dos anos indicados corresponderia ao da sua morte. Tal poderia acontecer quer por uma má leitura da data do obituário original, quer por erro cometido ao copiar. Em qualquer dos casos, para o que nos interessa, é possível apontar uma cronologia muito mais precisa para a redação desta versão do obituário, que terá assim ocorrido durante a década de 20 do século XIV.
Fig. 1 – Página do Livro das Kalendas do dia 28 de julho (4 das calendas de agosto) (ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fl. 111).
- 10 Como sucede, por exemplo, a 6 dos idos de janeiro (fls. 4-4v), 6 dos idos de março (fls. 34-34v), 5 (...)
- 11 Veja-se, a título de exemplo, 7 e 8 dos idos de outubro (fl. 137), 6 e 5 dos idos do mesmo mês (fl. (...)
- 12 Vejam-se, a título de exemplo, os obituários de duas colegiadas de Coimbra: o de S. Bartolomeu, pub (...)
- 13 Todos estes elementos estão presentes nos obituários das duas colegiadas de Coimbra citadas na nota (...)
6Este mesmo fólio permite compreender a estrutura do manuscrito. Cada página, dividida em duas colunas, corresponde, por via de regra, a um dia do ano, embora nem sempre tal tenha sido respeitado no caso de registos muito extensos10 ou, pelo contrário, de inscrições curtas e pouco numerosas11. O calendário é apresentado de forma muito simples, sem que, no início de cada mês, se indique o número total dos dias ou se registem dados de natureza astrológica, como sucede com frequência em manuscritos deste tipo12. Os dias, como vimos, são contados segundo o cômputo romano, ou seja, pelo sistema retrógrado das calendas, nonas e idos. Cada um é indicado a vermelho, em letra de maior módulo, a que se segue, na mesma linha, o texto do martirológio, a negro, mencionando os santos e mártires celebrados naquela data. Num módulo menor são, depois, indicados aqueles cujo nome se devia recordar. Não existe listagem dos números áureos, que indicam as fases da lua, nem letras dominicais, ligadas aos dias da semana e ao cálculo da festa da Páscoa13.
- 14 Trata-se de Afonso Martins, que, além de vice-chanceler do rei D. Dinis, era também cónego das Sés (...)
- 15 Uma pública-forma das cláusulas respeitantes à Sé de Coimbra do testamento desta senhora, datada de (...)
- 16 Sabemos que outros espaços claustrais, tanto de catedrais como de mosteiros, receberam sepultamento (...)
7A 28 de julho, para continuarmos no dia que nos está a servir de exemplo, comemorava-se o aniversário da morte do presbítero Julião, cónego da Sé, falecido nesse dia em 1130; do já referido João Peres de Alporão, deão de Viseu e cónego de Coimbra; e de uma senhora, Constança Martins de Meira, falecida em 1328. No primeiro caso, o registo inclui apenas a notícia do óbito. No segundo, dá-nos a conhecer o nome do testamenteiro do falecido14, que entregou dinheiro ao cabido para com ele se refazerem casas cujos rendimentos serviriam para dar aos cónegos todos os anos cinco libras, a serem distribuídas no seu aniversário pelos pobres e enfermos presentes, e informa que o deão estava sepultado na Sé de Lisboa. Já no caso de Constança Martins de Meira a inscrição diz-nos que deixara ao cabido os seus casais em Sebal Menor (c. Condeixa-a-Nova), cujo usufruto cabia a duas freiras do mosteiro de Celas de Coimbra enquanto vivessem, devendo dar três libras por ano ao cabido da Sé para serem divididas entre os pobres, enfermos e cónegos presentes no aniversário15. Depois de ambas as freiras morrerem, os casais passariam a ser propriedade do cabido, e cinco libras do seu rendimento seriam usadas anualmente na celebração do aniversário da defunta, que incluía missa de requiem e três orações específicas a rezar pelos seus pais. O registo informa ainda que esta senhora deixara aos cónegos outros bens, sob certas condições, entre as quais a de que o raçoeiro da Sé de Coimbra Gonçalo Esteves, seu parente e testamenteiro, deles usufruísse em vida, dando ao cabido quatro libras para outro aniversário por alma de D. Constança, a celebrar a 30 de julho. Finalmente, indica o local da sua sepultura, situada no claustro da Sé, na nave de S. Miguel, ou seja, na ala do lado norte. Note-se, desde já, a presença de uma mulher entre os defuntos sepultados no espaço claustral; seria por ela pertencer à família de um raçoeiro, ou tratar-se-ia de uma situação normal16?
8Estes três registos, todos bem diferentes, servem como exemplos para perceber as dificuldades com que se depara quem pretende estudar as cerimónias por alma dos defuntos na catedral. No primeiro, nada é dito a esse respeito. No segundo, as informações centram-se essencialmente nos bens que sustentariam o aniversário instituído, o que parece ser a situação mais usual. Só o terceiro registo, que inclui muitos pormenores acerca dos bens legados, dá indicações acerca da missa que devia ser rezada, as orações escolhidas para sufrágio da alma dos pais da falecida e o local exato onde se encontrava o seu túmulo (versus arbores recte ex opposito hostii per quod fit ascensus ad opus claustri), apesar de esta informação ser de interpretação difícil.
- 17 A este respeito ver RODRIGUES, Ana Maria S. A. – “A comemoração dos defuntos nos finais da Idade Mé (...)
- 18 A título de exemplo, refira-se a planta que existe para o mosteiro de Celas, onde estão assinalados (...)
9Quando nada é explicitado em relação às cerimónias a realizar, podemos supor que se seguiria a prática habitual17 de, no dia anterior ao do aniversário, os nomes dos falecidos serem invocados nas Horas dos Defuntos celebradas à hora de vésperas, ou seja, ao final da tarde. No dia do aniversário, as notícias do martirológio e do obituário seriam lidas após a hora de prima (quando nascia o sol), durante a reunião quotidiana dos cónegos na nave ocidental do claustro da Sé, chamada do cabido precisamente porque este ali reunia. Haveria depois missa por sua intenção, a que se seguiria a procissão até à sepultura, com cruz e água benta. No caso de D. João Peres de Alporão, esta última parte não poderia ter lugar, dado que não se encontrava sepultado na catedral conimbricense; no de Constança Martins de Meira, as indicações precisas sobre a sua última morada permitiriam cumprir esse ritual. E quanto ao cónego Julião, sobre cuja sepultura nada é dito, tal como sucede em muitas outras inscrições no obituário, o que se faria? Saber-se-ia onde cada pessoa estava sepultada, apesar de tal não ser referido? Haveria uma planta ou uma relação dos enterramentos, como encontramos por vezes para épocas mais tardias18, que permitisse conhecer o local onde se situava cada túmulo?
