Introdução

1O património olivícola é um elemento central do mediterrânico, determinando a dinâmica socioeconómica e cultural, bem como as características ambientais e paisagísticas de muitas regiões. Este património é constituído por um conjunto de elementos comuns que consistem em paisagens, saberes tradicionais, festas, práticas e instrumentos agrícolas, produtos gastronómicos associados, saúde e bem-estar, entre outros.

2Todos estes elementos têm sido cada vez mais valorizados do ponto de vista turístico. Por um lado, "à medida que a economia da experiência amadurece, os consumidores desejam experiências mais autênticas e reais em vez de experiências falsas e fabricadas" (Yeoman, 2008, p. 40), e do ponto de vista turístico, os consumidores apreciam cada vez mais as experiências longe dos destinos de massas, valorizando a sustentabilidade, a genuinidade dos produtos e serviços e os estilos de vida saudáveis (WTTC e Trip.com Group, 2021). Por outro lado, a oferta turística assente no património olivícola reage criando experiências que envolvem a paisagem e o ambiente rural dos olivais e da sua envolvente, o contacto com os saberes tradicionais da cultura olivícola, as provas de azeite e a degustação de pratos gastronómicos, as experiências de saúde e bem-estar com recurso ao azeite e à cosmética à base de azeite.

3É importante esclarecer que as experiências turísticas que englobam a olivicultura e todo o património relacionado com a produção, consumo de azeite e produtos à base de azeite têm assumido diferentes terminologias, entre os investigadores: olivoturismo (Bezerra e Correia, 2018; Alonso e Northcote, 2010), turismo de azeite e oleoturismo (abril-Sellarés e Tello, 2019; Millán et al, 2014; Murgado, 2013; Tregua et al., 2018) e, por fim, o agroturismo de base olivícola (Pulido-Fernández et al., 2019). Neste estudo utilizamos o termo "olivoturismo" que consideramos ser o mais abrangente.

4Este estudo faz parte do projeto europeu Olive4All - "Olive Heritage for Sustainable Development: Raising Community Awareness of Living Heritage" e tem como objetivo reforçar o conhecimento sobre o olivoturismo, focando-se naquelas que poderão ser as principais motivações da procura para usufruir de experiências e atividades baseadas no património olivícola. Com base na revisão da literatura, que permitiu identificar, para o olivoturismo, o conjunto comum de atividades, experiências e motivações inerentes, pretende-se recolher informação sobre aquelas que serão mais importantes para o desenvolvimento daquele tipo de turismo. De igual modo, pretende-se perceber como é percecionado o nível de complementaridade entre o olivoturismo e outros tipos de turismo.

5Do ponto de vista metodológico, a opção utilizada neste estudo incorpora a abordagem centrada nas pessoas, com foco nos significados do património (Smith, 2011), defendida no projeto Olive4All. Por outro lado, tratando-se de um tema pouco investigado pela comunidade científica em Portugal - e pouco explorado pela indústria do turismo neste país - considerou-se fundamental recorrer ao método Delphi para reunir a opinião de um painel de especialistas na área do turismo, da olivicultura e do património olivícola. Este método é particularmente adequado para contextos em que se pretende compreender melhor um determinado tema, assumindo-se também como uma ferramenta eficaz para a previsão de um determinado setor (Yoopetch et al., 2023), para a previsão da procura (turística) ou de tendências futuras/condições de mercado (Lin e Song, 2015) ou para a aprendizagem sobre contextos ou fenómenos económicos complexos e/ou pouco conhecidos (Guttentag e Smith, 2014).

6Devido ao tema central deste estudo, à metodologia utilizada e ao facto de se centrar no conhecimento de especialistas portugueses, este estudo reveste-se de importante relevância, podendo os resultados obtidos contribuir para a forma como os territórios devem otimizar os seus recursos associados à olivicultura e ao património olivícola, de modo a responder eficazmente às motivações dos consumidores/turistas e estimular a procura. Em termos de estrutura, o estudo inclui uma revisão da literatura que explora o conceito de olivoturismo e a diversidade de atividades que envolve, a sua complementaridade com outros produtos turísticos e as motivações turísticas baseadas no olivoturismo. Segue-se uma explicação da utilização do método Delphi, a apresentação e discussão dos resultados dos dois conjuntos de questões e uma reflexão final.

