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Ensaios fotográficos

Intervenções artísticas na cidade de Criciúma: resistências estético-políticas

Artistic interventions in the city of Criciúma: aesthetic-political resistance
Mario Ricardo Guadagnin e Viviane Kraieski de Assunção

Notas da redacção

Versão original recebida em / Original version 16/02/2023

Aceito em / Accepted 30/06/2023

Texto integral

1A ideia de que Criciúma é uma cidade conservadora é largamente aceita no município. Assim como nos demais municípios do sul do Estado de Santa Catarina, em Criciúma, Jair Bolsonaro recebeu os votos da ampla maioria nas eleições presidenciais de 2018 e 2022, com percentuais acima de 80% e 70% dos votos válidos no segundo turno, respectivamente (Santa Catarina, 2018; 2022). As ações dos políticos locais também se coadunam com os discursos e práticas da extrema direita. Em agosto de 2021, um professor temporário de Artes da rede municipal foi demitido pelo prefeito por exibir, durante a aula para o nono ano do Ensino Fundamental, o clipe “Etérea”, do cantor Criolo, com temática LGBTQIA+, sob a acusação de promover conteúdo "erotizado" e a "viadagem na sala de aula", nas palavras do político (Borges; Rodrigues, 2021).

2Esta atenção à hegemonia do conservadorismo no tempo presente, no entanto, silencia uma história de lutas e resistências. O município conhecido como “cidade nacional do carvão” também foi, durante a ditadura militar, cunhado de “Cuba brasileira”, pela atuação combativa dos sindicatos dos mineiros contra o regime autoritário (Modolon, 2013). Foi ainda palco de intensas greves organizadas ao longo das décadas por melhores salários e condições de trabalho (Miranda, 2013).

  • 1 Faz-se referência aqui às reflexões de Conceição Evaristo (2021), sobre a necessidade de problemati (...)

3Procurando visibilizar práticas e tornar audíveis1 vozes dissonantes do discurso conservador, foi realizada uma etnografia pelas ruas de Criciúma entre os anos de 2018 e 2022. Afastando-se da compreensão de que a cidade pode ser vista como uma configuração socioespacial homogênea, compreende-se que sua constituição é permeada por tensões, que emergem das - e causam repercussões nas - dimensões simbólica e estética (Campos; Abalos Júnior; Meirinho, 2021). Assim, a estética surge associada ao exercício da política no espaço urbano, marcado por dissensos e práticas de resistência.

4Percorrendo as ruas a pé e de bicicleta, os pesquisadores depararam-se com imagens estampadas em muros, postes, telefones públicos, paredes e caixas de eletricidade, como grafites, cartazes, adesivos e stencils. Estas intervenções desvelam práticas de resistência como processos para além da oposição ao conservadorismo, pois podem ser compreendidas como parte de processos criativos, que apontam para outras formas de existência no espaço urbano. Assim, configuram modos de fazer cidade, nos quais os/as autores/as destas intervenções projetam seus desejos e idealizações sobre o espaço citadino (Agier, 2015).

5Durante a etnografia, nas caminhadas e pedaladas, a cidade foi se constituindo por meio dos itinerários percorridos pelos pesquisadores (De Certeau, 1994), que identificaram as intervenções urbanas como práticas socioespaciais e estético-políticas. Estas intervenções contribuem para compreender o espaço público como fruto de relações múltiplas e dinâmicas entre sujeitos e o ambiente, que trazem a possibilidade de novas interações para além das relações sociais historicamente construídas. Neste sentido, enunciam a emergência de discursos contra o patriarcado, o fascismo, a desigualdade urbana e outras formas de opressão, que configuram modos de luta política que se diferem dos meios de atuação formal. Ainda que o serviço de limpeza urbana remova periodicamente estas produções, elas continuam sendo inseridas, mantendo atuante o movimento de indivíduos e coletivos.

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Igrejas cheias x Ruas vazias. Viviane Kraieski de Assunção (2022)

A revolução é a harmonia da forma… Viviane Kraieski de Assunção (2022)

A minoria mais perigosa são os ricos. Viviane Kraieski de Assunção (2022)

Eles nos querem como musas mas nos temem como artistas. Viviane Kraieski de Assunção (2022)

A cadela do fascismo está sempre no cio. Mário Ricardo Guadagnin (2019)

Gentrificação é o novo colonialismo. Mário Ricardo Guadagnin (2019)

Contra todo otimismo civilizatório. Mário Ricardo Guadagnin (2019)

O feminismo nunca matou ninguém… Mário Ricardo Guadagnin (2019)

Liberté, egalité, morte ao patriarcadé. Mário Ricardo Guadagnin (2019)

Cartazes arrancados por funcionários da limpeza pública. Mário Ricardo Guadagnin (2019)

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Bibliografia

AGIER, Michel. Do direito à cidade ao fazer-cidade: o antropólogo, a margem e o centro. Mana, Rio de Janeiro, Vol. 21, n. 3, 2015. Disponível em: https://www.scielo.br/j/mana/a/wJfG33S5nmwwjb344NF3s8s/abstract/?lang=pt. Acesso em: 08 fev. 2023