- 19 Cf. RODRIGUES, Ana Maria S. A. – “A comemoração dos defuntos”, p. 139.
10Mesmo quando se refere o tipo de missa instituído, como sucede no registo de Constança Martins, não é explicitado se seria uma missa calada (celebrada por um único oficiante, em silêncio por estar sozinho), rezada (em voz baixa, sem canto) ou cantada (com as orações ditas em voz alta e cantadas)19. Na ausência deste tipo de informações, qual seria a prática? Quem decidiria como fazer, se não houvesse nenhuma indicação a esse respeito?
11Se desconhecemos como a missa solicitada por D. Constança deveria ser oficiada, sabemos que seria de requiem, ou seja, por alma de um defunto. Mas havia outras escolhas possíveis. Usando como exemplo os registos do obituário relativos ao mês de janeiro, verificamos que, das cerca de cem inscrições desse mês, apenas 32 explicitam o tipo de missa a realizar por ocasião do seu aniversário, como se pode ver no quadro nº 1.
Missa
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Nº registos
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Corpus Christi
Cruz
Requiem
Santo Ildefonso
Virgem Maria
Virgem Maria/Requiem
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1
1
24
1
1
4
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Total
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32
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Quadro nº 1 – Tipo de missa solicitado nos registos do mês de janeiro do Livro das Kalendas
- 20 ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fl. 1, calendas de janeiro (este dia falta no manuscrito med (...)
- 21 Trata-se de mestre Gonçalo Lever, físico de D. Dinis (ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fl. 11 (...)
- 22 Missa celebrada por alma de Afonso Peres de Ganata, a 10 das calendas de fevereiro (ANTT, Cabido da (...)
- 23 Mandada celebrar por Fernando Gil, cónego da Sé de Coimbra, a 17 das calendas de fevereiro (ANTT, C (...)
- 24 Assim devia suceder no caso das missas por alma de Martim Miguéis, mercador de Pedrógão (ANTT, Cabi (...)
12Dessas 32, a larguíssima maioria (24, correspondentes a 75% do total) determinava a celebração de uma missa de requiem. Num caso apenas, no aniversário do bispo D. Raimundo d’Ébrard (falecido em 1324), a missa seria a do Corpo de Deus20, num outro, por alma de um físico do rei D. Dinis, a missa da Cruz21. Noutra situação, pede‑se a missa do santo do dia em que a comemoração era instituída, Santo Ildefonso22, e outra ainda prevê a missa dedicada à Virgem Maria23. Nos restantes quatro casos, os aniversários deviam começar a ser celebrados em vida dos seus instituidores: enquanto vivessem, a missa seria a de Santa Maria, e após morrerem a de requiem24.
- 25 Essa pitança seria oferecida a 8 de janeiro, data da morte de Vasco Domingues, que deixou dez libra (...)
- 26 O referido Vasco Domingues deixou dez libras para esse fim, e Martim Miguéis, o mencionado mercador (...)
13Nas cerimónias de janeiro regista-se apenas a instituição de uma pitança, ou seja, de uma dádiva em géneros ou dinheiro que serviria para melhorar uma refeição dos cónegos no dia do aniversário. O seu instituidor, Vasco Domingues, era cónego da Sé e deixou também dinheiro para ser distribuído por quem estivesse presente no seu aniversário25. Essa distribuição, que levaria por certo mais pessoas a participar na celebração, estava prevista em largo número de registos do obituário, variando o seu valor de acordo com as posses e a vontade dos defuntos26.
- 27 Sobre estas missas realizadas no terceiro, no sétimo e no trigésimo dia, ver RODRIGUES, Ana Maria S (...)
- 28 ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fls. 14-14v, no dia 6 das calendas de fevereiro.
- 29 ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fl. 9v, no dia 15 das calendas de fevereiro.
14Regressando aos exemplos já referidos, recordemos que Constança Martins de Meira instituíra um segundo aniversário, a realizar três dias depois do dia da sua morte. Era uma prática bastante frequente, com ela se evocando a Ressurreição de Cristo três dias após falecer27. O sétimo dia, que ainda hoje é dia de missa de sufrágio, era também muito comum, por recordar o dia em que Deus Pai descansou após a criação do mundo, assim como o trigésimo, igualmente celebrado na atualidade, e que teria a sua origem no final do luto por Moisés, um mês após o seu falecimento. O já referido cónego Vasco Domingues, que criou uma pitança, pediu um segundo aniversário trinta dias depois da data da sua morte. Mas podiam criar-se tantas comemorações como as desejadas: dois outros cónegos, os irmãos franceses Beltrão e Guilherme de Crégol, estipularam seis aniversários a celebrar ao longo do ano: a 27 de janeiro, 9 de fevereiro, 12 de março, 5 de abril, 15 de maio e 3 de junho28. Já por alma do mestre-escola D. Giscardo e do cónego Bartolomeu Périer, que fundaram capelas perpétuas na Sé, haveria procissão com responsório todos os dias depois de matinas29, ou seja, pela meia-noite, e talvez por não ser a hora mais habitual este é o único caso do mês de janeiro em que se especifica o momento preciso em que as cerimónias deviam ser levadas a cabo.
- 30 ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fl. 14. A carta data de 4 ou 5 de julho de 1316 (apenas se l (...)
15Outra questão diz respeito ao local onde as missas seriam celebradas. Continuando a analisar os registos de janeiro, verificamos que, sempre que o lugar escolhido é especificado, se trata do altar-mor da catedral. Talvez por ser muito requisitado para este fim, copiou-se no século XV no obituário, no espaço destinado ao dia 19 de janeiro, uma carta de 1316 pela qual o bispo D. Estêvão determinou a união de uma meia-prebenda à celebração de missas de requiem no altar principal da Sé, união essa que o deão do cabido ratificou30.
- 31 Assim foi estipulado nos estatutos dados ao cabido da Sé de Coimbra em 1229 pelo cardeal de Sabina (...)
- 32 Ver MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – A Sé de Coimbra, pp. 247-248 e GOMES, Saul António – “A sol (...)