I. Revisão da Literatura

A. Atividades de Olivoturismo

7O olivoturismo é constituído por um conjunto de atividades que abrangem diversas áreas, umas mais orientadas para a natureza - usufruindo da paisagem, do silêncio e da biodiversidade, visitando olivais centenários ou milenares (Alonso e Northcote, 2010; Murgado, 2013; Millán-Vázquez de la Torre et al, 2017), outras orientadas para o património edificado e histórico através de visitas a lagares de azeite, museus de azeite e centros de interpretação (Alonso e Northcote, 2010; Murgado, 2013; Millán-Vázquez de la Torre et al., 2017). Para além destas, podem ainda ser incluídas experiências mais sensoriais como a degustação de azeite e a degustação de pratos típicos onde o azeite é o principal elemento gastronómico (Campón-Cerro et al., 2014; Tudisca et al., 2015; Millán-Vázquez de la Torre et al., 2017). O olivoturismo tem também uma dimensão educativa e criativa, sendo propício à organização de workshops que exploram várias dimensões do património olivícola, à realização de experiências de aprendizagem culinária utilizando o azeite como ingrediente principal (Hernández-Mogollón et al., 2019; Murgado, 2013; Millán-Vázquez de la Torre et al., 2017), ou mesmo experiências de preparação de cosméticos à base de azeite (Campón-Cerro et al., 2014). A lista de possibilidades inclui ainda um conjunto de experiências mais ativas, envolvendo a participação em tarefas agrícolas como a apanha da azeitona (Tudisca et al., 2015) ou a realização de percursos pedestres por olivais ou pelo património associado aos lagares (Alonso e Northcote, 2010) ou, inversamente, experiências de relaxamento e bem-estar através de tratamentos à base de azeite (Ferreira e Martín, 2021). Por fim, o olivoturismo pode incluir a participação em eventos gastronómicos dedicados ao azeite, a compra de produtos de azeitona diretamente ao produtor, visitas a lojas especializadas em azeite para conhecer a variedade de produtos de azeitona e as suas marcas (Bezerra e Correia, 2018; Murgado, 2013; Vázquez de la Torre et al., 2017), bem como a possibilidade de patrocinar oliveiras centenárias ou milenares (Nguyen, 2018).

B. Sinergias entre o olivoturismo e outros produtos turísticos

8Na última década, o olivoturismo captou grande interesse dos académicos, com várias publicações teóricas e empíricas. Os primeiros estudos foram realizados na Austrália (Alonso e Northcote, 2010; Northcote e Alonso, 2011) e mais tarde alargados à Europa. A literatura é escassa, fragmentada e até repetitiva, sendo na sua maioria muito focada no território espanhol (abril-Sellarés e Tello, 2019; Orgaz-Agüera et al., 2018; de Salvo et al., 2013; Folgado-Fernández et al, 2019; Millán et al., 2014; Millán e Pérez, 2014; Millán et al., 2017; Moral-Cuadra et al., 2020; Pulido-Fernández et al., 2019; Tregua et al., 2018; Vázquez de la Torre et al., 2017). O olivoturismo é definido como um conjunto de atividades que giram em torno da azeitona, do azeite, da oliveira e do património inerente (Folgado-Fernández et al., 2019). Para Oplanić, Čop e Čehić (2020) este segmento turístico não oferece apenas um conjunto de atividades, mas experiências, sensações e emoções baseadas no azeite e nas condições específicas das regiões olivícolas. Şahin e Aydin (2017) definem ainda que o olivoturismo é uma forma de turismo que estabelece uma profusão de ligações entre a cultura, a natureza e a gastronomia.

9Uma diversidade de perspetivas tem sido utilizada para estudar o olivoturismo. Pulido-Fernández et al.(2019) procuram estruturar os principais contributos dos académicos sobre as sinergias entre o turismo olivícola e outros segmentos turísticos: gastronómico, industrial, rural e cultural. De acordo com a literatura, o azeite é um recurso estratégico devido ao seu valor gastronómico, social e cultural (de Salvo et al., 2013; Hernández-Mogollón et al., 2019). A gastronomia é um recurso turístico fundamental, pois permite a integração do turista na cultura local (Pulido-Fernández et al., 2019). Os produtos endógenos, vernaculares, contêm e transmitem a cultura dos seus artesãos, os locais, atuando como guardiões das tradições e da identidade de um território e daqueles que o habitam, constituindo um veículo excecional de intercâmbio cultural (Millán-Vázquez de la Torre et al., 2017). Assim, a gastronomia é considerada um dos principais pilares de apoio às atividades de olivoturismo em meio rural (Pulido-Fernández et al., 2019). De facto, a prática do olivoturismo surgiu como uma prática semelhante ao enoturismo. As semelhanças entre o enoturismo e o olivoturismo são notórias, uma vez que tanto o olivoturismo como o enoturismo estão orientados para o conhecimento do território de acolhimento, aproximando os turistas da natureza e descobrindo as tradições rurais e agrícolas (Marchini et al., 2016).