BORGES; Caroline; RODRIGUES, Poliana. Prefeito de Criciúma demite professor por exibir clipe de música de Criolo com temática LGBTQIA+ em aula de artes. G1 SC, NSC TV, 26 de agosto de 2021. Disponível em: https://g1.globo.com/sc/santa-catarina/noticia/2021/08/26/prefeito-de-criciuma-demite-professor-por-exibir-clipe-de-musica-de-criolo-em-sala-de-aula.ghtml. Acesso em: 8 fev. 2023

CAMPOS, R.; ABALOS JÚNIOR, J. L.; MEIRINHO, D. Olhares cruzados sobre arte, imagem e resistências urbanas. Iluminuras, Porto Alegre, v. 22, n. 56, 2021. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/iluminuras/article/view/115991. Acesso em: 10 fev. 2023.

DE CERTEAU, Michel. A invenção do cotidiano: 1. Artes de Fazer. Petrópolis: Vozes, 1994.

EVARISTO, Conceição. [Conferência] Clamar no deserto: entre o poder falar e o poder de se fazer ouvir. 26 jul. 2021. YouTube: Fazendo Gênero Canal 1. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=WimOFw-5gRU. Acesso em: 8 fev. 2023.

MODOLON, Morgana Vieira. A Ditadura Militar em Criciúma: aspectos da repressão e resistência. 62 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado e Licenciatura em História) Curso de História. Universidade do Extremo Sul Catarinense, 2013.

MIRANDA, Antônio Luiz. Trajetória e experiência do movimento operário sindical de Criciúma/SC: da ditadura militar à nova república. Tese (Doutorado em História) – Programa de Pós-Graduação em História. Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2013.

SANTA CATARINA. JUSTIÇA ELEITORAL DE SANTA CATARINA. Resultado de votação por município. 2018. Disponível em: https://apps.tre-sc.jus.br/site/fileadmin/arquivos/eleicoes/eleicoes2018/resultados_turno_2/resultado_municipio/TOT2018_CRICIUMA_ELE_FED.pdf. Acesso em: 8 fev. 2023.

SANTA CATARINA. JUSTIÇA ELEITORAL DE SANTA CATARINA. Eleição geral ordinária 2022. Votação nominal: Criciúma, SC. 2022. Disponível em: https://resultados.tse.jus.br/oficial/app/index.html#/divulga/votacao-nominal;e=545;cargo=1;uf=sc;mu=80896. Acesso em: 8 fev. 2023.

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Notas

1 Faz-se referência aqui às reflexões de Conceição Evaristo (2021), sobre a necessidade de problematizar, além do “poder falar”, direito historicamente negado a determinados sujeitos, o “poder de se fazer ouvir”.

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Índice das ilustrações

Créditos Igrejas cheias x Ruas vazias. Viviane Kraieski de Assunção (2022)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-1.jpg
Ficheiro image/jpeg, 422k
Créditos A revolução é a harmonia da forma… Viviane Kraieski de Assunção (2022)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-2.jpg
Ficheiro image/jpeg, 602k
Créditos A minoria mais perigosa são os ricos. Viviane Kraieski de Assunção (2022)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-3.jpg
Ficheiro image/jpeg, 418k
Créditos Eles nos querem como musas mas nos temem como artistas. Viviane Kraieski de Assunção (2022)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-4.jpg
Ficheiro image/jpeg, 508k
Créditos A cadela do fascismo está sempre no cio. Mário Ricardo Guadagnin (2019)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-5.jpg
Ficheiro image/jpeg, 462k
Créditos Gentrificação é o novo colonialismo. Mário Ricardo Guadagnin (2019)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-6.jpg
Ficheiro image/jpeg, 440k
Créditos Contra todo otimismo civilizatório. Mário Ricardo Guadagnin (2019)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-7.jpg
Ficheiro image/jpeg, 645k
Créditos O feminismo nunca matou ninguém… Mário Ricardo Guadagnin (2019)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-8.jpg
Ficheiro image/jpeg, 429k
Créditos Liberté, egalité, morte ao patriarcadé. Mário Ricardo Guadagnin (2019)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-9.jpg
Ficheiro image/jpeg, 481k
Créditos Cartazes arrancados por funcionários da limpeza pública. Mário Ricardo Guadagnin (2019)
URL http://journals.openedition.org/pontourbe/docannexe/image/14748/img-10.png
Ficheiro image/png, 4,3M
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Para citar este artigo

Referência eletrónica

Mario Ricardo Guadagnin e Viviane Kraieski de Assunção, «Intervenções artísticas na cidade de Criciúma: resistências estético-políticas»Ponto Urbe [Online], 31 | 2023, posto online no dia 25 julho 2023, consultado o 02 dezembro 2023. URL: http://journals.openedition.org/pontourbe/14748; DOI: https://doi.org/10.4000/pontourbe.14748

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Autores

Mario Ricardo Guadagnin

Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da Universidade do Extremo Sul Catarinense

E-mail: mrguadagnin@gmail.com

ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6882-0636

Viviane Kraieski de Assunção

Professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da Universidade do Extremo Sul Catarinense. Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina

E-mail: vivianekraieski@gmail.com

ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0118-2486

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