- 33 DAVID, Pierre – Français du Midi dans les évêchés portugais (1279-1390). Sep. Bulletin des Études P (...)
16Note-se que no altar-mor só os cónegos da catedral, ou quem tivesse uma autorização especial, podiam celebrar missa31. Nos outros locais, qualquer eclesiástico o poderia fazer. Mas a Sé de Coimbra contava com um corpo clerical especificamente encarregado das celebrações dos sufrágios: os bacharéis, que existiam também em Lisboa e Évora, e se encontram documentados em Coimbra desde a década de 1260, tendo-se associado numa confraria cujo compromisso data de 132432. Pierre David considerava que estes eclesiásticos (cuja designação se devia, provavelmente, a terem de possuir o grau académico de bacharel) eram os capelães da catedral encarregados das missas instituídas e de servir no coro33. Na documentação de Coimbra são sempre referidos como um todo, ao qual se pedia com frequência a participação nos ritos fúnebres e nos sufrágios.
- 34 Arquivo da Universidade de Coimbra (= AUC), Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro de registos de a (...)
- 35 AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro dos registos dos aniversários “Confraria dos bacharéis (...)
- 36 AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro dos registos dos aniversários “Confraria dos bacharéis (...)
- 37 AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro dos aniversários dos capelães da Sé, depósito III-D, se (...)
17Não admira, pois, que houvesse um outro livro de aniversários na Sé, para além do Livro das Kalendas, respeitante, precisamente, aos sufrágios que os bacharéis tinham a obrigação de celebrar, por resultarem de doações à arca da confraria, como nos diz a primeira página da terceira versão desse livro que nos chegou (fig. 2). O estudo deste livro de aniversários, que se manteve inédito até agora e, que saibamos, pouco tem sido utilizado, ainda está no seu início, pelo que não podemos adiantar muito a respeito das suas três versões, conservadas no Arquivo da Universidade de Coimbra. A mais antiga, tardo-medieval, data provavelmente do século XV34. A segunda, em pior estado, apresenta no rosto da encadernação a indicação de se tratar do Livro dos aniversários dos capelães da Sé, assim corroborando a hipótese de que os bacharéis desempenhavam essa função35; no início, precedendo os aniversários, foi trasladado um acordo feito pelos bacharéis reunidos em cabido datado de 150736. O fólio inicial do terceiro manuscrito, que vemos na fig. 2, escrito numa bela caligrafia de tipo humanístico, explicita, com precisão, tratar-se de uma cópia do livro antigo elaborada a 25 de fevereiro de 156337.
Fig. 2 – Folha de rosto do Livro dos aniversários dos capelães da Sé
- 38 A este respeito, veja-se a clara explicação dada por CAMPOS, Maria Amélia Álvaro de – A comemoração (...)
18Olhemos para o manuscrito mais antigo (fig. 3). O início de cada mês, com o número total de dias, é indicado a vermelho. Não há martirológio, e os dias são contados de forma progressiva, em numeração romana, inscritos também a vermelho e acompanhados pelas chamadas letras dominicais, que permitiam saber os dias da semana38. Não são apresentadas as datas de óbitos, apenas os nomes dos beneficiários das orações, os bens deixados para os aniversários (dando especial relevo ao dinheiro que cabia aos bacharéis pela celebração) e, com frequência, o local de sepultura e as orações a entoar nas cerimónias.
Fig. 3 – Livro de registos de aniversários, fl. [antes de 1]v-1
- 39 Este cónego foi estudado em MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – “Geraldo Peres, cónego da Sé de Coi (...)
- 40 AUC, Pergaminhos da Sé de Coimbra, Móv.7, G.4, nº 43, de 31 de outubro de 1399, Coimbra (na casa de (...)
- 41 Ver, por exemplo, AUC, Livro de registos de aniversários, III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, nº (...)
19Ao percorrer as folhas deste livro, saltou-nos imediatamente à vista a frequência com que surge um nome que nos é muito familiar: o de Geraldo Peres, cónego da Sé e vigário-geral de vários bispos de Coimbra durante a segunda metade do século XIV39. No seu testamento, lavrado em 1399, está incluída a instituição na Sé de Coimbra de 30 ou 40 aniversários por alma do bispo D. Jorge, seu tio, e pela sua, que ficavam a cargo dos bacharéis40, aos quais deixou herdades na Lousã e uma vinha perto de Coimbra para celebrarem doze missas oficiadas, uma em cada mês, por D. Jorge e por si. O Livro das Kalendas não inclui nenhuma destas comemorações, que poderiam ter sido acrescentadas ao obituário, como em outros casos sucedeu. O livro dos aniversários dos bacharéis, porém, contém essas indicações, acompanhadas em alguns casos da localização dos túmulos de ambos os sufragados: o do tio bispo em campa rasa “so a capela do altar mor”, o do sobrinho no claustro41.
- 42 AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro de registos de aniversários, III-D, secção 1ª, estante (...)
- 43 AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro de registos de aniversários, III-D, secção 1ª, estante (...)
20Saltam também à vista certas entradas em letra diferente da original, que revelam como, em determinados dias, os bacharéis saíam com os seus moços de coro e com uma cruz para, na igreja do Salvador, bem próxima da Sé, celebrarem um aniversário por alma de João Gonçalves, prior de Serra ou Seira (a grafia varia), sendo indicadas as orações a rezar, bem como a saída com cruz e água benta enquanto diziam um responso sobre a sepultura do beneficiário, sita na capela de S. Lucas42. Da mesma forma, havia dias em que iam à igreja de Santiago, com os coreiros e os moços do coro e levando a cruz, para aí celebrar um aniversário com horas, todo cantado, pelas almas de Luís Peres Camelo, cónego da Sé, de seus pais e de seus parentes, devendo sair com a cruz e responso sobre a sua “cova”, situada na capela-mor daquela igreja, do lado do Evangelho43.
21As orações solicitadas para estes aniversários fora da catedral eram as seguintes: Omnipotens sempiterne Deus, Deus qui nos patrem et matrem, Fidelium Deus, Quaesumus Domine, Inclina Domine. Regressemos ao Livro das Kalendas e aos aniversários do mês de janeiro, que nos têm servido de referência. O quadro n.º 2 indica as orações a rezar nos sete únicos casos em que, nesse mês, são discriminadas. Apenas duas das referidas não estão presentes: Deus qui nos patrem et matrem e Inclina Domine. As restantes constam entre as mais pedidas, a par de uma outra, Deus qui inter apostolicos. Todas pertencem ao ofício de defuntos, à exceção de Salve sancta parens e Concede nos famulos tuos, que são preces à Virgem, demonstrando a devoção por parte de quem as pedia a Santa Maria, padroeira da catedral de Coimbra e principal intercessora junto de Deus.