10Assim, o olivoturismo desenvolve-se principalmente em zonas rurais, e por isso aproveita os espaços naturais, rurais e, por vezes, industriais. O seu desenvolvimento tem características semelhantes às atribuídas ao turismo rural sustentável (Millán et al., 2014). Esta atividade induz os seus promotores a procurar novas alternativas que lhes permitam oferecer experiências autênticas e estimulantes aos visitantes (Campón-Cerro et al., 2017), mas sempre com o objetivo de promover o uso sustentável dos recursos (Rodríguez-Entrena et al., 2017). Por sua vez, o turismo industrial está também associado ao olivoturismo do ponto de vista da recuperação e manutenção do património industrial abandonado e degradado - moinhos, fábricas e utensílios (Vehbi et al., 2019; Yüceer et al., 2018). Relativamente ao aspeto cultural, o olivoturismo representa uma nova dimensão na promoção do azeite como produto com identidade cultural nas comunidades rurais (Campón-Cerro et al., 2014). A ligação entre o olivoturismo e a cultura é altamente relevante, pois é a partir das expressões simbólicas e materiais que o olivoturismo se torna um atrativo de valor agregado para o turismo (Toselli, 2019). Assim, as atividades que configuram esta prática turística, seja em ambiente natural ou cultural, terão sempre como objetivo valorizar e elevar o estatuto cultural dos recursos endógenos.

11É neste contexto que os académicos afirmam que o olivoturismo é uma atividade de nicho, que corresponde à designação de turismo de interesse especial (TIE) - um turismo específico, orientado para a experiência, focado em atividades que permitem aos turistas aprofundar os seus conhecimentos, satisfazer necessidades de lazer e envolver-se em atividades de uma determinada região (Parrilla-González et al., 2020). Pulido-Fernández et al. (2019) também consideram que o olivoturismo está ligado às motivações de três segmentos do turismo de interesse geral (TIG) - turismo rural, turismo de natureza e turismo cultural - que partilham características com diferentes tipologias de interesse especial: turismo gastronómico, industrial, etnográfico, criativo, observação da flora e da vida selvagem, turismo de negócios, turismo de saúde e bem-estar e aspetos do agroturismo (Figura 1).

12Esta forma de turismo responde às necessidades de mercados específicos e centra-se em várias experiências e atividades que não se enquadram no âmbito do turismo de interesse geral (Parrilla-González et al., 2020). Todas estas atividades, ancoradas no mundo olivícola, criam uma ligação entre o turista e o território. Assim, forja-se uma identidade como destino de interesse especial, baseada no seu património cultural, paisagem e costumes, oferecendo ao visitante uma experiência única (Parrilla-González et al., 2020).

C. Motivações baseadas no Olivoturismo

13O turismo do azeite representa uma grande oportunidade para difundir uma cultura de consumo em que a qualidade e a origem do produto são os principais elementos na tomada de decisão do consumidor (Hernández-Mogollón et al., 2019). A prática do olivoturismo implica viajar para um território com determinadas características, e com uma motivação prévia para experimentar pessoalmente a cultura do azeite (Pulido-Fernández et al., 2019).

14Os turistas do azeite procuram realizar uma atividade turística diferente (Parrilla-González et al., 2020), onde podem enriquecer a sua experiência de vida e aprofundar os seus conhecimentos sobre a cultura do azeite (Murgado, 2013), o processo de produção e a oferta cultural e patrimonial das zonas de produção. Além disso, procuram relacionar-se com pessoas que têm o mesmo interesse no conhecimento do património olivícola (Parrilla-González et al., 2020). Assim, são motivados por um vasto leque de experiências baseadas no azeite, na cultura local (López-Guzmán et al., 2016; Vázquez de la Torre et al., 2017), na natureza e na paisagem do olival (Parrilla-González et al., 2020). De acordo com Murgado (2013), a gastronomia tornou-se uma das motivações mais importantes para os turistas. Os turistas olivícolas procuram ter uma experiência culinária diferente, bem como provar o azeite onde este é produzido (Parrilla-González et al., 2020). Para além disso, as motivações relacionadas com a aprendizagem das propriedades organoléticas e com o conhecimento das origens e virtudes de um azeite com Denominação de Origem Protegida (DOP) (Pulido-Fernández et al., 2019).

15As motivações descritas, inerentes ao turismo do azeite, correspondem aos nove fatores motivacionais identificados por Kim et al. (2009) que estimulam um turista a experimentar as ofertas gastronómicas típicas de um território, bem como as atividades que lhes estão associadas. Estes fatores são: a procura de uma experiência excitante; o desejo de fugir à rotina; a procura de uma experiência orientada para a saúde e o bem-estar; a procura de experiências de aprendizagem; experiências autênticas; experiências de ligação - a ligação do território com o turista; o prestígio que a experiência pode oferecer; o apelo sensorial e, finalmente, aspetos relacionados com o ambiente físico.

II. Metodologia

16A presente investigação empírica é de natureza exploratória e tem como objetivo averiguar o nível de consenso entre os vários especialistas envolvidos na área da olivicultura e da gestão e conservação do património olivícola relativamente aos temas que são objeto deste estudo, nomeadamente: a relação entre o olivoturismo e outros produtos turísticos, as atividades e a experiência no olivoturismo, e ainda as motivações para a prática do olivoturismo.

17O método Delphi é geralmente utilizado para obter previsões de médio ou longo prazo a partir do consenso gerado num painel de especialistas (Modrak e Bosun, 2014), que consiste na recolha de opiniões de um grupo de especialistas, direta ou indiretamente ligados ao tema em estudo (Gordon, 1994). Para além disso, o método Delphi tem demonstrado a sua adequação na abordagem de questões complexas e estruturais do desenvolvimento. Se não for possível chegar a um consenso, pelo menos a dispersão de opiniões pode ser reduzida, sem a influência direta do painel de peritos. Na implementação de um painel Delphi, o anonimato dos participantes é assegurado, garantindo que as opiniões pessoais dos participantes não são influenciadas pelos outros participantes. De facto, este método foi criado para incentivar o debate honesto e, por isso, o anonimato e o feedback são duas características essenciais (Gordon, 1994).

18O tamanho do painel varia de acordo com cada estudo e, embora não exista um número pré-determinado, Linstone e Turoff (2002) recomendam a utilização de um painel de 10 a 15 participantes. Gordon (1994) recomenda 15 a 35 peritos, enquanto Guerrero (2003) afirma que o painel Delphi não deve exceder 30 participantes.

19No presente estudo, participaram 13 peritos. As duas rondas do estudo foram realizadas através do envio de um formulário digital por correio eletrónico. A primeira ronda teve lugar em junho de 2022 e a segunda em setembro de 2022. A escolha dos peritos foi efetuada com base em dois critérios: (1) devem ser pessoas idóneas com reputação reconhecida a nível regional ou nacional; (2) o seu curriculum vitae deve ter uma ligação comprovada ao tema do olivoturismo. Todos os peritos convidados aceitaram imediatamente participar no estudo. Como se pode ver no Quadro 1, os 13 participantes têm diferentes formações académicas (turismo, agronomia, gestão, organização de eventos, economia, história/património e olivicultura), estão ligados a diferentes instituições (empresas, organizações internacionais, museus, instituições de ensino superior, associações empresariais) e a diferentes regiões (Centro, Norte e Alentejo).

Tabela 1- Perfil dos especialistas do painel Delphi

#	Área de Especialidade	Empresa/Organização	Região onde opera
P1	Eventos de Olivoturismo	Empresa “Azeite o amor é cego”	Alentejo
P2	Turismo	Museu do Côa	Norte de Portugal
P3	Agronomia	Instituto Politécnico de Castelo Branco	Centro de Portugal
P4	Olival	CEPAAL1	Alentejo
P5	Olival	APPITAD2	Norte de Portugal
P6	História e Património	Reformado	Centro de Portugal
P7	Gestão	Empresa Nutrifarms	Alentejo
P8	Agronomia	Professor reformado	Centro de Portugal
P9	Gestão	Empresa D’Olival	Centro de Portugal
P10	Economia	Instituto Politécnico da Guarda	Centro de Portugal
P11	Gestor de Loja	Loa – The Olive World	Alentejo
P12	Gestor Institucional	Conselho Oleícola Internacional	Alentejo
P13	Gestão	Empresa Oliveiras Milenares	Norte de Portugal

¹ Centro de Estudos e Promoção do Azeite do Alentejo; ² Associação dos Produtores em Protecção Integrada de Trás-os-Montes e Alto Douro

Fonte: Autores

20Os estudos Delphi incluem geralmente duas ou mais rondas sucessivas de perguntas e respostas e, no presente estudo, foram realizadas duas rondas. Na primeira, foi pedido a cada perito que atribuísse pontuações, da mais importante para a menos importante, às várias atividades de olivoturismo, às várias experiências de olivoturismo, às motivações para as práticas de olivoturismo e aos vários produtos turísticos que interagem com o olivoturismo. Todos os itens incluídos em cada uma das quatro listas (atividades, experiências, produtos turísticos e motivações) foram selecionados com base na revisão da literatura e estão organizados na tabela 2.