Orações
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Nº registos
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Fidelium Deus
Deus qui inter apostolicos
Omnipotens sempiterne Deus
Quaesumus Domine
Deus cui proprium est
Deus venie largitor
Concede nos famulos tuos
Deus indulgenciarum
Deus qui perpetuum
Libera me Domine
Salve sancta parens
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4
3
3
3
2
2
1
1
1
1
1
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Quadro nº 2 – Orações pedidas nos registos do mês de janeiro do Livro das Kalendas
22Continuando a nossa análise exploratória, vejamos o que resulta da junção das informações de ambos os obituários, para obtermos uma imagem mais clara das cerimónias comemorativas dos defuntos que, de acordo com esses manuscritos, deviam ter lugar na Sé. O quadro nº 3 contém um resumo dos dados respeitantes aos primeiros dez dias do mês de janeiro constantes dos dois livros. As entradas em letra redonda correspondem ao Livro das Kalendas, estando em itálico as que pertencem ao obituário dos bacharéis.
Dia
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Tipo de cerimónia
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Por alma de
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Local de sepultura e outras informações
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1
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Comemoração
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Sendini
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Missa de requiem + responso
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Gonçalo Mendes de Vasconcelos, cavaleiro (†1307)
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Jaz na capela de S. Miguel, no claustro da Sé.
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Missa de Corpo de Deus
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Raimundo d’Ébrard, bispo
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3 aniversários
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Domingos Martins Cherinho (†1297) e pais
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Aniversário
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D. Maurano (†1297)
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Aniversário
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Afonso Peres da Guarda, mulher e filha
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Saem no claustro da Trindade e no cabido pela filha, à porta principal por ele.
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Aniversário
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Abade de S. Vicente
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2
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Missa de Sta. Maria enquanto viver, de requiem após a morte
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Martim Miguéis, mercador de Pedrógão (†1320) (e mulher, quando morrer)
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Institui capela perpétua para si e mulher.
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Aniversário
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João Gomes
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Saem no claustro ante a porta de Sta. Cecília sobre uma campa que tem um sino e uma espada.
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3
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Aniversário
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João Peres, presbítero, prior da igreja de Maçãs (?) (†1241)
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Aniversário com missa
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Fernando Peres, cónego
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Missa de Sta, Maria, de requiem após a morte
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Francisco Lourenço Mealha e mulher Margarida Eanes
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Deve fazer-se comemoração no coro depois da missa.
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Aniversário
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Pero Afonso e mulher
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Saem ante o altar de S. Sebastião.
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4
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Aniversário
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Elvira Fernandes (†1295)
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Aniversário
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Martim Pais, chantre (†1223)
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Missa de requiem
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Francisco Domingues, cónego e prior da Alcáçova [de Santarém]
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Missa de requiem
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Jean des Prez, bispo de Coimbra e depois de Castre
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Instituiu capela.
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Aniversário
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Afonso Fernandes
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5
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Aniversário
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Gonçalo Aires, presbítero (†1178)
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Jaz na parede do claustro.
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Aniversário
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Mendo, alvazil (†1301)
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Jaz na igreja de S. João.
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Aniversário
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Teresa Domingues (†1225), casada com Geraldo Peres
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Martim Peres Vivas (†1237), tio ou avô de Lourenço Afonso, cónego
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Jaz em monumento de pedra com seu sobrinho ou neto que foi cónego, sob arco em pedra a direito da porta “mediana”.
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Aniversário
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D. Estevainha (†1257), casada com Fernando Pardal
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Jaz com marido na nave do poço, em campa de pedra perto do poço.
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Aniversário
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Pedro Juliães, cónego
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Aniversário
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Vasco Eanes, tesoureiro da Sé
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Jaz no cruzeiro diante da capela de S. Martinho; hão de sair sobre a sepultura com cruz e água benta.
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6
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Aniversário
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Gonçalo Peres, reitor de Esgueira (†1231)
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Jaz na igreja de Santiago, de que foi cónego.
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Aniversário com missa de requiem
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Gil Fernandes, mestre-escola; inclui orações por 3 bispos e o irmão de outro bispo
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Devem sair com responsório com cruz, incenso e água benta sobre o sepulcro. Jaz no chão da igreja, perto da porta por onde se entra para o coro.
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Aniversário
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João Vicente, arcediago da Sé
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7
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Comemoração
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Godinho Pais e mulher Elvira Pais
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Ele jaz em Santa Cruz, ela no mosteiro dominicano de Coimbra.
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Aniversário
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D. Dinis, rei
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Aniversário instituído por D. Geraldo, bispo de Évora.
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Aniversário
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(ilegível)
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Noturno com … dos finados e missa de requiem
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Fernão Dias, sua mulher Clara Afonso, seu filho Pero Fernandes, cónego da Sé
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Devem sair para a igreja de Santiago, onde a missa será celebrada, e depois ir sobre a sua cova com cruz e água benta. Jaz junto do altar de Nossa Senhora da Piedade, numa campa com letreiro que diz “Aqui jaz Fernam Diaz”.
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8
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Aniversário
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João Mendes (†1198)
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Aniversário
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D. Boa (†1241), viúva de Rodrigo Origuiz, mãe do chantre Pedro Rodrigues
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Deixou dinheiro para o seu trigésimo e aniversário. Jaz perto da porta ocidental com o marido, em monumento mais alto dos que os restantes.
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Aniversário
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Lucas Peres (†1242)
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Aniversário
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Vasco Domingues, presbítero, cónego (†1299)
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Deixou diversos bens para aniversários e pitança. Doou paramentos e missal para uma capela. Jaz no claustro, na parede da nave de S. Miguel, em monumento com arco.
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Aniversário
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Afonso de Leca (?), clérigo e capelão da Sé, criado do cónego Fernando Afonso
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Deixou bens em prata para aniversários
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9
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Aniversário
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Pedro Fernandes, cónego (†1306)
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Fundou capela.
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Aniversário
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Fernando Peres, raçoeiro
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Aniversário
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Maria Antunes de Sobre Ripas
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Jaz no claustro, na nave do cabido, além da primeira coluna, onde estão pintados o sol e a lua.