Tabela 2 – Itens incluídos no questionário e sua referenciação em estudos anteriores

Atividades	Estudos analisados
Apreciar a paisagem, o silêncio e a biodiversidade	3, 15 e 17
Visitar olivais centenários ou milenares	3, 15, 17
Visitar lagares de azeite	5, 6, 15, 27
Visita a museus e centros de interpretação do azeite	10, 15, 17,
Degustação de azeite	5
Degustação de pratos típicos em que o azeite é o ingrediente principal	25, 27
Workshops sobre o património olivícola	3
Experiências culinárias tendo o azeite como ingrediente principal	8
Experiências de preparação de cosméticos à base de azeite	4, 15, 17
Participação em tarefas agrícolas como a apanha da azeitona	4, 15, 17
Percursos pedestres por olivais ou lagares de azeite.	4, 15, 17
Experiências de saúde e bem-estar através de tratamentos à base de azeite	18
Motivações	Estudos analisados
Conhecer pessoalmente a cultura do azeite	22
Realizar uma atividade turística diferente	21
Enriquecer a experiência de vida, adquirindo conhecimentos sobre a cultura do azeite	17
Estabelecer contactos com pessoas com interesses comuns no património olivícola	21
Experiências vivas baseadas no azeite e na cultura local	12, 15
Viver experiências ligadas à natureza e à paisagem do olival	21
Experimentar pratos da gastronomia local ligados à tradição olivícola	17
Viver experiências gastronómicas diferentes	21
Provar o azeite no local onde é produzido	22
Sinergias entre o olivoturismo e outros produtos turísticos	Estudos analisados
Sinergias entre olivoturismo e turismo de natureza	13, 24
Sinergias entre olivoturismo e turismo gastronómico	1, 10, 24, 22, 7
Sinergias entre olivoturismo e turismo rural	5, 13, 14, 22
Sinergias entre olivoturismo e turismo cultural	5, 7, 9, 10, 24, 25, 28
Sinergias entre olivoturismo e enoturismo	13
Sinergias entre olivoturismo e turismo criativo	4
Sinergias entre olivoturismo e turismo industrial	22, 29, 30
Sinergias entre olivoturismo e turismo de saúde e bem-estar	22

Legenda: 1- Abril-Sellarés and Tello (2019); 2 - Agüera et al. (2017); 3 - Alonso and Northcote (2010); 4 - Bezerra and Correia (2018); 5 - Campón-Cerro et al. (2014); 6 - Campón-Cerro et al. (2017); 7 - de Salvo et al. (2013); 8 - Ferreira and Martín (2021); 9 - Folgado-Fernández et al. (2019); 10 - Hernández-Mogollón et al. (2019); 12 - López-Guzmán et al. (2016); 13 - Marchini et al. (2016); 14 - Millán-Vázquez de la Torre and Pérez et al. (2014); 15 - Millán-Vázquez de la Torre et al. (2017); 17 - Murgado (2013); 18 – Nguyen (2018); 20 - Oplanić, Čop and Čehić (2020); 21 - Parrilla-González et al. (2020); 22 - Pulido-Fernández et al. (2019); 24 - Şahin e Aydin (2017); 25 – Toselli (2019); 27 - Tudisca et al. (2015); 28 – Millán-Vázquez de la Torre et al. (2017); 29 - Vehbi et al. (2019); Yüceer et al. (2018).

Fonte: Autores

21Tomando como referência os itens apresentados na Tabela 2, foram criadas quatro listas: (1) atividades, (2) experiências, (3) sinergias com outros produtos turísticos e (4) motivações para as práticas de olivoturismo. Na primeira ronda do estudo Delphi, estas listas foram enviadas aos peritos do painel Delphi com o pedido para classificarem por ordem de importância os respctivos itens de cada lista. No entanto, os peritos podiam, se o desejassem, acrescentar novos itens a cada uma das listas sugeridas.

22Na segunda ronda, foram enviadas a cada perito as respetivas 4 classificações individuais, juntamente com as 4 classificações globais obtidas a partir das médias das avaliações dos 13 peritos. Desta forma, cada perito podia comparar as suas iniciais com as classificações coletivas. A tarefa pedida a cada perito era muito simples: depois de comparar a sua classificação individual com a classificação colctiva, voltar a classificar os itens, podendo manter ou alterar a sua avaliação anterior. Os dados finais do presente estudo são expressos sob a forma de 4 classificações globais que resultam da média global das (re)avaliações dos 13 peritos durante a segunda ronda.

III. Resultados e discussão

23Considerando o grau de importância atribuído pelo grupo de peritos às oito atividades turísticas relacionadas com o azeite habitualmente referidas na literatura científica, verifica-se que a que encabeça a lista é a "participação em provas de azeite". De facto, o grau de consenso quanto à primazia desta atividade foi ainda maior na segunda ronda do inquérito (ver Figura 2).