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Aniversário
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João António, arcediago
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D. João, bispo de Lamego, e Francisco Eanes (?), cónego de Coimbra, e pais deste
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Os bacharéis devem ir à igreja de S, Cristóvão para fazer este aniversário e ir sobre a sepultura do cónego com cruz e água benta.
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10
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Aniversário
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Vasco Martins, leigo (m. 1289), filho de Martim Domingues Carvalho.
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Mandou fazer 2 aniversários por ano. Jaz na igreja de Sta. Maria de Carvalho (dioc. Coimbra).
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Aniversário
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D. Raimundo, bispo
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Aniversário
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Fernão Peres, meio-cónego
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Quadro nº 3 – Comemorações dos mortos na Sé de Coimbra de 1 a 10 de janeiro, a partir dos obituários (em letra redonda, informações do Livro das Kalendas; em itálico, do livro de aniversários dos bacharéis)
23Os dados apresentados mostram que, nestes dez dias, se celebravam na Sé de Coimbra 44 cerimónias por alma de pessoas falecidas, uma média de um pouco mais de quatro aniversários por dia, variando o seu número entre dois e sete. Significativamente, essas pessoas não se repetem num e no outro obituário: os defuntos comemorados são sempre diferentes.
24O número de cerimónias indicadas no Livro das Kalendas é muito superior ao que apresenta o livro dos bacharéis, constituindo 73% do total, o que corresponde a entre uma e seis comemorações diárias, face a apenas um ou dois aniversários celebrados cada dia pelos bacharéis. As cerimónias são, em geral, designadas apenas como “aniversários”, havendo oito casos (um apenas no livro dos bacharéis) com indicações específicas sobre o tipo de missa a celebrar.
25As informações acerca da identidade dos mortos tendem também a ser mais completas no Livro das Kalendas, que, além de fornecer mais pormenores a respeito da sua inserção social, indica também, em 59% dos casos, a data em que morreram; esta não é referida em nenhum dos registos em análise do livro dos bacharéis. Já o local de sepultura é mais vezes indicado neste último, surgindo em metade dos casos, face a 37,5% dos registos do Livro das Kalendas.
26O tipo de cerimónia não é explicitado em 50% das inscrições do livro dos bacharéis, nem em 60% das constantes do Livro das Kalendas. Da mesma forma, pormenores sobre a forma como deviam decorrer as cerimónias só surgem duas vezes no Livro das Kalendas, mas estão presentes em metade das entradas do livro dos bacharéis.
27Ambos os livros incluem aniversários por alma de eclesiásticos e leigos, num número muito próximo no caso do Livro das Kalendas (13 aniversários por leigos, 14 por eclesiásticos), mas dando clara primazia aos membros do clero no caso do livro dos bacharéis, onde são o dobro dos leigos. Os aniversários por alma de mulheres, sem estarem ligados às comemorações dos maridos ou outros familiares, escasseiam, e nenhum consta das cerimónias previstas no obituário dos bacharéis.
28No que diz respeito aos locais de sepultura, o espaço da catedral é o mais comum em ambos os livros, sendo o claustro aquele que com maior frequência é indicado, mas havendo também quem tivesse sido enterrado dentro da igreja ou no seu exterior. Refiram-se ainda diversos casos em que a sepultura se situa num outro templo, por vezes fora de Coimbra; e recorde-se que o livro dos bacharéis, como dissemos, inclui situações em que estes clérigos se deslocavam a outras igrejas da cidade para satisfazer os pedidos de aniversário.
29A panorâmica que se obtém da curta amostragem que levámos a cabo neste trabalho demonstra bem a importância de que o estudo destes dois obituários se reveste para o conhecimento das cerimónias de comemoração dos defuntos na Idade Média na Sé de Coimbra. Mostra-nos também como se ganha em fazer esse estudo de forma conjunta, associando as informações de cada um dos manuscritos, e analisando-as em diversas perspetivas. Algumas dessas perspetivas foram aqui indicadas, tal como foram assinaladas várias perguntas às quais estas fontes não nos permitem responder.
30Um primeiro passo para realizar o estudo destas cerimónias será, naturalmente, levar a cabo a edição do obituário dos bacharéis, que esperamos poder realizar a breve trecho, assim como proceder a uma análise aprofundada das suas três versões. A ausência de datas nas inscrições deste livro de aniversários é um problema que só o cruzamento de diversas fontes e a análise das grafias permitirá em parte colmatar, mas que vale a pena intentar.
- 44 Sabemos estar em curso uma nova edição, a ser levada a cabo por Leontina Ventura, que esperamos vir (...)
31Necessário se torna, também, compulsar o Livro das Kalendas a partir do manuscrito, e não apenas com base na edição existente, que não se presta plenamente ao estudo que desejamos fazer, por não incluir, por exemplo, as notas marginais, nem indicar as diferentes mãos que o escreveram, o que muita falta faz para compreender a orgânica do manuscrito e as diferentes épocas em que foi acrescentado44.
- 45 LEMAÎTRE, Jean-Loup – "Un livre vivant, l’obituaire". In GLÉNISSON, Jean (dir.) – Le livre au Moyen (...)
32Os obituários são “livros vivos”, na feliz e certeira expressão de Jean-Loup Lemaître45. São-no por terem continuado a ser acrescentados e até copiados ao longo dos séculos. São-no também por servirem de repositório da memória dos que faleceram e das cerimónias de sufrágio que instituíram. No caso da catedral de Coimbra, temos a sorte de possuir dois destes livros, que nas suas diferenças se complementam, esclarecendo-nos sobre o modo como se praticava, nessa igreja, a intercessão pelas almas dos homens e mulheres que referem para cada dia do calendário.
33Estes manuscritos mantiveram viva a memória desses indivíduos, não apenas enquanto os seus nomes foram invocados nas orações do clero da catedral (quando terão deixado de ser é outra questão a explorar), mas também na atualidade, por permitirem que, séculos volvidos, os historiadores os resgatem do esquecimento em que, entretanto, caíram. Com os seus nomes, recuperamos também laços familiares ou de solidariedade, descobrimos patrimónios e devoções, aproximamo-nos da relação que tinham com o final da vida humana e a esperança de que esta continuasse no Além.
- 46 Como guia para esse estudo, poderemos utilizar o recentíssimo trabalho de Maria Amélia Álvaro de Ca (...)
34A partir, pois, de registos que falam de morte, é possível conhecer múltiplas facetas das vidas desses homens e mulheres medievais que fizeram inscrever os seus nomes nos obituários da Sé de Coimbra. Depois deste trabalho exploratório, é a esse estudo que nos iremos abalançar46.
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Bibliografia
Fontes
Fontes Manuscritas
Lisboa, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Colegiada de Sta. Cruz do Castelo de Lisboa, m. 1, n. 25.
Lisboa, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, liv. 5.
Lisboa, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Ordem de Cister, Mosteiro de Santa Maria de Celas, mç.13.
Lisboa, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Ordem de Cister, Mosteiro de Lorvão, livro 319.
Coimbra, Arquivo da Universidade de Coimbra, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro de registos de aniversários, III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, n. 85, n. 90.
Coimbra, Arquivo da Universidade de Coimbra, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro dos aniversários dos capelães da Sé, depósito III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, n. 84.
Coimbra, Arquivo da Universidade de Coimbra, Pergaminhos da Sé de Coimbra, Móv. 7, G. 4, n. 43.
Coimbra, Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, Reservados, manuscrito n. 1092.
Fontes Impressas
CAMPOS, Maria Amélia Álvaro de – A comemoração dos mortos no calendário dos vivos. O obituário medieval da colegiada de São Bartolomeu de Coimbra. Edição crítica e estudo do manuscrito. Coimbra: IUC, 2020. Disponível em https://estudogeral.uc.pt/handle/10316/89491.
DAVID, Pierre; SOARES, Torquato de Sousa (eds.) – Liber Anniversariorum Ecclesiae Cathedralis Colimbriensis (Livro das Kalendas). 2 vols. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1947-1948.
MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa (coord.) – Testamenta Ecclesiae Portugaliae (1071-1325). Lisboa: CEHR-UCP, 2010.
PAIVA, José Pedro (coord.) – Portugaliae Monumenta Misericordiarum. Vol. 2: Antes da fundação das misericórdias. Lisboa: União das Misericórdias Portuguesas, 2002.
SANTOS, Maria José Azevedo – Um obituário do mosteiro de S. Vicente de Fora. A comemoração dos que passaram deste mundo. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 2008.
SANTOS, Maria José Azevedo – “Un libro de aniversarios de la colegiata de Santiago de Coímbra. Contribución al estudio del culto del Apóstol en la Edad Media”. Ad Limina. 9 (2018), pp. 185-224.
Estudos
BAUD, Anne; TARDIEU, Joëlle (dirs.) – Organiser l’espace sacré au Moyen Âge: topographie, architecture et liturgie (Rhône-Alpes - Auvergne). Lyon: Alpara, 2014, p. 98. Disponível em http://books.openedition.org/alpara/3811.
CAMPOS, Maria Amélia Álvaro de – “Death commemoration strategies in Medieval Portugal: A mirror of lay participation in religious parochial life (the case of Coimbra)”. Religions 14: 1443 (2023). Disponível em https://doi.org/10.3390/rel14121443.
CAMPOS, Maria Amélia Álvaro de – A comemoração dos mortos no calendário dos vivos. O obituário medieval da colegiada de São Bartolomeu de Coimbra. Edição crítica e estudo do manuscrito. Coimbra: IUC, 2020. Disponível em https://estudogeral.uc.pt/handle/10316/89491.
COUTINHO, José Eduardo Reis – “Introdução geral ao Liber Anniversariorum Ecclesiae Cathedralis Colimbriensis (Livro das Kalendas)”. Humanitas 58 (1998), pp. 419-436.
DAVID, Pierre – “Français du Midi dans les évêchés portugais (1279-1390)”. Sep. Bulletin des Études Portugaises, 1943. Lisboa: [s.n.], 1944.
ESQUIEU, Yves (dir.) – Viviers, cité épiscopale: études archéologiques. Lyon: Alpara, 1988. Disponível em http://books.openedition.org/alpara/1508.
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GOMES, Saul António – “A assinatura do rei D. Dinis: observações para o estudo da chancelaria real portuguesa medieval”. Fragmenta Historica 7 (2019). Disponível em https://run.unl.pt/handle/10362/117904.
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MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – “Geraldo Peres, cónego da Sé de Coimbra no século XIV”. Revista Portuguesa de História 31:1 (1996), pp. 393-430.
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MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – “La famille d’Ébrard et le clergé de Coïmbra aux XIIIe et XIVe siècles”. In A Igreja e o clero português no contexto europeu. Colóquio Internacional. Lisboa: CEHR, 2005, pp. 77-91.
MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – A Sé de Coimbra: a instituição e a chancelaria (1080-1318). Lisboa: FCG/FCT, 2010.
NORTE, Armando – Letrados e cultura letrada em Portugal (sécs. XII e XIII). Vol. 2: Anexos. Lisboa: Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2013. Tese de doutoramento.
RODRIGUES, Ana Maria S. A. – “A comemoração dos defuntos nos finais da Idade Média”. In RODRIGUES, Ana Maria S. A.; FERREIRA, Manuel Pedro (coord.) – A catedral de Braga: arte, liturgia e música dos fins do século XI à época tridentina. Lisboa: Arte das Musas / CESEM, 2009, pp. 136-147.
SILVA, André – Físicos e cirurgiões medievais: contextos socioculturais, práticas e transmissão de conhecimentos (1192-1340). Porto: CITCEM, 2016.
TABBAGH, Vincent – “Une lecture des obituaires de quelques cathédrales de France septentrionale, XIIe-XVe siècle”. Le Moyen Âge 124 (2018), pp. 553-580.
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Notas
DAVID, Pierre; SOARES, Torquato de Sousa (eds.) – Liber Anniversariorum Ecclesiae Cathedralis Colimbriensis (Livro das Kalendas). 2 vols. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1947-1948.
COUTINHO, José Eduardo Reis – “Introdução geral ao Liber Anniversariorum Ecclesiae Cathedralis Colimbriensis (Livro das Kalendas)”. Humanitas 58 (1998), pp. 419-436.
A realização de cópias e de atualizações dos obituários era um fenómeno muito comum; veja-se a este propósito TABBAGH, Vincent – “Une lecture des obituaires de quelques cathédrales de France septentrionale, XIIe-XVe siècle”. Le Moyen Âge. 124/3 (2018), pp. 553-580, que refere vários exemplos da multiplicação deste tipo de manuscritos.
ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4.
ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5.
BGUC, Reservados, manuscrito nº 1092.
ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fl. 111, segundo registo da primeira coluna.
ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fl. 111, registo com letra diferente que ocupa a maior parte da segunda coluna.
ANTT, Colegiada de Sta. Cruz do Castelo de Lisboa, m. 1, nº 25, de 1313 julho, 28, Lisboa, Agradecemos ao nosso colega e amigo Mário Farelo esta informação.
Como sucede, por exemplo, a 6 dos idos de janeiro (fls. 4-4v), 6 dos idos de março (fls. 34-34v), 5 dos idos de março (fls. 35-35v), 6 das calendas de abril (fls. 43v-44), 16 das calendas de maio (fls. 54-56, com a particularidade de a primeira página ter ficado por preencher) ou 10 das calendas de maio (fls. 59-59v).
Veja-se, a título de exemplo, 7 e 8 dos idos de outubro (fl. 137), 6 e 5 dos idos do mesmo mês (fl. 137v), idos de outubro e 17 das calendas de novembro (fl. 140), 14 e 13 das calendas de novembro (fl. 141v), 3 e 2 das nonas de novembro (fl. 149).
Vejam-se, a título de exemplo, os obituários de duas colegiadas de Coimbra: o de S. Bartolomeu, publicado por CAMPOS, Maria Amélia Álvaro de – A comemoração dos mortos no calendário dos vivos. O obituário medieval da colegiada de São Bartolomeu de Coimbra. Edição crítica e estudo do manuscrito. Coimbra: IUC, 2020, e o de Santiago, publicado por SANTOS, Maria José Azevedo – “Un libro de aniversarios de la colegiata de Santiago de Coímbra. Contribución al estudio del culto del Apóstol en la Edad Media”. Ad Limina 9 (2018), pp. 185-224. Ambos possuem esse tipo de informações acerca de cada mês, que não existem no Livro das Kalendas nem no obituário do mosteiro de S. Vicente de Fora, publicado também por SANTOS, Maria José Azevedo – Um obituário do mosteiro de S. Vicente de Fora. A comemoração dos que passaram deste mundo. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 2008.
Todos estes elementos estão presentes nos obituários das duas colegiadas de Coimbra citadas na nota anterior.
Trata-se de Afonso Martins, que, além de vice-chanceler do rei D. Dinis, era também cónego das Sés de Lisboa e de Viseu e prior de Povos. Cf. GOMES, Saul António – “A assinatura do rei D. Dinis: observações para o estudo da chancelaria real portuguesa medieval”. Fragmenta Historica 7 (2019), pp. 13-35, na nota 17, p. 17 (disponível em https://run.unl.pt/handle/10362/117904).
Uma pública-forma das cláusulas respeitantes à Sé de Coimbra do testamento desta senhora, datada de 1328 outubro, 7, foi publicada em MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – Um mosteiro cisterciense feminino: Santa Maria de Celas (séculos XIII a XV). Coimbra: BGUC, 2001, doc. nº 175, pp. 423-424.
Sabemos que outros espaços claustrais, tanto de catedrais como de mosteiros, receberam sepultamentos de leigos, incluindo mulheres, ao longo da Idade Média. Cf. BAUD, Anne; TARDIEU, Joëlle (dirs.) – Organiser l’espace sacré au Moyen Âge: topographie, architecture et liturgie (Rhône-Alpes – Auvergne). Lyon: Alpara, 2014, p. 98 (disponível em http://books.openedition.org/alpara/3811); ESQUIEU, Yves (dir.) – Viviers, cité épiscopale: études archéologiques. Lyon: Alpara, 1988 (disponível em http://books.openedition.org/alpara/1508).
A este respeito ver RODRIGUES, Ana Maria S. A. – “A comemoração dos defuntos nos finais da Idade Média”. In RODRIGUES, Ana Maria S. A.; FERREIRA, Manuel Pedro (coord.) – A catedral de Braga: arte, liturgia e música dos fins do século XI à época tridentina. Lisboa: Arte das Musas / CESEM, 2009, pp. 136-147.
A título de exemplo, refira-se a planta que existe para o mosteiro de Celas, onde estão assinalados os enterramentos na igreja do mosteiro entre 1591 e 1771 (ANTT, Ordem de Cister, Mosteiro de Santa Maria de Celas, m. 13, nº 7); ou as informações preciosas do livro dos óbitos da Época Moderna do mosteiro de Lorvão, que refere o local exato das sepulturas de cada freira (ANTT, Ordem de Cister, Mosteiro de Lorvão, livro 319).
Cf. RODRIGUES, Ana Maria S. A. – “A comemoração dos defuntos”, p. 139.
ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fl. 1, calendas de janeiro (este dia falta no manuscrito medieval). Sobre este bispo, ver, por todos, MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – “La famille d’Ébrard et le clergé de Coïmbra aux XIIIe et XIVe siècles”. In A Igreja e o clero português no contexto europeu. Colóquio Internacional. Lisboa: CEHR, 2005, pp. 77-91.
Trata-se de mestre Gonçalo Lever, físico de D. Dinis (ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fl. 11, referente ao dia 3 dos idos de janeiro). Este médico era também cónego de Coimbra, prior da igreja de S. Martinho de Montemor-o-Velho e exerceu o cargo de capelão da rainha. Ver NORTE, Armando – Letrados e cultura letrada em Portugal (sécs. XII e XIII). Vol. 2: Anexos. Tese de doutoramento apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2013, pp. 117-119 e SILVA, André – Físicos e cirurgiões medievais: contextos socioculturais, práticas e transmissão de conhecimentos (1192-1340). Porto: CITCEM, 2016, pp. 141. O seu testamento foi publicado em MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa (coord.) – Testamenta Ecclesiae Portugaliae (1071-1325). Lisboa: CEHR-UCP, 2010, doc. nº 2.46, pp. 394-398.
Missa celebrada por alma de Afonso Peres de Ganata, a 10 das calendas de fevereiro (ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fl. 12).
Mandada celebrar por Fernando Gil, cónego da Sé de Coimbra, a 17 das calendas de fevereiro (ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fl. 8v).
Assim devia suceder no caso das missas por alma de Martim Miguéis, mercador de Pedrógão (ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fl. 6, referente a 4 das nonas de janeiro); de Francisco Lourenço Mealha e de sua mulher Margarida Eanes, leigos (idem, fl. 6v, referente a 3 das nonas de janeiro); dos irmãos Beltrão e Guilherme de Crégol (idem, fl. 18, referente a 6 das calendas de fevereiro); e do cónego de Coimbra Guocius, natural da Lombardia (idem, fl. 19, referente a 4 das calendas de fevereiro).