24A atividade "visita a olivais ancestrais para ver oliveiras centenárias ou milenares e apreciar a paisagem" surge na segunda posição deste ranking coletivo, seguida da atividade "participação em workshops sobre azeite e património olivícola". Na quarta posição do ranking está a "participação em eventos gastronómicos relacionados com o azeite".

25Em posições mais modestas (quinto e sexto lugares, respetivamente) estão as atividades "visita a lagares de azeite" e "visita a museus de azeite". E, numa posição menos proeminente, em termos de importância relativa, estão as lojas de azeite: "visitar lojas de azeite" e "comprar azeite e produtos de oliva em lojas especializadas". Finalmente, a atividade "apadrinhar uma oliveira e receber x garrafas de azeite por ano", sugerida na primeira ronda por um dos peritos, foi classificada em último lugar, na segunda ronda de avaliação.

26Comparando as classificações médias das duas rondas de inquéritos, verificamos que na segunda houve um maior nível de consenso sobre as três atividades consideradas mais importantes, bem como um maior consenso sobre as quatro atividades consideradas menos importantes. É importante notar que as nove atividades de turismo olivícola referidas neste estudo não são mutuamente exclusivas, mas podem muitas vezes ser combinadas na mesma experiência global. Por exemplo, a atividade de visitar uma loja de azeite (ou um lagar de azeite) pode incluir uma prova de azeite. O mesmo raciocínio se aplica a workshops ou visitas a museus, que podem combinar várias atividades na mesma experiência global.

27No entanto, o facto de as duas atividades que exigem investimentos diretos em infraestruturas e equipamentos culturais (museus do azeite) ou industriais (lagares de azeite) - ambas muito ligadas a territórios olivícolas bem definidos - não figurarem no topo do ranking, pode ser interpretado como uma prova de que é possível realizar atividades de olivoturismo longe dos territórios tradicionais onde o azeite é produzido. Por outras palavras, três das quatro atividades mais valorizadas pelos peritos (provas de azeite, workshops e eventos gastronómicos) têm como principal recurso o azeite já engarrafado e podem ser realizadas em meio urbano, ou seja, em locais mais ou menos distantes dos territórios olivícolas, podendo assim chegar a públicos mais alargados e aumentar o raio de ação deste nicho de produto turístico.

28A Figura 3 apresenta os vários produtos turísticos que ancoram o olivoturismo. As avaliações dos peritos nas duas rondas não apresentam variações significativas, nem em termos de ranking nem em termos de médias para cada item. De acordo com os peritos, e reiterando as teses de vários autores (Campón-Cerro et al., 2014; Tudisca et al., 2015; Millán-Vázquez de la Torre et al., 2017), é no contexto das experiências gastronómicas que o olivoturismo assume maior relevância, quer como degustação de pratos que destacam o azeite como ingrediente essencial, quer como degustação de azeites. Em segundo plano, mas ainda no topo do ranking, o turismo em áreas rurais, o turismo de natureza e o enoturismo oferecem contextos favoráveis às experiências de olivoturismo. É interessante notar que as sinergias entre o olivoturismo e o turismo industrial são as menos valorizadas pelos peritos, o que está em consonância com a avaliação modesta atribuída à atividade "visita aos lagares de azeite", como referido anteriormente. As sinergias do olivoturismo com o turismo de saúde e bem-estar e, em maior grau, com o turismo criativo são consideradas pouco relevantes, provavelmente por se tratar de experiências turísticas mais raras, pois exigem um elevado nível de especialização e profissionalismo.

29A perceção dos especialistas sobre a importância relativa das experiências de olivoturismo (Figura 4) coloca mais uma vez em primeiro plano as experiências com um enfoque específico no azeite como elemento gastronómico, nomeadamente: "degustação de azeite", "degustação de pratos típicos em que o azeite é um ingrediente essencial" e "experiências culinárias". Em segundo lugar, destacam-se as experiências com um enfoque específico nas oliveiras, nos olivais e na ruralidade: "experiências de apanha ativa da azeitona", "percursos pedestres ou temáticos em olival", "desfrutar do silêncio, da paisagem, da biodiversidade e do património associados ao olival" e, ainda, "visitar olivais ancestrais, com oliveiras centenárias ou milenares". Em terceiro lugar, surge a "participação em festas temáticas dedicadas ao azeite e à oliveira", seguida da "compra de azeite, azeitona e produtos derivados". Mais uma vez, e reforçando os dados apresentados anteriormente, as experiências relacionadas com a produção de azeite ("visita a lagares tradicionais em funcionamento" e "visita a lagares modernos") e com a interpretação do património ("visita a museus e centros de interpretação do azeite") são consideradas pouco relevantes pelos especialistas. No entanto, e mais uma vez, as experiências criativas de "produção de sabonetes e cosméticos" e "experiências de saúde e bem-estar com azeite e produtos olivícolas" surgem na última posição do ranking.

30No que diz respeito às motivações para a prática do olivoturismo, o consenso dos especialistas deu primazia à motivação "adquirir conhecimentos sobre o azeite", seguida da motivação "estar em contacto com a natureza e apreciar a paisagem do olival". Em consonância com o nível de importância atribuído às várias atividades do turismo do azeite, a motivação "provar o azeite no local onde é produzido" é também muito importante. Um nível intermédio de valorização pelos especialistas foi atribuído à procura de novidade ("realizar uma atividade turística diferente") e às motivações relacionadas com o conhecimento da produção de azeite e a utilização culinária do azeite. Como motivações menos relevantes para o turismo do azeite, os especialistas enumeram as seguintes opções "enriquecer a experiência de vida através da aquisição de conhecimentos sobre a cultura do azeite", "relacionar-se com pessoas com interesses comuns no património olivícola" e "conhecer as origens e virtudes dos azeites DOP (Denominação de Origem Protegida)".

Conclusões

31O património olivícola é um elemento essencial da cultura portuguesa, que lentamente começa a ser valorizado do ponto de vista turístico. O potencial do olivoturismo, já impulsionado e demonstrado noutros países mediterrânicos, e que tem vindo a ser investigado de forma mais incisiva, como se revela neste artigo, justifica a necessidade e a pertinência do estudo que apresentamos. De facto, a inexistência de estudos que nos permitam compreender a eventual importância e abrangência do olivoturismo em Portugal foi determinante para este estudo e para as opções metodológicas tomadas. Assim, considerámos fundamental recorrer a um painel nacional de especialistas associados ao olivoturismo, para identificar as atividades e experiências mais atrativas, as principais motivações turísticas e perceber como é percecionado o nível de complementaridade entre o olivoturismo e outros tipos de turismo.

32Analisando os resultados obtidos do painel de peritos, a prova de azeite é considerada a atividade mais atractiva relacionada com o olivoturismo. Um nível de atratividade ligeiramente menos importante é a visita a "... olivais ancestrais para ver oliveiras centenárias ou milenares e apreciar a paisagem", que facilita o contacto com olivais e oliveiras, e a "participação em workshops sobre azeite e património olivícola". Apesar de terem sido utilizadas metodologias diferentes, recorrendo a públicos diferentes, estes resultados são totalmente paralelos aos obtidos por Pulido-Fernández et al. (2020) com turistas de azeite no sul de Espanha. Embora os contextos geográficos sejam diferentes, é interessante verificar a correspondência de opiniões entre o painel de peritos portugueses e os consumidores de turismo de azeite do país vizinho sobre a atratividade das diferentes atividades.

33Importa ainda referir que as atividades utilizadas neste estudo podem ser divididas em duas categorias: as que têm de ser realizadas em locais onde estão instalados equipamentos e infraestruturas (lagares de azeite, museus, lojas) ou investimentos agrícolas (olivais) relacionados com o azeite (com oliveiras e olivais) e as que podem ser realizadas em qualquer contexto, ligado ou não à existência de oliveiras ou à produção de azeite. No top 4 das atividades mais atrativas do olivoturismo, há três que podem ser realizadas em qualquer contexto (participação em provas, participação em workshops sobre azeite e património olivícola e participação em eventos/festivais gastronómicos do azeite), facilitando a sua dinamização em qualquer território - seja rural ou urbano. Esta particularidade pode ser estrategicamente utilizada, sobretudo, para complementar experiências de turismo cultural e de turismo gastronómico que não se circunscrevam ao património olivícola e que não o tenham tido como principal motivação para visitar um determinado território, aumentando assim o raio de ação das atividades de olivoturismo (quer do ponto de vista geográfico, quer em termos do vasto leque de públicos que pode atrair).