Essa pitança seria oferecida a 8 de janeiro, data da morte de Vasco Domingues, que deixou dez libras para esse fim (ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fls. 9-9v, a 6 dos idos de janeiro). O testamento deste cónego, elaborado a 28 de dezembro de 1298, encontra-se publicado em MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa (coord.) – Testamenta, doc. nº 2.40, pp. 364-372; o seu epitáfio mantém‑se até hoje embutido na parede do claustro da Sé, onde pediu para ser sepultado (ver a sua reprodução na mesma obra, p. 365).
O referido Vasco Domingues deixou dez libras para esse fim, e Martim Miguéis, o mencionado mercador de Pedrógão, deixou três. Na missa instituída por Jean des Prez, bispo de Coimbra absentista entre 1333 e 1337, que criou na catedral uma capela para serem celebrados aniversários por sua alma, distribuir-se-iam quatro libras pelos presentes (ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fl. 3, de 2 das nonas de janeiro). Em outros casos não se especifica o montante a dar, apenas se estabelece que o que restar dos rendimentos dos bens deixados para sustentar as comemorações será usado para esse fim, como sucede, por exemplo, na missa por alma do físico de D. Dinis (ver nota 22).
Sobre estas missas realizadas no terceiro, no sétimo e no trigésimo dia, ver RODRIGUES, Ana Maria S. A. – “A comemoração dos defuntos”, p. 139.
ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fls. 14-14v, no dia 6 das calendas de fevereiro.
ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 5, fl. 9v, no dia 15 das calendas de fevereiro.
ANTT, Cabido da Sé de Coimbra, liv. 4, fl. 14. A carta data de 4 ou 5 de julho de 1316 (apenas se leem as duas primeiras letras do numeral, qu, que podem ser de quarto ou quinto) e foi outorgada em Lisboa pelo bispo, tendo sido ratificada pelo deão e pelo cabido em Coimbra a 15 do mesmo mês; a cópia no obituário é uma pública-forma, autenticada pelo sinal do tabelião de Coimbra Pedro Beltranês, com data de 1422 ou 1460 (pela forma como está indicado, o ano tanto pode ser da Era hispânica como da cristã), junho, 22, Coimbra.
Assim foi estipulado nos estatutos dados ao cabido da Sé de Coimbra em 1229 pelo cardeal de Sabina João de Abbeville; cf. MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – A Sé de Coimbra: a instituição e a chancelaria (1080-1318). Lisboa: FCG/FCT, 2010, p. 209.
Ver MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – A Sé de Coimbra, pp. 247-248 e GOMES, Saul António – “A solidariedade eclesial na promoção de escolares pobres a estudos universitários. O exemplo coimbrão nos séculos XIV e XV”. In Universidade(s): história, memória, perspectivas. Actas do Congresso História da Universidade. 7º Centenário. Vol. 4. Coimbra: Comissão Organizadora do Congresso "História da Universidade", 1991, pp. 195-234, que publica o compromisso da confraria dos bacharéis nas pp. 219-223. Esse compromisso encontra-se também publicado em PAIVA, José Pedro (coord.) – Portugaliae Monumenta Misericordiarum. Vol. 2: Antes da fundação das misericórdias. Lisboa: União das Misericórdias Portuguesas, 2002, pp. 323-326, doc. 177.
DAVID, Pierre – Français du Midi dans les évêchés portugais (1279-1390). Sep. Bulletin des Études Portugaises, 1943. Lisboa: [s.n.], 1944, p. 24.
Arquivo da Universidade de Coimbra (= AUC), Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro de registos de aniversários, III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, nº 85. Para a datação proposta aponta o tipo de grafia utilizada. Uma cronologia mais precisa está dependente do estudo aprofundado do manuscrito e das mãos que o escreveram.
AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro dos registos dos aniversários “Confraria dos bacharéis da Sé”, depósito III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, nº 90.
AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro dos registos dos aniversários “Confraria dos bacharéis da Sé”, depósito III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, nº 90, fls. 3-6.
AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro dos aniversários dos capelães da Sé, depósito III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, nº 84.
A este respeito, veja-se a clara explicação dada por CAMPOS, Maria Amélia Álvaro de – A comemoração dos mortos, pp. 34-35, que indica bibliografia específica acerca dos calendários medievais.
Este cónego foi estudado em MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – “Geraldo Peres, cónego da Sé de Coimbra no século XIV”. Revista Portuguesa de História 31:1 (1996), pp. 393-430,
AUC, Pergaminhos da Sé de Coimbra, Móv.7, G.4, nº 43, de 31 de outubro de 1399, Coimbra (na casa de Geraldo Peres). Cf. MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – “Geraldo Peres”, pp. 412-414.
Ver, por exemplo, AUC, Livro de registos de aniversários, III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, nº 85, fls. 6, 7, 8v, 12v, 15v (que indica a localização das sepulturas de ambos), 18 (idem), 20v, 23, 31, 33, 48, 52v (idem), 57, 61v, 64.
AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro de registos de aniversários, III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, nº 85, fls. 5v, 13, 20, 23, 25v, 30, 37, 40v.
AUC, Cabido e Mitra da Sé de Coimbra, Livro de registos de aniversários, III-D, secção 1ª, estante 5, tabela 3, nº 85, fls. 33v, 35.
Sabemos estar em curso uma nova edição, a ser levada a cabo por Leontina Ventura, que esperamos vir a elucidar muitos destes aspetos.
LEMAÎTRE, Jean-Loup – "Un livre vivant, l’obituaire". In GLÉNISSON, Jean (dir.) – Le livre au Moyen Âge. Turnhout: Brepols, 1988, pp. 92-94.
Como guia para esse estudo, poderemos utilizar o recentíssimo trabalho de Maria Amélia Álvaro de Campos acerca da comemoração dos mortos em três paróquias de Coimbra medieval, que é modelar na sua abordagem aos obituários de duas das igrejas analisadas: CAMPOS, Maria Amélia Álvaro de – “Death commemoration strategies in Medieval Portugal: A mirror of lay participation in religious parochial life (the case of Coimbra)”. Religions. 14: 1443 (2023). https://doi.org/10.3390/rel14121443 .
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