34Tal como verificado em diversos estudos (Murgado, 2013; Campón-Cerro et al., 2014; Tudisca et al., 2015; Millán-Vázquez de la Torre et al., 2017; Pulido-Fernández et al., 2020), o turismo gastronómico é o produto turístico que apresenta maior complementaridade com o olivoturismo, seguindo-se inevitavelmente as suas ligações ao turismo rural, ao turismo de natureza e ao enoturismo. A gastronomia também se destaca em termos de experiências turísticas, revelando-se o aspeto mais atrativo das experiências de olivoturismo, seja através de provas de azeite, pratos típicos ou experiências culinárias (aulas ou workshops) em que o azeite é o ingrediente central. Embora os resultados privilegiem a vertente gastronómica, consideramos relevante destacar a vasta e diversificada lista de experiências turísticas que podem ser organizadas a partir do património olivícola e que podem ir ao encontro de um vasto leque de consumidores, gostos e motivações. Mesmo que sejam experiências complementares ao motivo principal de visita a um determinado território, podem ser um ponto distintivo e diferenciador de toda a viagem ou visita, surpreendendo por elementos tecnológicos (nos mais recentes e modernos lagares e museus), de inovação (produtos cosméticos, tintas naturais, massagens e outras experiências de saúde e bem-estar), de antiguidade, de beleza estética, entre outros.

35Finalmente, a motivação turística mais importante para o olivoturismo, identificada pelo painel de especialistas, refere-se a um motivo mais amplo e abrangente - "Adquirir conhecimentos específicos sobre o azeite" - que pode abranger vários aspetos do conhecimento sobre o azeite (a sua produção, a sua distribuição, as características organoléticas do azeite, os benefícios do seu consumo, entre outros temas). A motivação "Provar o azeite onde ele é produzido", especificamente relacionada com a principal atividade e experiência de olivoturismo identificada neste estudo - ou seja, a prova de azeite - surge em terceiro lugar. Esta posição pode significar que a prova de azeite é muito apetecível como atividade e experiência (e como motivação) mas não tem necessariamente de ser realizada no local onde o azeite é produzido. Poder-se-ia inferir deste resultado que este aspeto (a degustação ter de ser realizada no local de produção) - a ser incluído numa atividade ou experiência - poderia ser um fator eliminatório para parte da procura turística. Ou seja, uma parte da procura que está disponível para ter experiências de degustação de azeite, mas sem ter de se deslocar aos locais onde o azeite é produzido. Por sua vez, a motivação "estar em contacto com a natureza e desfrutar de uma paisagem de olival" posicionada em segundo lugar evidencia aspetos associados à natureza, paisagem e estética, que podem também remeter para contextos de tranquilidade e sossego.

36Assim, estes resultados podem ser estrategicamente utilizados pelos stakeholders (empresas e entidades públicas e organizações gestoras de destinos) que trabalham a oferta turística relacionada com a oliveira e o azeite, para mais eficazmente conceberem e dinamizarem experiências relacionadas com o olivoturismo que respondam claramente ao que os consumidores aspiram e procuram. Desta forma, poderá ser mitigado um dos principais problemas do olivoturismo, associado à falta de experiências e ofertas turísticas estimulantes (Murgado, 2013) e que captem a atenção da procura do turismo ligado ao azeite.

37Relativamente à utilização do método Delphi, este permitiu-nos formar um cenário baseado em opiniões de especialistas contribuindo para um maior conhecimento das questões relacionadas com o turismo do azeite. No futuro, e particularmente no contexto português, importa aprofundar o conhecimento sobre a predisposição da procura turística para experiências de turismo do azeite (as atuais e as que poderão vir a realizar no futuro), quer como turismo de nicho, quer como turismo de interesse especial, como complemento de uma experiência mais global com interesses e motivações associados ao turismo rural, ao turismo de natureza ou ao turismo cultural. Neste sentido, devem ser realizados estudos qualitativos e quantitativos junto dos consumidores, para conhecer e caraterizar a procura efetiva de olivoturismo e a procura potencial e diferida para consumo futuro. O cruzamento dos resultados deste estudo com os resultados de futuros estudos sobre as predisposições dos consumidores para o olivoturismo (que deverão incluir listas de atividades, experiências e motivações semelhantes às utilizadas neste estudo) poderá indicar, de modo mais consistente, os tipos de atividades, experiências e motivações que poderão interessar mais aos consumidores. Este tipo de dados pode ser utilizado estrategicamente pelas empresas que já trabalham no sector do azeite e que já oferecem experiências de olivoturismo (ou poderão vir a fazê-lo no futuro). Perceber (e quantificar) a atratividade de experiências gastronómicas, experiências de saúde e bem-estar, experiências de co-criação relacionadas com o azeite ou o simples contacto com o ambiente rural dos olivais poderá contribuir para o crescimento de novos investimentos privados (e públicos) em infraestruturas, equipamentos e serviços de olivoturismo. Por outro lado, as motivações, as experiências e as atividades consideradas menos importantes neste estudo devem também ser analisadas pelos stakeholders (públicos e privados) que já as oferecem, contribuindo para futuras decisões de gestão mais eficientes e mais alinhadas com o que os consumidores procuram.